sábado, 25 de dezembro de 2010

SYMMETRIA : o Duomo de Milão sob o olhar de Cesare Cesariano

Ana Paula Giardini Pedro


RESUMO
Frente à elaboração da tradução comentada ao De Architectura (1521), Cesare Cesariano interpreta a symmetria vitruviana fundamentando-se no Duomo de Milão, um edifício do trezentos. O tradutor-comentarista desenvolve um sistema de comodulação para o edifício alicerçado nas geometrias do triângulo, quadrado e círculo. O estudo das imagens apresentadas por Cesariano permite desobscurecer graficamente o triplo sistema que rege a construção da ichnographia, orthographia e scaenographia do Duomo. O conúbio estabelecido entre os desenhos do edifício e essas formas geométricas revela como Cesariano assimila as simmetrie euritmiate do homo ad quadratum e ad circulum na concepção do organismo indiviso, o edifício.
Palavras-chave: Vitrúvio, homo ad quadratum e ad circulum, comodulação.

ABSTRACT
Before the development of the commented translation of De Architectura (1521), Cesare Cesariano interprets the vitruvian's symmetria based on Milan's Duomo, a building from the XIV century. The translator-commenter elaborates a co-modulation system to the building grounded on triangle's, square's and circle's geometry. The study of the images presented by Cesariano allows to clarify graphically the triple system that governs the construction of the Duomo's ichnographia, orthographia e scaenographia. The established alliance between the building's drawings and these geometric forms reveals how Cesariano assimilates the simmetrie euritmiate from the homo ad quadratum and ad circulum on conceiving the whole organism, the building.
Keywords: Vitruvius, homo ad quadratum e ad circulum, co-modulation.

RESUMEN
Delante de la elaboración de la traducción comentada a De Architectura (1521), Cesare Cesariano interpreta la symmetria vitruviana fundándose en el Duomo de Milán, un edificio del trescientos. El traductor-comentarista desarrolla un sistema de co-modulación para el edificio fundamentado en las geometrías del triángulo, cuadrado y del círculo. El estudio de las imágenes presentadas por Cesariano permite desobscurecer gráficamente el tríplice sistema que dirige la construcción de la ichnographia, orthographia y scaenographia del Duomo. La alianza firmada entre los dibujos del edificio y esas formas geométricas denota como Cesariano asimila las simmetrie euritmiate del homo ad quadratum y ad circulum en la concepción del organismo integral, el edificio.
Palabras clave: Vitruvio, homo ad quadratum y ad circulum, co-modulación.

"Nenhum templo poderá ter um princípio racional de composição sem symmetria e proporção, e se não apresentar uma rigorosa composição tal como os membros do corpo humano de bela forma."
(VITRÚVIO, III, 1,1)

Este excerto, extraído do De Architectura de Vitrúvio e apresentado no início do livro sobre os templos, enuncia o liame estabelecido entre as relações proporcionais de um templo e aquelas do corpo humano, fundamentando-se na symmetria1. Tal noção descrita por Vitrúvio ecoa nos séculos XV e XVI, seduzindo artistas e pensadores humanistas, inspirando-os na busca da plena harmonia.

O presente trabalho versa sobre como Cesare Cesariano, arquiteto quinhentista e tradutor do De Architectura, assimila tal preceito e o aplica num estudo das regras de composição do Duomo de Milão, nutrindo-se de lições vitruvianas sobre arquitetura antiga romana a um edifício dito" gótico".
Cesare Cesariano elabora a primeira edição do texto vitruviano publicada em italiano em 1521. Sua obra consiste na tradução do latim para o vulgar, ilustração e comentário do tratado De Architectura, comentário este que é pautado pela exaltação do contexto milanês. O anotador utiliza os conceitos de Vitrúvio como cânones atemporais, de forma que, ao escolher a Milão da época, acaba por priorizar um exemplo objetivando identificar resquícios referentes a esquemas vitruvianos nesta cidade. Uma busca à cidade antiga, através da combinação dos elementos existentes na Milão de seu tempo na convicção de que coincidem com os preceitos vitruvianos, exalçados em um modelo pré-existente e atemporal.

Esta intenção pode ser constatada, por exemplo, através do sistema de proporcionamento triangular da Catedral de Milão, desenvolvido para exemplificar a noção de symmetria vitruviana (Vitrúvio I, 2, 4); da utilização da planta de Milão para a interpretação da cidade vitruviana (Vitrúvio I, 6); ou mesmo das tipologias de templos, bastante imaginosas, que resultam da interpretação das regras propostas por Vitrúvio (Vitrúvio I, 2 e IV), ligando tais tipologias às estruturas de igrejas existentes, mais do que aos modelos vitruvianos. Nestes casos, Cesariano elege referências para a interpretação do De Architectura que, na realidade, estão bastante distantes do passado greco-romano, associando as diretrizes do texto antigo ao contexto milanês em que vivia, superando o papel de simples exegeta. Sua intenção não é reconstruir exatamente os preceitos antigos de arquitetura, mais do que isso, Cesariano busca assumi-los como base de referência para" traduzir" seus termos em linguagem arquitetônica moderna (TAFURI. 1978, p. 413).

Para exemplificar um sistema harmônico de proporções, ilustrando a noção de symmetria, Cesariano toma como exemplo o Duomo de Milão. A partir de três figuras que correspondem à planta, corte e elevação da catedral milanesa, o tradutor-comentarista descreve um sistema de modulação que teria norteado a concepção do edifício. No entendimento de Cesariano o sistema proporcional é fundamentado principalmente num esquema de triangulação, que num segundo momento resulta noutros de quadratura e circularidade. O primeiro é descrito em texto ponto a ponto por Cesariano; os outros dois são apenas mencionados, sem maior desenvolvimento do tema. Neste estudo serão explorados graficamente os três esquemas proporcionais do edifício, de modo a elucidar os apontamentos referentes ao sistema ad triangulum e traçar uma hipótese gráfica que substancie aqueles ad quadratum e ad circulum, observando como os três são articulados entre si e como estão relacionados com os preceitos apresentados no De Architectura.

A ars aedificatoria e a figura humana
No livro I de seu tratado, Vitrúvio define a arquitetura discorrendo sobre os seis preceitos que encerram a ars aedificatoria: ordinatio2, dispositio3, eurythmia4, symmetria, decor5 e distributio6. Estas seis qualidades, se bem estudadas e aplicadas, garantem a justa harmonia do conjunto arquitetônico, do edifício.

