Antropogênese:
A Concepção de Homem em Pierre Teilhard de
Chardin
Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia - FAJE
Alex Gonçalves Pin
Antropogênese:
_________________________
Belo Horizonte – MG
2008
1
Dedico este trabalho a dois companheiros
jesuítas que descobriram a grandeza de
Teilhard de Chardin e num gesto audacioso
escreveram obras que me auxiliaram nesta
pesquisa: aqui meu respeito e admiração a
Pedro Dalle Nogare e H. C. de Lima Vaz.
2
Apenas numa unificação pessoal com
algo de pessoal no todo, com a
personalidade do todo, poderemos ser
fundamentalmente e inexaustivamente
felizes. Tal é o último apelo do que se
chama amor. Logo, a substancial alegria
da vida encontra-se na consciência de
que, através de tudo o que
experimentamos, criamos, suportamos,
descobrimos ou sofremos, em nós
mesmos ou no próximo, em toda e
qualquer linha possível, de vida ou de
morte, aumentamos por degraus o
crescimento da Alma ou Espírito
universais1.
Pierre Teilhard de Chardin
SUMÁRIO
1 –
Introdução
2 – PRIMEIRO CAPÍTULO – A mensagem teilhardiana e a lei da
evolução
2.1 – A mensagem teilhardiana
2.2 – A lei da evolução
3 – SEGUNDO CAPÍTULO – O sentido da evolução e o terceiro infinito
3.1 – O sentido da evolução
3.2 – O terceiro infinito
4 – TERCEIRO CAPÍTULO
Consciência reflexiva, transcendência e
imanência
5 – Conclusão - Bibliografia
INTRODUÇÃO
Existem na história da cultura personalidades de grande relevância,
cuja contribuição através de escritos e grandes feitos encetaram um novo
rumo ou significado à marcha da humanidade. Há, pois, personalidades que,
para além de escritos e feitos, marcam a história, fundamentalmente, pelo que
são e pelo modo de viverem o cotidiano. Essa foi, em muitos sentidos, a
complexa e poliédrica personalidade do padre jesuíta Pierre Teilhard de
Chardin2, afamado cientista, pesquisador incansável e profeta místico do nosso tempo.
Teilhard de Chardin exerce um fascínio especial sobre os seus
leitores pela visão do homem que ele apresenta: uma visão dinâmica,
evolutiva, colocada numa justa relação com a visão do universo. Este, pois, não é mais concebido como uma realidade estática, mas, conforme os dados mais recentes das ciências positivas, é uma realidade em movimento, em evolução.
O pensamento de Teilhard de Chardin, em seu conjunto de obras,
forma uma concepção da totalidade do universo; i.é, mundo, homem, Deus.
Trata-se da articulação das ciências empíricas, em especial a física, filosofia e
teologia numa única ciência superior do fenômeno. O plano sobre o qual
Teilhard de Chardin trabalha é exatamente este: o fenomênico, mas o
fenômeno em sua totalidade. Nas palavras de Teilhard de Chardin, ver e fazer
ver.
No presente trabalho pretendo fazer ver a concepção de homem – e
não mais que esta – possível de ser encontrada na principal obra de Teilhard
Chardin, O Fenômeno humano3. Portanto, apresso-me em dizer: estarei
fazendo um certo recorte que ajude a ver o homem dentro deste plano:
mundo, homem, Deus. O recorte começa com a obra, estarei usando
exclusivamente o livro citado, com particular atenção à terceira parte
destinada a tratar o pensamento.
Outra advertência importante é quanto à necessidade de entender
que Teilhard de Chardin não é um pensador de escritório, mas um filho do
mundo, um peregrino cujo pensamento tem um correlato vivencial. Sua obra
não é sistemática, mas, no conjunto, forma um sistema que é evidência do
fenômeno. Nesse sentido, esforcei-me para reproduzir o modo de expressão
teilhardiano – valor vivencial da experiência expressa em um discurso de
linguagem coloquial em primeira pessoa.
A seqüência deste trabalho é: apresentação da mensagem
teilhardiana seguida da compreensão particular que o jesuíta tem da evolução.
O segundo capítulo retoma o primeiro, procurando evidenciar mais o modo de
Teilhard de Chardin conceber o homem e, arrematando, pois, no terceiro
capítulo, procuro inferir uma resposta – e basta que seja plausível – acerca da
questão qual a concepção de homem em Teilhard de Chardin.
Sabendo da ousadia desse projeto, reservo espaço à possibilidade de
não concluí-lo como gostaria e antecipo-me em apresentar minhas desculpas:
se a concepção teilhardiana de homem não abrir novas perspectivas à
pesquisa antropológica, a falha é toda minha, mas se as abrir, então,
evidenciei a grandeza e a atualidade do pensamento deste companheiro
jesuíta.