A dispositio é definida por Vitrúvio como instrumento utilizado para o estudo da composição das partes do edifício a ser ideado e é dividida em três espécies: ichnographia, orthographia e scaenographia. Estas três formas de representação do edifício correspondem à planta, elevação e algo que corresponderia, hoje, à perspectiva: um desenho que compreendia a fachada e os lados do edifício, e cujas linhas convergiam para o ponto central (Vitrúvio 1, 2, 2).
A symmetria consiste no princípio fundamental da ideação de uma obra, sendo a base operativa para calcular as especificidades do edifício e seu conjunto. Trata-se da relação métrica existente entre todos os componentes de uma obra completa, pensada no conjunto, de modo que a dimensão de cada parte do edifício corresponda a um múltiplo ou submúltiplo da unidade modular estabelecida para este edifício. Vitrúvio define este preceito, utilizando o corpo humano como referência para demonstrar como acontece a justa comodulação numa" obra", estabelecendo por analogia o liame edifício-homem:

"A symmetria consiste no conveniente equilíbrio dos membros da própria obra e na correspondência de uma determinada parte, entre as partes separadas, e com a harmonia do conjunto da figura, sob a base de uma destas partes calculada como módulo. Assim como no corpo humano existe a natureza simétrica da eurythmia a partir do côvado, do pé, do palmo e de outros pequenos membros, o mesmo acontece no completo acabamento das obras." (VITRÚVIO. I, 2, 4)
Vitrúvio retoma tal liame que relaciona as regras de composição do corpo humano e do edifício no livro III, no qual introduz a descrição de templos, como visto no excerto de abertura deste artigo. 

Na passagem o arquiteto antigo propõe que um templo deve ser ideado de modo que disponha de um sistema proporcional no qual cada um de seus membros e o conjunto esteja em prefeito equilíbrio, revelando symmetria tal qual se encontra num corpo humano bem formado. O tratadista romano fornece os meios de traduzir a symmetria humana para o edifício discorrendo, na seqüência, sobre o homo bene figuratus 7 (fig. 1), ou seja, sobre as medidas e as relações proporcionais extraídas do corpo de um homem de bela compleição, e descrevendo a figura do homo ad quadratum e ad circulum 8 (fig. 2), que corresponde à figura deste corpo humano inscrita no círculo e no quadrado.



Pode-se considerar esta imagem do homo ad quadratum e ad circulum o ideal de proporcionamento entre os humanistas, pois trata das razões matemáticas inerentes ao ser mais elevado entre todos os outros e às duas formas geométricas mais perfeitas. Na arquitetura, para se criar um edifício de máxima beleza era necessário assimilar as razões encontradas no homo bene figuratus. Esse procedimento de transposição deveria ocorrer por meio da assimilatio, pela interpretação destas razões geométricas e do estudo de sua aplicação na obra, sem que fosse igual, mas apenas análoga ao homem. A assimilatio do modelo de proporcionamento, quando submetida aos seis preceitos da arquitetura, amplia-os numa enorme multiplicidade de aplicações diferentes em cada situação específica.

Cesare Cesariano, ao comentar a passagem vitruviana sobre a definição da arquitetura em seis preceitos do livro I, opta por antecipar o exemplo da noção de symmetria, exposto por Vitrúvio apenas no livro III. Para comentar as espécies de dispositio Cesariano apresenta o método compositivo de um edifício, evidenciando a interdependência dos seis preceitos da arquitetura, e no caso, de modo especial entre dispositio e symmetria. Cesariano discorre sobre a importância da correspondência das partes do edifício entre si, assim como da composição do conjunto, asseverando que para o edifício deve-se alcançar a mesma integridade de um corpo humano.
"A quantidade é um somatório de módulos da obra a ser feita. Deve-se considerar que seja dada uma quantidade mensurável, isto é, uma linha ou muitas coisas corpóreas, aquelas com as quais medimos, ou seja, com a régua ou instrumentos de medição, isto será chamado módulo, (...), os quais compondo sempre juntos, ou no todo ou em particular, convém que correspondam a toda integridade, como ocorre em um corpo humano ou de outro animal, (...)" (CESARIANO. 1996 [1521], p. 451 c. 13r 13v)

A obra eleita por Cesariano como exemplo compositivo é a catedral milanesa, principal edifício de seu repertório cotidiano. Escolha bastante curiosa: elucidar conceitos ligados à arquitetura antiga romana por meio de edifício cuja construção fora iniciada no século XIV e com características do referido modo" gótico", que no entendimento de Cesariano estava ligado à prática germânica9.
Valendo-se da ichnographia, orthographia e scaenographia10, do Duomo de Milão, Cesariano se propõe a elaborar um diagrama no qual as regras de composição do edifício vêm evidenciadas e afirma tratar de um duplo sistema, ad triangulum e ad quadratum:
"(...) a figura a seguir [figura 3] te demonstra claramente que, entre interior e exterior, a ligação do conjunto é formada pela 'icnografia triangulare' principal, e então distinta por quadratura, como vês a 'membratura' definida pelo intercolúnio." (CESARIANO. 1996 [1521], p. 454 c. 13v)


Na inscrição referente à figura da scaenographia (fig. 5), Cesariano assevera que as regras de comodulação foram definidas a partir do círculo, do quadrado e do triângulo, e considera como construído segundo germânico more, ou" modo germânico". Com esta declaração o anotador parece superar as discussões que, na virada do século XIV para o XV, foram promovidas para orientar a construção do Duomo e que, entre outras tópicas, ponderavam sobre a escolha do sistema de proporcionamento para fachada do edifico, se seria ad quaratum ou ad triangulum. Deve-se ter em mente que a preferência pelo sistema de triangulação consistia numa instância lombarda contra os pareceres transalpinos (ACKERMAN. 1949, p. 91-93). Alessandro Rovetta (1996, p. 454, n. 55) e Marco Rossi (1996, p. 51-53) defendem que a escolha pelos sistemas de triangulação e quadratura de proporções se deve, provavelmente, ao contato de Cesariano com estudos prévios do Duomo, como aqueles do matemático Gabriele Stornaloco ou os do arquiteto Antonio di Vicenzo.












Os mestres da arquitetura conhecida como" gótica" são unânimes ao eleger a geometria como base de sua arte, ainda que não se manifestem, salvo raras exceções, quanto ao significado simbólico de seus projetos (VON SIMSON. 1988, p. 33). O arquiteto que dominasse este modo de idear um projeto era capaz de estabelecer todas as demais medidas da planta e da elevação com apenas uma das dimensões básicas definida por meios estritamente geométricos, tendo como módulos alguns polígonos regulares, sobretudo o triângulo e o quadrado (VON SIMSON. 1988, p. 36).
Sem ignorar isto, Cesariano sugere que a composição da Basílica de Milão estava ligada as geometrias do triângulo, do quadrado e do círculo, e reconstrói os desenhos do Duomo a partir destas figuras regulares. Apenas o sistema trigonal é aprofundado no texto, onde cada um dos elementos que o compõem vem indicado. Quanto ao sistema quadrangular, considerado o mais natural (ROSSI. 1996, p.51) no caso da catedral milanesa11, e ao circular, Cesariano oferece apenas pistas para que se possa vislumbrá-lo.

Razões ad triangulum
Cesariano constrói a ichnographia (fig. 3) do Duomo mediante triângulos equiláteros, com exceção da quadrata ecuba (cfr. fig. 3a). O tradutor-comentarista inicia com a definição de dois eixos principais, e perpendiculares entre si, que determinam o comprimento desde a entrada até a abside, e a largura entre as testadas do transepto, através da indicação dos triângulos ABC e BCD, correspondentes a outros dois menores indicados por EFG e FGH. Este procedimento de construir o desenho a partir destes dois eixos principais que determinam a extensão máxima do edifício está em conformidade com o conselho de Alberti apresentado no livro II do De Re Aedificatoria (ALBERTI. 1989 [1485], III, 2). abg é congruente a EFG e FGH, define a largura do transepto no sentido norte-sul, e corresponde a" precisione equidistante de commodulatione" de 128 braças (CESARIANO. 1521 [1996], p. 455 c. 13v).

A" quadrata ecuba", que perfila a projeção do tibúrio, tem o centro em O e é a única referência à forma quadrada que Cesariano explicita na planta do Duomo. IKL é congruente a RZ& e a MNO, e define a largura do presbitério assim como o alinhamento da colunata intermediária das naves laterais (fig. 3a). RZ& e MNO correspondem à comodulação de 64 braças e à largura do transepto e da porção absidial da basílica. A largura da colunata que define a cela, ou a nave central, é definida pelo lado do triângulo PQR, medindo 32 braças. Os segmentos coincidentes ST e XY definem a largura do intercolúnio das naves menores em 16 braças, e a partir desta mesma medida também é indicada a" prima complantatione de l'intercolumnare postico", além de corresponder à abertura da porta central (CESARIANO. 1521 [1996], p. 454 e 455 c. 13v).
A orthographia da catedral milanesa apresentada por Cesariano não se desenvolve sobre a imagem da fachada do edifício, como sugeriam as interpretações do texto vitruviano confirmadas pelo próprio Cesariano numa descrição precedente à ilustração:

"Mas a orthographia é a imagem ereta da frente etc, Vitrúvio expõe que esta é a elevata fronte rectamente designata, isto é, a parte anterior do edifício, a qual nós denominamos comumente fachada ou frontispício." (CESARIANO. 1996, [1521] p. 456, c. 14r)
Cesariano tem como ponto de partida para a orthographia (fig. 4) a definição da frente hexastila" elevata per interiore", ou seja, desenha um corte mostrando o interior do edifício. Rovetta (1996, p. 463 nota 95) assevera que isto está relacionado, provavelmente, à ausência de um projeto oficial para a fachada da Catedral, como também pelo complexo encaminhamento dado pelo comentarista no texto vitruviano. Noutro momento, o historiador enfatiza que Cesariano não teria reproduzido a fachada do Duomo, mesmo que ela já estivesse projetada em 1521, pois o que interessava ao comentarista era uma descrição minuciosa do interior da construção (ROVETTA. 1996, p. 468).

Tendo em mente a frente hexastila do edifício, o que associa convenientemente a orthographia ao desenho precedente da ichnographia, Cesare define os pontos A, B, C, E e F que correspondem à posição das colunas da fachada. Ressalta-se o fato de Cesariano indicar apenas cinco pontos em seu texto, no entanto no desenho (fig. 4 e 4a) verifica-se que o sexto ponto vem identificado com a letra D, completando, pois, o raciocínio do anotador. A, B, C, D, E e F estão dispostos na base do triângulo eqüilátero com vértices AFG e altura assinalada ZG, que define a" trigonale ragione" de toda a figura (CESARIANO. 1996 [1521], p. 463 e 464, c. 14v).

Outro triângulo eqüilátero, cuja base é o segmento AF aumentado em 16 braças para cada lado e resultando na reta HK, tem a altura determinada pelo ponto L, localizado no vértice interno da abóbada do tibúrio (fig. 4a). Este triângulo perfilado por LHK é congruente aos abg, EFG e FGH, com 128 braças, indicados na icnographia (fig. 3a). Também do vértice interno da abobada do tibúrio é extraído um dos vértices de LMN, cuja base MN é traçada na altura dos capitéis das colunas de ordem menor das naves laterais (fig. 4a). O quarto triângulo QRS tem a base RS tangente ao cume da abóbada da nave central e altura no vértice Q, onde é o cume da torre maior. Estendendo as linhas QR e QS até a base do edifício, Cesariano indica o triângulo máximo do desenho, ou seja, OPQ que inscreve toda a orthographia (CESARIANO. 1996 [1521], p. 463 e 464, c. 14v).
Cesariano passa então a definir os três níveis do tibúrio, cuja implantação considera quadrada (referente à" quadrarta ecuba"), provavelmente referindo-se a projetos bramentescos e contradizendo aquele octogonal, posto em obra no fim de 1500 segundo a proposta de Amadeo-Dolcebuono (ROVETTA. 1996, p. 464, n. 95). A seção transversal da ilustração faz referência ao projeto quadrado enquanto a fachada externa lateral, mantido sobre os níveis da seção, responde à realização octogonal.
O nível identificado pela reta TV define a largura da nave central e a altura do cume da abóbada desta nave, conhecida como fórnice, e esta coincide com a base do triângulo QRS (fig. 4a). XY estabelece o nível do vértice do triângulo GAF, sendo a base deste último equivalente à largura máxima das naves. E o último nível definido por eQ é correspondente ao cume da abóbada do tibúrio (CESARIANO. 1996 [1521], p. 463 e 464, c. 14v).