PRIMEIRO CAPÍTULO - A mensagem teilhardiana e a lei da evolução
2.1 – A mensagem teilhardiana
Para bem compreender a situação de Teilhard de Chardin, o sentido
de sua visão, é preciso levar em conta as coordenadas fundamentais que
definem o espaço cultural e espiritual da construção teilhardiana. Em
particular, interessa-me ver a situação em que se encontra o ser humano e o
que propõe Teilhard de Chardin. E nesse sentido, sua concepção de homem é
nova, não por ser uma visão que partiu do nada, mas por ter feito crescer, em
um terreno que parecia estéril, uma floração nova de problemas e de
perspectivas de respostas.
6
A difusão prodigiosa da mensagem teilhardiana mostra com
irrefutável evidência que o jesuíta caminhou no sentido de uma das mais
profundas aspirações do homem cristão contemporâneo no campo da cultura,
da integração, numa visão coerente do mundo, a saber, o que é o homem e
qual a posição que lhe é reservada no universo.
Teilhard de Chardin procurou fazer convergir a práxis científica e a
representação da realidade que dela resulta com a visão cristã. Assim, ele
proporcionou uma nova concepção de homem que decorre do encontro da
mais vigorosa tradição espiritual do Ocidente e os instrumentos decisivos de
interpretação e transformação do mundo; i.é, as ciências modernas, cuja
utilização determinará, em medida crescente, o destino do homem ocidental e,
já agora, de toda a humanidade.
Mas é preciso explicar: Teilhard de Chardin não pode transmitir sua
mensagem, sua experiência, dentro da terminologia tradicional da filosofia que
tinha aprendido, a filosofia escolástica já sistematizada e formalizada. Ele se
viu, pois, forçado a criar uma terminologia que exprimisse seu pensamento e
traduzisse sua experiência em uma nova linguagem. Daqui resulta muita das
incompreensões que ele sofreu. Claro está, também, que não posso fazer nos
limites destas páginas uma ampla comparação do pensamento de Teilhard de
Chardin com qualquer forma consagrada de filosofia ou teologia, sem deturpar
a ambas. Limito-me a dizer que ele percorreu a academia tradicional de
filosofia, teologia, os meios científicos, os departamentos de geologia e
paleontologia mais destacados de seu tempo e desse currículo fez emergir –
fez ver – um novo conhecimento: a Hiperfísica4. Um conhecimento que se
constitui numa grande física totalizante do saber humano, como pretendiam os
gregos, unificando toda a visão do real. Esse saber preocupa-se mais com
evidenciar o encaixe dos fenômenos, o seu mútuo entrançamento pelo qual
constituem a trama, o tecido, o estofo do real.
Ele mesmo fala de seu objetivo que constitui também seu método no
prólogo de O Fenômeno Humano:
Ver e Fazer Ver. Estas páginas representam um esforço de ver e fazer
ver o que passa a ser e o que exige o Homem, quando o inserimos,
4 ARCHANJO, José Luiz. A Hiperfísica de Teilhard de Chardin. Tese de Doutorado. São Paulo:
Faculdade São Bento, 1974.
7
todo inteiro e até o fim, no quadro das aparências... Ver: poder-se-ia
dizer que toda vida consiste nisso – se não finalmente, ao menos
essencialmente. Ver ou perecer eis a situação imposta pelo misterioso
dom da existência a tudo quanto é elemento do Universo. Eis, por
conseguinte, num grau superior, a condição humana5.
Trata-se, pois, de chegar à construção de um discurso holístico da
realidade por meio do diálogo entre ciências modernas, filosofia e teologia –
posso falar mesmo, em termos mais atuais, de uma transdisciplinaridade.
Teilhard de Chardin procurou fazer ver o Fenômeno que os fenômenos vão
compondo na sua sucessiva aparição.
O ponto de partida do itinerário teilhardiano pode ser situado num
terreno no qual se encontram a tradição do cosmologismo antigo6 e a noção
moderna de fenômeno. Com efeito, “a noção contemporânea de fenômeno não
se opõe mais à de coisa em si: o fenômeno é o em si da coisa em sua
manifestação, não constituindo apenas uma aparência da coisa, mas
identificando-se com seu ser”7.
O universo é fenômeno ou o que aparece, mas
esse aparecer tem como correlato uma forma de visão cuja estrutura e alcance
são definidos pelo saber científico. A hermenêutica desse modo peculiar de ver
o universo constitui uma fenomenologia, não como a de Husserl, mas no
sentido científico, propriamente teilhardiana. Teilhard de Chardin volta-se para
um determinado fenômeno que lhe parece fundamental e a partir dele vai
descrevendo círculos cada vez mais amplos até abranger toda a realidade que
aparece, assim, estruturada em função do problema inicial.
O núcleo da mensagem teilhardiana é a busca de um sentido, uma
direção, um fim, não só para a grande aventura cósmica de tudo o que existe,
mas fundamentalmente para a aventura humana; isto é, um sentido absoluto e
necessário. Todos os pesquisadores de Teilhard de Chardin são unânimes em
dizer que o problema de Deus ocupa o coração e o cerne do seu pensamento.