As ilustrações supracitadas (referentes a ichnographia e orthographia) são a base utilizada para a construção da scaenographia do Duomo de Milão, sintetizando que as regras de composição regem cada uma delas são as mesmas, ou seja, o edifício é ideado como um todo cujas partes são indecomponíveis. A scaenographia (fig. 5) traz, em sua porção inferior, parte da planta do transepto; o corte é retomado com poucas diferenças relativas à abóbada do tibúrio, cujos ornamentos são representados em vista apenas na orthographia. Assim, a scaenographia apresentada corresponde ao corte transversal da nave e do tibúrio, com a vista externa do transepto.

Mais uma vez nesta ilustração (fig. 5), Cesariano destoa da lição vitruviana (VITRUVIO. I, 2) que define a scaenographia quase como uma perspectiva do edifício, distanciando-se inclusive dos princípios perspéticos delineados por Brunelleschi no século XV, desenvolvendo sua scaenographia a partir de um ponto de vista que não permite ao leitor ver as laterais e limita uma visão das relações proporcionais e geométricas. Para a construção deste desenho Cesariano afirma que as regras de comensuração são explícitas a partir de círculos, quadrados e triângulos (CESARIANO. 1996 [1521], p. 465 c. 16r).

Sobre a ilustração (fig. 5a), Cesariano ressalta a base VRSX e a altura definida pelo triângulo HYK. As retas HZ e ZK medem 64 braças cada e correspondem à medida máxima do transepto. O tratadista sugere que através delas se pode" il tuto simmetriare" (CESARIANO. 1996 [1521], p. 465 c. 16r). No caso do Duomo," il tuto" seria desde o conjunto até o particular, da estrutura arquitetônica até a ornamentação.


"(...) com os quais [segmentos HZ e ZK] poderás 'simmetriare' tudo, e representar de maneira maior ou menor, não apenas estas, mas todas as 'figuratione e corporature architetonice [sic.]' e cada um dos outros gêneros de coisas e de corpos regulares ou 'transregulari' que existem no mundo, ou seja, para que saibas comodular e entender como dividir para alcançar a 'euritmiata simmetria', (...) pois desta procede e se entende quase toda esta ciência [arquitetura]. Todo o resto desta figura teórica consiste em entender as suparcitadas ichnographia e orthographia." (CESARIANO. 1996 [1521], p. 465 c. 16r)

As retas HZ e ZK, como apresentadas no desenho (fig. 5a) podem ser consideradas como algo semelhante ao que entendemos hoje por" escala gráfica", e no caso de Cesariano trata-se de um" escala" de onde se pode extrair o módulo utilizado para conceber e" simmetriare" todo o edifício. Cada um dos segmentos de reta representa 64 braças de extensão e é dividido em quatro porções, as quais são subdivididas em dezesseis partículas cada. Está definido aí o módulo, isto é, uma destas quatro porções que corresponde a 16 braças.

O quadrado e o círculo
Na scaenographia, o anotador explicita o método compositivo aplicado ao edifício por meio das formas geométricas que o apoiaram, quais sejam triângulo, quadrado e círculo (fig. 5b). São estas duas últimas figuras, que estabelecem o conúbio entre a interpretação sobre de Cesariano a cerca da basílica milanesa aos preceitos de Vitrúvio sobre symmetria traduzida no Homo bene figuratus e no homo ad quadratum e ad circulum.


Tendo em conta que Cesariano não deixou relatos que elucidem os princípios de circularidade e quadratura que regem a construção dos desenhos, apenas as afirmações no texto (CESARIANO. 1521 [1996], p. 465 c. 16r) e na inscrição da figura da scaenographia (fig. 5), serão utilizados os vestígios traçados por Cesariano nos desenhos para desvendar estes dois esquemas de proporcimamento.

Três círculos podem ser identificados na scaenographia (fig. 5 e 5b), marcados em magenta na figura 5b, com centro na interseção entre o eixo vertical ZY e a linha horizontal que passa no topo das colunas de ordem menor das naves laterais. Concêntrico aos círculos verifica-se um quadrado de 4 ½ módulos, rotacionado 45° com relação ao eixo vertical, inscrito no círculo de menor raio e assinalado em vermelho na figura 5b.

A interseção do círculo de raio maior com a linha VRSX determina a largura máxima da igreja, que corresponde ao comprimento do transepto tirado pelo exterior, medida esta que é equivalente a duas vezes o lado do quadrado de 4 ½ módulos (9 módulos ou 144 braças). O lado deste tetraedro determina também a altura externa máxima do transepto, sem contar as guglie (fig. 5b). Em planta as faces do quadrado de 4 ½ módulos podem ser identificadas com metade das faces dos triângulos ABC e BCD (fig. 3a). Observa-se também que as razões do transepto em vista (fig. 5b) são reproduzidas em planta (fig. 3b), de modo que dois quadrados de 4 ½ módulos justapostos determinam suas dimensões externas.
 
O círculo médio, ao cruzar o segmento VRSX precisa o comprimento interno do transepto (fig. 5b). Tendo em mente que o transepto é traçado na razão de 2:1, esta medida corresponde ao dobro do lado dos triângulos EFG, FGH e abg (fig. 3a), e esquadrinha-se um novo quadrado de lado igual a 8 módulos (ou 128 braças) indicado nas figuras 3b e 5b em azul. Na scaenographia, a grandeza do lado deste tetraedro determina a altura externa das naves laterais, excluindo as guglie. Na icnographia (fig. 3b), quatro unidades deste quadrado de 8 módulos equivalem ao comprimento máximo de toda a igreja.

Outro vestígio do sistema de quadratura deixado por Cesariano pode ser encontrado na icnographia (fig. 3b), onde ele identifica a" quadrata ecuba", a projeção da implantação do tibúrio, no centro do transepto, com um quadrado de lado 32 braças, 2 módulos, assinalado em verde nas figuras 3a e 3b, que é repetido nas dimensões do coro, e possui faces congruentes às do triângulo PQR. O tibúrio é definido por este quadrado de 2 módulos também em sua altura, que coincide com os segmentos XY e eQ na ortographia (fig. 4b), dimensões que são repetidas na abóbada da nave central (fig. 4b e 5b). Esta razão determina a largura da nave central e também de cada uma das naves laterais, de modo que a largura interna do corpo da igreja neste trecho corresponde a três unidades do quadrado de 2 módulos (fig. 3b, 4b e 5b). Esta medida da largura total das naves é também demarcada pela interseção do círculo de raio menor com a reta VRSX na scaenographia (fig. 5b). A altura das colunas de ordem menor das naves laterais são determinadas por esta razão de 2 módulos (32 braças) (fig. 4b e 5b), que coincidem com as bases dos triângulos segmento LMN e GAF, ambos na orthografia (fig. 4a e 4b).