Contudo, não se trata do problema de Deus pura e simplesmente; antes,
Teilhard de Chardin concebe a questão dentro de uma malha de outras
questões cuja origem se encontra na “revolução dos tempos modernos”8. Foi
5 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 25.
6 Não sem razão declarou, certa vez, Teilhard de Chardin, considerar-se um físico ou
contemplador da physis no sentido em que eram os pré-socráticos.
7 Cf. ABBAGNANO. Nicola, Dicionário de Filosofia. Tradução [Alfredo Bosi]. São Paulo: Martins
Fontes: 2003, p.436.
8 Expressão do Pe. Vaz. Cf. VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Universo Científico e Visão Cristã em
Teilhard de Chardin. Petrópolis: Vozes, 1967, p.58.
8
ela que motivou a interrogação central das suas cogitações: desde que
tomamos consciência da profunda revolução espiritual sofrida pela
humanidade moderna, revolução espiritual intrinsecamente ligada a uma
revolução material, surge a irresistível interrogação: tem sentido para o
homem buscar uma direção que aponte Deus dentro do contexto desta grande
“revolução dos tempos modernos”?
Para melhor entender o problema é importante situar a questão da
seguinte forma: para o homem antigo Deus coroava a ordem do universo,
como uma espécie de soberano, presidindo um mundo organizado nos seus
mínimos pormenores. Esse mundo, porém, era representado por uma imagem
topográfica dentro de uma concepção marcadamente espacial: coroando-a,
Deus se mostrava situado numa região superior. A “revolução dos tempos
modernos”, porém, aboliu esse esquema espacial e proclamou, pelas ciências,
que o princípio fundamental de explicação da realidade não é a ordem estática
das coisas, mas a sua gênese, o seu nascimento. Destarte, veio substituir a
visão espacial do mundo uma outra visão, essa em que o tempo se mostra
como dimensão privilegiada. Surge então o problema: se a ordem espacial das
coisas não apresenta mais a estabilidade de que se revestia na concepção
antiga, restará ainda algum lugar para Deus? Ou Deus teria alguma função de
inteligibilidade num mundo evolutivo, no qual as coisas se explicam não pela
sua posição, mas pelo seu aparecimento, vida e morte?
Teilhard de Chardin
não ignora o fato de que essa mudança na forma de conceber o cosmos
resultou numa mudança da forma de conceber o homem. Interessa-me fazer
ver como Teilhard de Chardin pensou o homem, entender como ele conjugou
transcendência e imanência, espírito e matéria, origem e finalismo. E, aqui, ele
se vê na contramão da história: pensadores antigos e medievais, no mais das
vezes, viram o homem como um ser pronto, acabado, determinado por forças
extranaturais, tal qual viam o cosmos. Na atualidade o homem é visto como
pura natureza, mera biologia. Sugeriu-se que houvesse a interpretação do
código genético humano, o homem seria completamente conhecido. Essa
sugestão não se constata porque a informação acerca da finalização do Projeto
Genoma (Abril de 2003) que foi noticiada por vários meios de comunicação
como sendo a decifração do código genético humano está apenas
parcialmente correta. Está correta enquanto agora se conhece toda a
seqüência de nucleotídeos dos cromossomos humanos e genes de
cromossomos; incorreta enquanto ignora a existência de altas taxas de
mutação nas bases protéicas, os dados anteriores dizem respeito a códons do
DNA e a aminoácidos nas proteínas; decifrou-se genes dos cromossomos, mas
não as proteínas que eles codificam9.
A respeito da problemática do homem na
atualidade, Martin Heidegger, expoente máximo da análise existencial do
homem, exprimiu-se da seguinte forma:
Nenhuma época teve noções tão variadas e numerosas sobre o
Homem como a atual. Nenhuma época conseguiu, como a nossa,
apresentar o seu conhecimento acerca do Homem de modo tão eficaz
e fascinante, nem comunicá-lo de modo tão fácil e rápido. Mas também
é verdade que nenhuma época soube menos que a nossa, o que é o
Homem. Nunca o Homem assumiu um aspecto tão problemático como
atualmente10.
Heidegger diz, portanto, que as informações que as ciências nos
oferecem acerca do homem são válidas e preciosas, contudo, não favorecem a
compreensão holística do homem, a compreensão acerca do que é o homem.
Daí, poder-se concluir que, não convém e nem mesmo resultaria verdadeiro
formular uma concepção do homem puramente baseada nas constatações
científicas. Mas, tampouco resultaria verdadeiro pensar o homem
filosoficamente sem considerar a contribuição das ciências.
Creio que Teilhard de Chardin foi quem melhor entendeu essa
necessidade de conjugação e melhor desenvolveu um pensamento pautado
pela reflexão filosófica e investigação científica.
Já mencionei que a intenção primeira de Teilhard de Chardin é fazer
reconciliar o cristianismo com as ciências modernas. Reconciliar porque a
“revolução dos tempos modernos” colocou as respostas da Religião em um
plano – o mítico – e as da ciência em outro – o do mundo real. Teilhard de
Chardin tentará chegar às verdades da Religião por meios das ciências, mas
não às ciências como eram mecanicamente concebidas no melhor sentido
positivista. Ele também tem críticas às ciências e, nesse sentido, afirma:
9 Cf. <http://www2.portaluno.com.br/onze/> Acesso a 14 de maio de 2008.
10 HEIDEGGER. Martin. Kant und das Problems der Metaphysik, §37. Apud MONDIN, Battista. O
Homem, Quem é Ele? 12ª ed. São Paulo: Paulus, 2005, p. 08.
10
De fato, temos que confessar, a Ciência não lhe (o homem) encontrou
ainda um lugar nas suas representações do Universo. A Física chegou a
circunscrever provisoriamente o mundo do átomo. A Biologia logrou
estabelecer uma certa ordem nas construções da Vida. Apoiada na
Física e na Biologia a Antropologia explica, por sua vez, mas ou menos
a estrutura do corpo humano e certos mecanismos da sua fisiologia.
Mas uma vez reunidos todos os traços, o retrato, manifestamente, não
corresponde à realidade. O Homem, tal como a Ciência o consegue
restituir é um animal como os outros (...) Ora, a julgar pelos resultados
biológicos do seu aparecimento, não constitui ele precisamente algo
totalmente diferente?11.
Aqui estão as pilastras que sustentam a reflexão teilhardiana: a
transdisciplinaridade, teologia, filosofia e as ciências positivas, em especial a
física, todas sintetizadas na hiperfísica. Se a física circunscreveu o universo
sem o homem e o homem sem o universo, Teilhard de Chardin quer agora
fazer ver o homem circunscrito no universo; ou seja, fazer ver o homem no
universo enquanto lar do homem, enquanto lugar do homem na existência – o
universo como existenciário, i.é, o lugar da existência do homem. Com o
surgimento do homem o universo muda de pele, ganha uma alma. Estamos
prestes a ver emergir uma nova concepção de homem, concepção segundo a
qual: “O homem não é mais o centro estático do mundo, como por muito
tempo se acreditou, mas eixo e flecha da Evolução –, o que é muito mais
belo”12.
Passo então ao próximo tema: a lei da evolução. Entretanto antecipome
em dizer que não se tratará de ver exaustivamente todo o pensamento
teilhardiano acerca da evolução, mas tão-somente as linhas gerais que regem
o processo, bem como enumerar os pontos que servem de base para aquilo
que ouso chamar concepção teilhardiana de ser humano.
2.2 – A lei da evolução
A partir da categoria da evolução, Teilhard de Chardin construiu um
pensamento filosófico e antropológico que merece atenção em nossos dias. Ele
edificou um pensamento sólido sobre o homem que se pautou na noção de que
o processo evolutivo possui um sentido.
Antes, porém, de apresentar a antropologia teilhardiana faz-se mister
elucidar essa noção da evolução. Por evolução entende-se aqui a teoria
segundo a qual todos os seres derivam de outros seres mais simples – do
átomo, a molécula e o conjunto de molécula; deste a célula, então, o
organismo vivo que é completamente diferente dos anteriores – que os
precederam no tempo. Os mecanismos da evolução foram objeto de teorias
diversas entre as quais avultam as de J. B. C. de Lamarck (1744-1829), C.
Darwin (1809-1882) e Hugo de Vries (1848-1935).
Diferente do que pensaram os cientistas supracitados, para Teilhard
de Chardin faz-se evolução sobre um duplo plano biológico e psíquico, com um
paralelismo de acordo com uma lei por ele chamada: Lei de Complexidade-
Consciência13. Nesse sentido, é preciso distinguir três fatores em relação à
evolução14:
a) o fato mesmo;
b) o mecanismo;
c) o sentido.
No que se refere ao fato da evolução, não tem havido problemas
quanto à interpretação. Também o mecanismo, embora existam mais de uma
teoria – dentre as quais a Teoria Sintética, ganha a maioria dos cientistas – não causa demasiadas controvérsias. As divergências surgem quanto ao sentido.
Segundo Teilhard de Chardin, uma expansão original deu início a um
processo que passa pela formação da matéria, o surgimento da vida, a
condensação do pensamento e a emersão da reflexão – respectivamente:
cosmogênese, biogênese, psicogênese, noogênese.
Fundamentalmente, ele está nos dizendo que a evolução sugere um
processo crescente ascensional que hoje abarca todas as
dimensões da realidade e o marco de referência
desse processo, pelo qual decifrará o sentido da evolução: é a Lei de
complexidade-consciência. Em termos bastante simples esta lei significa que o
tecido do universo, a trama ou estofo evolui criando formas cada vez mais
complexas. A evolução parte da matéria simples – poeira espacial proveniente
da grande expansão – que se complexificando forma estruturas cada vez
maiores. Maiores não apenas em tamanho, mas (sob pena de não se entender
nada de Teilhard de Chardin) também em organização. Pela complexificação
uma molécula é mais organizada que um átomo; uma célula mais organizada
que uma molécula; um organismo pluricelular muito mais organizado que um
unicelular. Assim, complexidade não é heterogeneidade, mas heterogeneidade
organizada15.