Vitrúvio, a figura humana e o Duomo
É interessante ressaltar que Cesariano faz todo o estudo de proporções para a basílica milanesa regido por números, os quais garantem a estreita familiaridade fundamentada numa relação de interdependência entre os diferentes esquemas, seja aquele ad triangulum, ad quadratum ou ad circulum. No trecho já citado (CESARIANO. 1996 [1521], p. 465 c. 16r.), acerca dos segmentos HZ e ZK de 64 braças, a partir dos quais é possível" simetriare" toda a catedral de Milão, todas as" figuratione e corporature architetonice" e cada uma das coisas e corpos do mundo, Cesare faz uma referência evidente a obra de Platão (Timeu) insistindo na associação com a harmonia do mundo. A presença do círculo e do quadrado na comodulação do Duomo personifica a harmonia do homo bene figuratus, é nesta senda que Cesariano mostra não se afastar dos preceitos do De Architectura ou das práticas de proporcionalidade do quatrocentos ao eleger de um edifício do trezentos para exemplificar a symmetria.

Para o procedimento de estudo das proporcionalidades da basílica milanesa algumas justificativas foram aventadas pelos historiadores. Marco Rossi (1996, p. 53) considera que a intenção de Cesariano era conservar a importante tradição tardo-gótica da Catedral Milanesa, oferecendo-lhe uma dignidade vitruviana. Mas Cesariano não parece querer exaltar a cultura gótica, mas reforçar a atemporalidade dos princípios vitruvianos, para tanto elegeu um edifício que para ele era de fácil acesso, num esforço de mostrar que as prescrições do texto antigo podem também ser identificadas num edifício gótico. Para Carol H. Krinsky (1971, p. 214) Cesariano buscou associar as palavras vitruvianas com as edificações que estavam a seu alcance, na tentativa de reconstruir a arquitetura antiga. Para a historiadora, o autor renascentista estava certo em acreditar que o método utilizado para conceber a catedral milanesa era o mesmo procedimento geométrico de ideação utilizado por Vitrúvio nas descrições dos trechos dos Livros I, 2, 2 e VI, 3, 3-8. Também Manfredo Tafuri (1978, p. 420) coloca como razões para a exaltação gráfica de tal monumento a intenção de reconhecer uma rigorosa correspondência, apresentada pela estrutura, entre as partes e os princípios reguladores e o valor de homenagem de tais" tavole" a uma cultura municipal identificada na Fabbrica del Duomo. Ainda, Alessandro Rovetta (1996, p. 458) sugere, como o principal motivo da presença do Domo de Milão no comentário de Cesariano, a possibilidade de aplicar os cânones vitruvianos de eurythmia e symmetria também em uma construção de origem gótica.

Em seus comentários ao texto vitruviano, Cesariano frisa o vínculo entre a exegese e a peculiar cultura milanesa, a assumir maior força nos trechos referentes à descrição das espécies de dispositio, da tipologia de templos e da cidade. Em todos os casos o comentarista nomeia exemplos existentes em Milão como o Duomo, e a igreja de Sant' Ambrogio, ou mesmo a própria planta da cidade, para esclarecer o texto vitruviano. Cesare Cesariano busca identificar correspondências entre as descrições do autor antigo e o contexto Milanês de seu tempo, lembrando que essas duas realidades estão, de fato, assaz distantes. O que, por outro lado, como afirma Rovetta (ROVETTA. 2002, p. LIV), leva ao limite a ligação entre tradição e atualidade, que o autor pretende estabelecer através tanto de seu comentário como de suas ilustrações. Além disso, com Cesariano, o texto vitruviano se torna, como diz Tafuri (1978 p. 413), um" verdadeiro e próprio 'instrumento' de extrema flexibilidade".

Cesariano opta por elaborar uma tradução comentada do texto vitrúviano, e não um novo tratado, o que por vezes o restringe na formulação de propostas originais que estivessem à altura da arquitetura mais inovadora de seu tempo (ROVETTA. 2002, p. LIV). Ainda assim, o objetivo do autor não é apenas apresentar as explicações necessárias ao entendimento do texto vitruviano, mas ampliar o paralelo com os temas arquitetônicos mais problemáticos e contemporâneos (FIORE. 1983, p. 43).

Com este exemplo do Duomo, Cesariano mostra acreditar na atemporalidade dos conceitos vitruvianos, como se eles tivessem sido utilizados continuamente na ideação dos edifícios milaneses. Sua confiança na perenidade das" razões" antigas, evidenciado através do Domo de Milão, possibilitou que o tradutor-comentarista construísse os desenhos da igreja a partir de regras numéricas de proporcionalidade e alicerçado nas figuras geométricas do triângulo, do quadrado e do círculo, relacionando a harmonia da catedral à do corpo humano, em plena consonância com os moldes quatrocentistas.

Na concepção de Cesariano, a relação edifício-corpo pode ser identificada de duas maneiras distintas. A primeira consiste na ideação do desenho do Duomo a partir da composição das formas geométricas do quadrado e do círculo, de onde são extraídas todas as razões do edifício, uma construção geométrica intimamente ligada à figura do homo ad quadratum e ad circulum, cujas simmetrie euritmiate devem parametrar toda obra a ser concebida. A segunda é a articulação de cada uma das partes resultando num organismo único, ou seja, o edifício como um conjunto coeso que reflete a organicidade do mundo.
Ana Paula Giardini Pedro

Arquiteta e urbanista, doutoranda em Projeto, 
Espaço e Cultura pelo Programa de Pós-graduação 
da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), 
Rua dos Alecrins, 234, apto 81, Campinas, SP, CEP 13024-410, (19) 3254-0060, 

Fonte:Revista de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo-USP

http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?pid=S1984-45062008000200002&script=sci_arttext

CONTO DE NATAL 2010


Deitada no sofá em posição fetal, aninhava-se, fechando-se sobre si própria, envolvendo-se cada vez mais na sua tristeza, no seu desespero, na incrível solidão que naquele momento vivia.

Dia 24 de Dezembro, véspera de Natal!

Naquela manhã tinha-se levantado decidida a de uma vez por todas confirmar ou não, aquilo que o seu coração há muito lhe dizia, mas ela não queria acreditar.

Feito o teste, a resposta era inequívoca: Estava grávida!

Naquele momento, sozinha na casa de banho, tinham passado pela sua cabeça e pelo seu coração, os mais incríveis pensamentos, os mais inexplicáveis sentimentos!