Mas a complexificação é apenas uma vertente, uma dimensão da lei
que rege a evolução. A outra dimensão é a conscientização, interiorização
psíquica. Quer dizer, à medida que o estofo do universo se complexifica – dado
material, objetivo – simultaneamente emerge de dentro dele o fenômeno do
pensamento – dado espiritual, subjetivo.
Teilhard de Chardin parte da seguinte dedução: é inegável o fato da
complexificação da matéria, uma vez que com um pouco de complexificação
emergiu a vida na matéria, parece razoável que, com um pouco mais de
complexificação emerja o pensamento.
O padre Dalle Nogare explica a tese teilhardiana assim:
Teilhard prova sua posição assim: em virtude da unidade fundamental
do Universo, qualquer propriedade que apareça na matéria, a qualquer
nível de desenvolvimento, é propriedade que acompanha a matéria
onde quer que seja, apesar de não se poder constatar
experimentalmente em todos os níveis16.
Uma vez que não se pode negar a presença de psiquismo no reino
animal e extraordinariamente nos seres humanos, é plausível concluir que toda
matéria esteja permeada de psiquismo, ainda que não se possa medir. Daqui a
revolucionária conclusão teilhardiana, “o estofo do Universo tem uma face
interna e outra externa; isto é, ele é bifacial por estrutura, coextensivo ao Fora
das coisas, existe um Dentro das coisas”17.
Mas vamos ao texto conferir o que diz o padre Teilhard de Chardin:
A concentração de uma consciência, pode-se dizer, varia em razão
inversa da simplicidade do composto material que ela forra. Ou ainda:
uma consciência é tanto mais perfeita quanto mais rico mais bem
organizado é o edifício material que ela forra. Perfeição espiritual (ou
15 Proponho como exemplo de complexidade a diferença entre o tecido epitelial, formado pela justa e complexa relação de células e a areia, amontoado infinito de grãos cristalinos. Enquanto que a primeira relação – células com células – está organizada a quanto de formar algo novo e
diferente do elemento primitivo, a segunda relação – a dos grãos de areia – não passa de um amontoado do mesmo elemento primitivo. Daí ser o tecido epitelial algo muito mais complexo que a infinidade da areia.
16 DALLE NOGARE, 1988, p.176.17 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p.59. 13
centreidade consciente) e síntese material (ou complexidade) não são
senão as duas faces ou partes ligadas de um mesmo fenômeno18.
Concluído está que todas as coisas possuem um dentro e um fora,
uma consciência, uma espontaneidade, em grau diverso e proporcional a
complexificação do ser, proporcional à sua organização material.
Cabe aqui mencionar que Teilhard de Chardin dá ao termo
consciência um sentido que ultrapassa a acepção corrente. A consciência
refletida ou reflexiva está presente, exclusivamente, no homem; no animal há
uma espécie de consciência de percepção – consciência orgânica. O psiquismo
existe até mesmo no nível da matéria inerte em que se exprime em força
radical e é fator de integração e de centração. Psiquismo na matéria,
consciência orgânica no animal e reflexão (reflexibilidade) no homem são, para
Teilhard de Chardin, um único e mesmo fenômeno que se desenvolve no curso
da evolução, mas cujos estágios são separados por mutações sucessivas – diz
de uma gradação decorrente de metamorfoses.
Até aqui falei da mensagem teilhardiana, de como Teilhard de
Chardin elaborou uma terminologia e um saber próprio, baseado numa
transdisciplinaridade de caráter fenomenológico científico para transmitir sua
mensagem. Falei também da composição inicial do universo e de como a lei de
complexidade-consciência rege esse fenômeno – a gênese. Não falei ainda,
diretamente, da concepção teilhardiana de homem porque tentei explicar
primeiro como, para Teilhard de Chardin, a “revolução dos tempos modernos”
mudou a concepção de cosmos da sociedade científica; o que desencadeou
uma cisão entre o pensamento científico e a visão religiosa. Por isso, procurei
mostrar a intenção conciliadora de Teilhard de Chardin. Cabe, pois, agora
apresentar as linhas gerais do movimento da gênese, mostrando como o
homem está ligado a esse processo e ao mesmo tempo identificar qual é o
lugar ocupado pelo homem nesse universo que está nascendo.
SEGUNDO CAPÍTULO – O sentido da evolução e o terceiro infinito
3.1 – O sentido da evolução
Na altura em que interrompi o texto no primeiro capítulo ficou claro
que a noção teilhardiana de evolução equivale a uma lei dos fenômenos, uma
convergência temporal típica da realidade em estado de gênese contínua. Falei
de uma convergência que vai da poeira cósmica à matéria, começando com a
formação dos átomos; desses às moléculas e dessas aos vírus, seguindo
células, plantas, animais e, por último, o homem. Crescimento não apenas
material, mas também psíquico. Teilhard de Chardin vê nesse processo um
sentido ascensional crescente.