Por um lado pensara que não podia ser, não era possível, e de maneira nenhuma podia aceitar aquele facto, pelo que tinha de lhe pôr fim muito rapidamente.
Por outro lado, sentira um amor que se desprendia do seu coração e a levara a acariciar a barriga como se alguma coisa já lá se sentisse.

Saiu da casa de banho e dirigiu-se para o quarto, com o “coração aos saltos” de nervosismo, mas também com uma sensação de medo.

Como iria o seu namorado reagir aquela notícia?

Ao vê-la, ele logo percebeu que alguma coisa se passava, pelo que de imediato lhe perguntou o que a preocupava.

Numa voz sentida e baixa, repassada de ternura e medo, ela respondeu-lhe dizendo que estava grávida.

Não precisava da resposta dele, pois o olhar incrédulo e ao mesmo tempo furioso, revelou sem margem para dúvidas o que ele pensava.

Nem se queria lembrar da discussão, das incríveis coisas que ele disse, do ar ofendido e revoltado com que se lhe dirigiu, e sobretudo da tomada de posição ao dizer-lhe que ela tinha de imediatamente pôr fim à gravidez.

Lembrava-se de não saber o que lhe responder, pois nela havia um misto de decisões e indecisões, que iam desde o aceitar o que ele propunha, até ao sentimento maternal que falava mais alto, e lhe dizia ao coração que ela não podia terminar aquela gravidez.

Ainda estavam nos seus ouvidos a “explosão” do bater da porta da rua e as últimas palavras duríssimas que dele ouviu: Nunca mais me pões a vista em cima!

Tinha ficado ali, sem reacção, prostrada, imóvel, sem perceber o que tinha acontecido.

Tinham passado uma óptima noite, as promessas de amor eterno, o casamento a marcar e, de repente … o mundo desabava-lhe em cima!

Percebeu que no estado em que estava não podia passar a noite de Natal em casa dos seus pais. Eles perceberiam de imediato que alguma coisa de grave se passava, e ela não queria dar explicações nenhumas, nem queria ouvir fosse o que fosse naquele dia!

Muito a custo telefonou-lhes tentando fazer uma voz normal, e arranjou uma desculpa mais ou menos verosímil para não estar com a família nesse dia.

Agora estava sozinha!

Há horas que estava naquela posição. A noite tinha chegado e ela nada tinha comido durante todo o dia. Apetecia-lhe morrer e ao mesmo tempo apetecia-lhe viver.

Falava com a sua barriga como se alguém a escutasse, fazendo juras que sozinhos os dois, mãe e filho, haviam de conseguir. Percebeu então que uma decisão estava tomada: Aquele filho ia nascer, contra tudo e contra todos!

Ficou um pouco mais animada com a consciência da decisão tomada, mas logo a perspectiva do futuro lhe caiu em cima com uma tal força, que se sentiu fechada numa gruta funda, sem luz, sem ânimo e sem esperança.

Olhou para o pequeno presépio que tinha na sala, e lembrou-se da Missa do Galo!

Não faltava a essa Missa desde que se lembrava de si própria, e por isso mesmo, decidiu com grande esforço que iria participar nela, mas a uma igreja diferente da habitual, claro, pois não queria encontrar a sua família.

Saiu para o frio da rua, o que lhe deu um pouco de alento, tendo-a despertado do torpor em que se tinha deixado envolver.

Procurou um lugar na igreja onde ficasse só, pois não queria sorrir a ninguém, não queria cumprimentar ninguém, não queria falar a ninguém.

A Missa passou sem ela dar conta e apercebeu-se então que já tinha chegado o momento da Comunhão.
Lembrou-se com alguma mágoa que, de acordo com o que tinha aprendido na família e na catequese, não poderia comungar a hóstia consagrada, dada a vida que vivia.

Mas também se lembrou ter aprendido que Jesus nunca abandonava aqueles que a Ele se dirigiam de coração aberto.
Ajoelhou-se e entrando dentro de si, falou com Aquele Menino que há tantos anos “via nascer” no presépio de casa dos seus pais.

“Jesus, eu não sei o que acreditar, mas sinto que de alguma maneira estás aqui comigo e me fazes companhia. E agora, Jesus, o que hei-de eu fazer?
Eu só quero sentir amor, sentir que não estou só, e que tomei a decisão correcta.
Sabes, Jesus, ele ofendeu-me muito, mas não lhe desejo mal. Olha lembro-me das Tuas palavras na Cruz e apetece-me dizer o mesmo: Perdoa-lhe que ele não sabe o que faz.”

Sentiu uma mão no ombro, que suavemente lhe chamava a atenção, e uma voz terna que lhe dizia:
- Desculpe mas tem que sair. A Missa já acabou e temos de fechar a igreja.

Não se tinha apercebido do tempo passar!
Balbuciou uma qualquer desculpa e saiu rapidamente para a rua.

Um sorriso aflorou os seus lábios. Não sabia o que se passava, mas uma paz, uma tranquilidade, uma alegria, invadiam o seu coração. Pela primeira vez nesse dia não teve medo da decisão tomada e teve a certeza inexplicável de que tudo iria correr bem, mesmo com as provações normais que uma situação como aquela acarretava, e que ela tinha decidido viver.

Quase ao chegar a casa, reparou num vulto que estava sentado nos degraus da entrada do prédio, todo dobrado sobre si próprio, por causa do frio, claro.
Não teve medo, mas apenas pena daquele pobre desgraçado que não devia ter onde ficar, e pediu a Jesus que o ajudasse também.

Ao subir os degraus da entrada, o vulto levantou-se, e prostrou-se de joelhos diante de si, dizendo apenas:
- Perdoa-me! Perdoa-me que eu nem sei as asneiras que disse, o mal que te fiz! Perdoa-me!

Olhou para a cara dele. As lágrimas corriam-lhe pela face, mas ele não se importava. Apenas não conseguia olhá-la nos olhos, de tão envergonhado que estava.

Puxou-o para cima, pegou-lhe na cara com as duas mãos, e deu-lhe um terno beijo nos lábios.

Numa voz entrecortada pelo choro, ele apenas dizia:
- Eu amo-te, eu amo-te, e a melhor expressão do meu amor, do nosso amor, é este filho nosso que trazes em ti e que eu quero viver contigo! Como pude ser tão cego, tão desumano, tão desprezível! Casamos amanhã, casamos mal seja possível! Eu quero estar contigo e viver todos esses momentos da tua gravidez, e do nascimento do nosso filho!

E não se calava, até que ela suavemente lhe colocou a mão nos lábios e o empurrou para dentro de casa.

Olhou para ele, fixamente nos olhos, e disse com a voz cheia de amor e ternura:
- O amor tudo vence! O passado já passou e não volta mais! Vivamos agora o presente e o futuro!

Ele aquietou-se e ficaram abraçados por um longo período de tempo, apenas gozando e sentindo a companhia um do outro.

Ela afastou-se então um pouco e disse-lhe:
- Hoje ainda tens que fazer mais uma coisa comigo, por mim e por ti.

Ele anuiu, baixando a cabeça.

Aproximaram-se então de mão dada do pequeno presépio, e ela ajoelhou-se com ele, dizendo:
- Agradece comigo a Jesus, o Amor que nasce no coração dos homens e que hoje renasceu nos nossos corações!

Lá fora ouviam-se vozes de jovens que cantavam:

“Noite feliz, noite feliz!
O Senhor, Deus de Amor,
Pobrezinho, nasceu em Belém
Eis na lapa Jesus, nosso Bem
Dorme em paz, ó Jesus!
Dorme em paz, ó Jesus! ”

ou então … eram os ouvidos dos seus corações unidos que assim ouviam.


Monte Real, 21 de Dezembro de 2010

Com este Conto de Natal, desejo a todas as minhas amigas e todos os meus amigos que aqui costumam ajudar-me nesta caminhada para Deus, por Deus e com Deus, um SANTO e FELIZ NATAL e um ANO NOVO cheio das bençãos de Deus.
Este Conto de Natal, constitui também a minha participação do 25º Dia de Caminhada para o Natal, que amanhã prossegue com a Gisele.
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Fonte:
QUE É A VERDADE

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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

FESTA DO NATAL TEM ORÍGENS PAGÃS

Data da festa do Natal                           tem origens pagãs

A questão do Natal é parecida com o mistério da concepção da Virgem Maria. Ninguém sabe ao certo como aconteceu. Nos primeiros séculos da nossa era, havia na Palestina até mesmo cristãos que comemoravam o nascimento de Jesus em maio. Tradição, aliás, que muitos alemães até pensam não ser uma má ideia, considerando o estresse de fazer as suas últimas compras de Natal enfrentando o frio e ruas abarrotadas de neve.
Natal invernal desde século 4º

A tradição de se festejar o Natal durante o inverno europeu foi estabelecida no século 4º. Em 336, o 25 de dezembro é mencionado oficialmente pela primeira vez como o aniversário de Jesus. Mas o motivo dessa escolha é discutido pelos estudiosos até hoje. Alguns dizem que a data decisiva para o cálculo foi o 25 de março, quando dia e noite têm duração igual.
A data já tinha significado importante na era pré-cristã, e os cristãos tomaram posse dela, como a dia em que um anjo anunciou a Maria que ela teria um filho. Nove meses depois, e estamos no dia 25 de dezembro.
Mas que ninguém pergunte como se sabia que o anjo apareceu exatamente no dia 25 de março, ou por que uma concepção divina deve necessariamente durar nove meses.
Cristãos reciclaram costumes de outros povos
A teoria mais difundida sobre o Natal no fim do ano evoca a "Festa do Sol Vitorioso", que os povos germânicos comemoravam no dia 21 de dezembro com muitas luzes. Eles temiam que o mundo saísse dos eixos, devido à longa escuridão e, com tochas e velas, garantiam que isso não iria acontecer, durante a noite mais longa do ano.
Já os cristãos, muito espertinhos, se apoderaram, conta-se, desse simbolismo de luzes e colocaram o nascimento do Messias, seu redentor, simplesmente na mesma data, dando um novo significado às festividades germânicas. Afinal, no Antigo Testamento o Salvador é, de fato, designado como a luz que virá ao mundo.
E como essa apropriação funcionou tão bem, os cristãos decidiram ao longo dos séculos também ir se apoderando de vários outros costumes pagãos. Um exemplo é a sempre verdejante árvore de Natal, um símbolo da fidelidade e da esperança, enfeitada com luzes, como sinal dos planos de Deus para salvar a humanidade.
Na Alemanha, assim como no Brasil, é na véspera de Natal que se presenteiam parentes e amigos. Porém o feriado é em 25 de dezembro, quando, em muitos países, também acontece a troca de presentes.
Autor: Martin Koch (md)
Revisão: Augusto Valente

  DW-Deutsche Welle Destaque

Alemanha | 24.12.2010


A MATÉRIA E ANTIMATÉRIA CRIADAS DO NADA

Matéria e antimatéria podem ser criadas do nada

Matéria e antimatéria podem ser criadas do nada
"A questão básica do que é o vácuo, o que não é o nada, vai além da ciência." [Imagem: iStockphoto/Evgeny Kuklev/Umich]
 
Sob as condições adequadas - que incluem um feixe de laser de ultra-alta intensidade e um acelerador de partículas de dois quilômetros de extensão - pode ser possível criar algo do nada.
É o que garante Igor Sokolov e seus colegas da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos.

O grupo desenvolveu novas equações que descrevem como um feixe de elétrons de alta energia, combinado com um intenso pulso de laser, pode rasgar o vácuo, liberando seus componentes fundamentais de matéria e antimatéria, e desencadear uma cascata de eventos que gera pares adicionais detectáveis de partículas e antipartículas.

Criar matéria do nada
Não é a primeira vez que cientistas afirmam que um super laser pode criar matéria do nada. De um nada que não é exatamente ausência de tudo, mas uma sopa fervilhante de ondas e campos de todos os tipos, onde partículas virtuais surgem e desaparecem o tempo todo.

Em 2008, um artigo publicado na revista Science descreveu como a matéria se origina de flutuações do vácuo quântico.

"Agora nós pudemos calcular como, a partir de um único elétron, podem ser produzidas várias centenas de partículas. Acreditamos que isso acontece na natureza, perto de pulsares e estrelas de nêutrons," afirma Igor Sokolov, um dos autores do estudo.

Foi um grupo de brasileiros que demonstrou recentemente que uma estrela de nêutrons pode acordar o vácuo quântico.

O que é o nada?
Na base de todos estes trabalhos está a idéia de que o vácuo quântico não é exatamente o nada.

"É melhor dizer, acompanhando o físico teórico Paul Dirac, que um vácuo, ou um nada, é a combinação de matéria e antimatéria - partículas e antipartículas. Sua densidade é tremenda, mas não podemos perceber nada delas porque seus efeitos observáveis anulam-se completamente," disse Sokolov.