A evolução é, assim, um processo contínuo que atinge, em certo
momento, o espírito humano. A não-vida gerou a vida. Da matéria inorgânica
surgiu uma nova ordem, a biosfera. No entanto, o processo não terminou por
aí. O aparecimento da espécie humana que ocorreu graças ao lampejo da
consciência auto-reflexiva, é uma prova de que a lei da paralelidade
complexidade-consciência, que fundamenta o processo evolutivo, desemboca
no infinito; ou seja: a evolução continua. Considerando que a espécie humana
representa a própria evolução em marcha, posso concluir que o homem é o
que há de mais complexo no processo evolutivo e, simultaneamente, o que há
de mais consciente. Segundo a proposta teilhardiana é possível definir três
momentos na história de nosso planeta. Num primeiro momento, ocorre a
cosmogênese; no segundo, da não-vida surge a vida, que a partir da lei da
complexidade-consciência e do desenvolvimento de variadas formas de vida,
dá origem aos reinos vegetal e animal: é a biogênese; o momento em que a
citada lei, que constitui a base do processo evolutivo, se manifestou no
despertar da auto-reflexão do homem, unindo corpo e espírito: noogênese.
A partir de tal proposta, a orientação para o sentido de que falei acima, é algo
próprio do espírito humano. As três etapas demonstram que a evolução, até
agora, tem se orientado e tem seu sentido no homem. Tais considerações
serão tratadas no terceiro capítulo dedicado à antropogênese, etapa não
concluída – ressalto – e situada entre a biogênese e a noogênese, dentro da
perspectiva evolucionista de Teilhard de Chardin. Por enquanto continuarei
tratando do sentido da evolução dentro do pensamento teilhardiano.
O grau de conscientização, de interiorização psíquica das coisas está
na proporção direta de seu grau de complexificação material. Quanto mais
complexo, tanto mais conscientizado. Daqui emerge uma outra grande
intuição de Teilhard de Chardin.
A física comprova que cada infinito do
universo é caracterizado por fenômenos peculiares. Por exemplo, o
aparecimento e o desaparecimento do quantum no mundo subatômico ou a
relatividade do espaço na imensidão do universo19. Admitidos os fenômenos
peculiares ao infinitamente pequeno ou ínfimo e ao infinitamente grande ou
imenso; convém perguntar: qual será o efeito específico do infinitamente
complexo? Teilhard de Chardin afirma que vida, psiquismo, reflexão são efeitos
peculiares a complexificação da matéria. Com efeito, essa matéria na qual
emerge a vida é uma entidade composta; isto é, integrante de dois termos,
simultaneamente irredutíveis um ao outro, ontologicamente inseparáveis e
sujeitos a variações correlatas. Cumpre, desde já, observar que, no
pensamento teilhardiano, é altamente significativa a presença de entidades
pares, tais como, matéria-espirito, ser-união, universal-pessoal, entre outras.
Não se trata de composições verbais a camuflar dualidades irresolúveis de
tempos antigos, nem meros neologismos: são noções inéditas, termos
originais, idéias ou conceitos inaugurais de um universo visto de modo novo.
Esta tese possibilita, não só uma compreensão coerente dessa
camada do mundo na qual nos movemos, a saber, a biosfera, como também
permite eliminar qualquer forma de dualismo: matéria e vida; corpo e mente;
vida e espírito. Por que coloca tudo em um único e mesmo rumo e sentido.
Tudo depende de tudo, como numa teia.
Com efeito, se estudo o universo, a terra, essa camada denominada
geosfera sem levar em conta a vida e a reflexão nela presentes é inevitável ver
a terra como um planeta insignificante para a compreensão do universo. Isso
porque a terra é algo de ínfimo e perdido na imensidão espacial. Não tem
grande significação do ponto de vista astrofísico, sendo um pequeno planeta
ornado de um único satélite, girando em torno de um sol em um universo onde
pode haver milhões.
Entretanto, se considero o fenômeno vida, então, a situação se
converte, completamente, porque a vida apresenta propriedades
absolutamente novas e diferentes das propriedades físico-químicas da matéria
inorgânica. Se ousar dar um outro passo e considerar o fenômeno da reflexão,
então, vejo emergir uma verdadeira revolução no universo porque noto um
avanço contínuo em complexidade e consciência o que coloca o homem na
ponta da lança do processo evolutivo: “O Homem constituindo, por si só, a
mais nova, a mais fresca, a mais complicada, a mais matizada das camadas
sucessivas da Vida”20.
Sempre segundo Teilhard de Chardin, colocando a hipótese do
sentido ascensional crescente da evolução, tudo no universo se torna mais
claro, mais harmonioso, mais coerente. Uma ponte, antes de tudo, é projetada; uma conexão natural é estabelecida entre mundos até agora considerados opostos, separados: o da física e o da psicologia, o da matéria e o do espírito.
Não que essa conexão torne idênticos espírito e matéria, mas no sentido de
que se radica organicamente, fisicamente, no mesmo processo cósmico que
envolve tudo. Num universo evolutivo que se vai fazendo, na direção da flecha do tempo – em cuja ponta está o homem – por complexidade sempre maior, todo ser é, de certo modo, síntese dos que lhe antecederam e lhe são inferiores. Nesse sentido, posso dizer que cada ser tomado hiperfisicamente é
composição superadora e inovadora de seus antecessores físicos, nele
transformados. Teilhard de Chardin define com essa hipótese21 a continuidade
Trata-se de uma hipótese visto que não foi cientificamente comprovada tal interpretação do processo evolutivo.
e descontinuidade com que ocorre o processo evolutivo: “... acaba de se
revelar à natureza do passo da reflexão. Mudança de estado, em primeiro
lugar. Mas, em seguida, e por isso mesmo, começo de uma outra espécie de
vida – precisamente essa vida interior...”22, ou retomando o que já fora citado:
“... precisamente em virtude dessa permanência na operação, é fatal, do ponto
de vista da física, que certos saltos transformem bruscamente o sujeito
submetido à operação”.
Teilhard de Chardin apresenta o sentido ascensional crescente da
evolução e o enriquecimento que esse processo garante aos seres posteriores;
ou seja, quanto mais tardio o surgimento de uma espécie, mas complexa e
consciente essa espécie se revela. Dado que a espécie humana aparece por
último na ordem dos seres, ela constitui o que há de mais elaborado no planeta
– é forçoso pensar. Dessa posição peculiar e especial emerge a antropologia
evolutiva teilhardiana: o homem como o mais complexo e consciente dos
seres. Passo agora a ver exatamente a questão: ‘o mais complexo-consciente
– O terceiro infinito
A Física descobriu – falara Pascal – dois infinitos no universo, o
infinitamente grande ou imenso e o infinitamente pequeno ou ínfimo. Com
base no processo de complexificação-conscientização, Teilhard de Chardin irá
apresentar um novo infinito: o infinitamente complexo-consciente.
Trata-se do primado do homem. Considerando o universo um sistema
orgânico dinâmico em vias de complexificação material e interiorização
psíquica é dado ver o homem, na linguagem teilhardiana, como ‘eixo e flecha
da evolução’. O homem não é um acidente fortuito do acaso, mas, ao
contrário, o ponto para o qual a evolução caminhou até agora.
Não só dois, mas três infinitos no universo: imenso, ínfimo e
complexo-consciente: isto é, o espaço sideral: das galáxias, estrelas, sistemas
solares; o espaço subatômico: dos quantum, dos elétrons; e o mundo humano:
do pensamento, da reflexão (a noosfera; ou seja, esfera da qual só nós
participamos, a nenhum outro ser é dado nela viver).
22 Ibid., p.189.
18
O homem entendido como ponto atual da evolução constitui o
terceiro infinito do universo. A fundamentação dessa afirmação é a curvatura
do processo complexificação-conscientização: o universo estende sua
expansão ao infinito, não só em dois sentidos, mas em três. Esse terceiro
sentido estabelece a ponte projetada entre os mundos e evidencia a unidade
do real.
O homem representa mesmo uma novidade para o mundo, não só
para o mundo material, mas, sobretudo, para o mundo da vida. Com efeito, até
aqui a física e a biologia têm trabalhado de forma a pensar o homem a partir
de um único pressuposto, a saber, o homem como mais um animal dentro do
reino animal – ainda que seja dotado de características particulares, só mais
um entre outros –, estudando-o sem considerar o processo evolutivo em sua
continuidade e em sua descontinuidade. Nesse sentido, Teilhard de Chardin
observa que o processo evolutivo, embora seja contínuo, ascensional crescente
é também marcado por verdadeiros saltos, nítidas descontinuidades.
O
aparecimento da espécie humana representa um desses saltos – crescimento
quantitativo e ascensão qualitativa.
Caracterizado por uma singularidade exclusiva, o homem na
concepção teilhardiana representa uma novidade para o mundo e é Teilhard de
Chardin quem o afirma:
Explode a desproporção que falseia toda classificação do mundo vivo
em que o Homem não figura logicamente senão como gênero novo ou
uma nova família. Erro de perspectiva que desfigura e descoroa o
Fenômeno universal! Para dar ao Homem o seu verdadeiro lugar na
Natureza, não basta abrir nos quadros da Sistemática uma seção
suplementar, - mesmo uma Ordem, mesmo um Ramo a mais... Pela
hominização23 a despeito das insignificâncias do salto anatômico, é
uma Idade nova que começa. A Terra muda de pele. Melhor ainda,
encontra a sua alma24.
Até aqui, poder-se-ia dizer que pouco ou nada separa o pensamento
de Teilhard de Chardin de um cientificismo antropológico materialista,
entretanto, o pensamento teilhardiano está longe de reduzir ou segmentar a
natureza humana ao materialismo. Retomando o conceito de evolução, eu dizia
23 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, pp.197-201; 223-225. O termo hominização é usado por Teilhard
de Chardin para designar a passagem progressiva da vida animal não reflexiva para a vida
humana reflexiva. Diz, pois, da passagem da consciência orgânica à consciência reflexiva [grifo
meu].