Em condições normais, matéria e antimatéria destroem-se mutuamente assim que entram em contato uma com a outra, emitindo raios gama, que já se imaginou aproveitar para construir um laser de raios gama.

"Mas sob um forte campo eletromagnético, este aniquilamento, que tipicamente funciona como um ralo de escoamento, pode ser a fonte de novas partículas," explica John Nees, coautor do estudo. "No curso da aniquilação, surgem fótons gama, que podem produzir elétrons e pósitrons adicionais."
Um fóton gama é uma partícula de luz de alta energia. Um pósitron é um anti-elétron, uma partícula gêmea do elétron, com as mesmas propriedades, mas com carga positiva.

Reação em cadeia
Os que os cientistas calculam é que os fótons de raios gama produzirão uma reação em cadeia que poderá gerar partículas de matéria e antimatéria detectáveis.

Em um experimento, preveem eles, um campo de laser forte o suficiente irá gerar mais partículas do que as injetadas por meio de um acelerador de partículas.

No momento, não existe nenhum laboratório que tenha todas as condições necessárias - um super laser e um acelerador de partículas - para testar a teoria.

Mas, para Sokolov, o tema já é fascinante o suficiente do ponto de vista filosófico.

"A questão básica do que é o vácuo, o que não é o nada, vai além da ciência," afirma ele. "Ela está profundamente incorporada não apenas nos fundamentos da física teórica, mas também da nossa percepção filosófica de tudo - da realidade, da vida, e até mesmo da questão religiosa sobre se o mundo poderia ter vindo do nada."

Recentemente, físicos do LHC conseguiram capturar antimatéria pela primeira vez - veja também CERN dá mais um passo no estudo da antimatéria.
Bibliografia:

Pair Creation in QED-Strong Pulsed Laser Fields Interacting with Electron Beams
Igor Sokolov, Natalia Naumova, John Nees, Gérard Mourou
Physical Review Letters

Confirmado: a matéria é resultado de flutuações do vácuo quântico

Confirmado: a matéria é resultado de flutuações do vácuo quântico
[Imagem: Forschungszentrum Julich/Seitenplan/NASA/ESA/AURA-Caltech]
 
A teoria de que a matéria não tem fundações tão firmes quanto sugerem termos como "concreto" e "sólido" não é tão nova. Mas esta é a primeira vez que os cientistas conseguiram demonstrar que a matéria se origina de meras flutuações do vácuo quântico.

Modelo Padrão da Física
Uma equipe internacional de físicos demonstrou de forma conclusiva que o Modelo Padrão da física das partículas - a teoria que descreve as interações fundamentais das partículas elementares para formar toda a matéria visível no universo - explica com precisão a massa dos prótons e dos nêutrons.
"Mais de 99% da massa do universo visível é formado por prótons e nêutrons," afirma o estudo, publicado na revista Science. "Esses dois tipos de partículas são muito mais pesados do que os quarks e glúons que as constituem, e o Modelo Padrão da física deve explicar essa diferença."

O que faz com que a matéria seja matéria?
Cada próton e cada nêutron é formado por três quarks. Ocorre que esses três quarks juntos respondem apenas por 1% da massa de todo os prótons ou nêutrons. A explicação conclusiva que faltava era: Então, o que responde pelo restante da massa dessas partículas? Em outras palavras, "O que faz com que a matéria seja matéria?"

O Dr. Andreas S. Kronfeld explica que, como os núcleos atômicos formam quase todo o peso do mundo, e como esses núcleos são compostos de partículas chamadas quarks e glúons, "os físicos acreditam há muito tempo que a massa do núcleo atômico tem sua origem na complicada forma com que os glúons se ligam aos quarks, conforme as leis da cromodinâmica quântica (QCD - Quantum ChromoDynamics)."

Partículas virtuais
Os glúons são uma espécie de "partículas virtuais," que surgem e desaparecem de forma aleatória. O campo formado por essas partículas virtuais seria responsável pela força que une os quarks - a chamada força nuclear forte.

Ocorre que, como o número de interações reais e virtuais entre quarks e glúons é estimada na casa dos trilhões, é incrivelmente difícil, ou até mesmo impossível, usar as equações da QCD (cromodinâmica quântica) para calcular a força nuclear forte.

Os pesquisadores então criaram uma nova técnica, batizada por eles de Rede QCD, na qual o espaço é representando na forma de uma rede discreta de pontos, como os pixels de uma tela de computador. Este modelo permitiu que os cientistas incorporassem toda a física necessária e deu a eles o controle das aproximações numéricas e da taxa de erros nos cálculos da massa dos hádrons - prótons, nêutrons e píons.

A rede QCD reduz toda a complexidade das equações virtualmente insolúveis em um conjunto de integrais, que puderam ser programadas para solução em um programa de computador.

Isto permitiu que, pela primeira vez, os físicos incluíssem em seus cálculos as interações quark-antiquark, uma das maiores complexidades da força nuclear forte. Agora, além dos glúons, eles sabem que a massa dos quarks-antiquarks se origina da flutuação do vácuo quântico.

Diferença entre acreditar e saber
Conforme os pesquisadores, agora é possível eliminar a expressão "os físicos acreditam", substituindo-a por "os físicos sabem", quando o assunto é a QCD.
Segundo o Dr. Kronfeld, os cálculos revelaram que, "mesmo se a massa dos quarks for eliminada, o massa do núcleo não varia muito, um fenômeno algumas vezes chamado de 'massa sem massa'."

Toda a matéria do universo é virtual
A forma como a natureza cria a massa dos quarks é um dos assuntos de maior interesse dos físicos que irão trabalhar no Grande Colisor de Hádrons, o LHC,, que deverá começar a funcionar em 2009.

O LHC vai tentar confirmar experimentalmente a existência do chamado campo de Higgs, que explica a massa dos quarks individuais, dos elétrons e de algumas outras partículas. Ocorre que o campo de Higgs também cria a massa a partir das flutuações do vácuo quântico.

Ou seja, com a atual confirmação de que a massa dos glúons e quarks-antiquarks tem sua origem na flutuação do vácuo quântico, se o LHC confirmar a existência do campo de Higgs, então a conclusão inevitável será de que toda a matéria do universo é virtual, originando-se de meras flutuações de energia.

Fonte:
INOVAÇÃO Tecnológica
http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=materia-antimate
Redação do Site Inovação Tecnológica - 25/11/2008