24 Ibid., p.197.
19
que esta caminha para formas cada vez mais complexas e conscientes, porém,
ao contrário do que se poderia pensar, esse processo não é uma marcha
gradual, contínua e lenta. A evolução na concepção teilhardiana passa por
momentos revolucionários, dá verdadeiros saltos qualitativos.
O surgimento da vida sobre a terra pode ser considerado um salto,
uma elevação sobre tudo o que existia antes da vida. Equivale dizer que a vida
representa uma descontinuidade dentro da continuidade do processo
evolutivo, um momento de crise de primeira grandeza qualitativa – subiu-se
um novo degrau na escala da evolução.
Um salto semelhante foi dado quando da emersão do pensamento
reflexivo, da consciência. Algo de inteiramente novo, de extraordinário e
inesperado aconteceu sobre a terra quando a primeira luz de inteligência
brilhou no cérebro humano. Um hiato de imensa distância se abriu entre o
passado e o presente: o pensamento vem por evolução da matéria, mas não se
explica pela matéria. Segundo Teilhard de Chardin:
A mudança de estado biológico que leva ao despertar do pensamento
não corresponde simplesmente a um ponto crítico atravessado pelo
indivíduo, ou mesmo a Espécie. Mais vasta do que isso, ela afeta a
própria Vida na sua totalidade orgânica, e, por conseqüência, assinala
uma transformação que afeta o estado do planeta inteiro25.
Teilhard de Chardin quer fazer ver que o aparecimento da espécie
humana com seu cérebro super desenvolvido, sua capacidade de reflexão ou
consciência de si mesma, de saber que se sabe, evidencia a emersão do
espírito sobre a superfície da terra. O fenômeno humano é fenômeno espiritual,
não nasce senão de uma profunda transformação de tudo aquilo que o
precedeu e preparou, mas ao aparecer apresenta características inteiramente
novas. O núcleo a partir do qual se expande essa novidade é o espírito, é a
dimensão espiritual da espécie humana, dimensão impregnada de
profundidade. Núcleo que já estava presente em tudo o que antecedeu o
surgimento do ser humano, mas de forma muito opaca, imperceptível mesmo.
Posso deduzir do pensamento teilhardiano que: o fenômeno humano
não é apenas constituído pela seqüência de complexificação material e
interiorização psíquica, mas também por manifestação do espírito.
O ser
humano é composto por três dimensões fundamentais, existem outras
dimensões, mas essas três compreendem as outras porque se encontram
ligadas desde o momento da hominização. Trata-se da: exterioridade, a relação
material que o homem estabelece com o mundo que o cerca; a interioridade,
diz da relação psíquica que o homem desenvolve consigo mesmo e com seu
semelhante; e a profundidade, refere-se àquelas relações do homem que
respondem ou apontam para âmbitos de grande significado para si mesmo.
Por mais íntima que seja a ligação entre o homem e as formas
inferiores de vida, por mais clara e importante que seja a continuidade entre a
vida animal e a vida humana, a consideração objetiva do fenômeno humano
deve reconhecer uma descontinuidade maior, uma ruptura, uma outra forma
de vida. Tem início com o homem o fenômeno da vida no espírito; i.é, não
apenas viver, mas saber que se vive.
Todavia, cumpre esclarecer que para Teilhard de Chardin, o
fenômeno espiritual não é uma espécie de epifenômeno26, é antes de tudo um
fenômeno da mudança cósmica de estado. A matéria se interioriza enquanto
matéria, orientada pela lei de complexidade-consciência e movida pela
natureza que lhe é constitutiva por força de sua unidade profunda. O
movimento cósmico por excelência é, simultaneamente, a complexificaçãoconscientização:
um pouco de complexificação, a vida; um pouco mais, o
psiquismo; ainda um pouco mais, o espírito.
Assim, Teilhard de Chardin muda a compreensão da relação espírito
e matéria. Em um cosmo estático, espírito e matéria tendem a ser
considerados apenas duas categorias justapostas, entre as quais ponte alguma
pode ser lançada. Chegamos a um dualismo de fundo, uma matéria separada
de um espírito que também está separado da matéria. Em um universo em
vias de expansão, cosmogênese, de tipo convergente, sentido crescente
ascensional, a gênese do espírito necessita da organização da matéria. Entre
os dois elementos reina uma relação comparável à que une os termos de um
todo – por exemplo, o que o esquerdo significa para o direito e vice-versa.
Para
26 Epifenômeno equivale a um tipo de fenômeno acessório cuja presença ou ausência não
importa para a produção do fenômeno essencial em questão. Teilhard de Chardin nega que o
fenômeno espiritual seja um epifenômeno, ou seja, afirma que o fenômeno espiritual é de suma
importância para a compreensão do homem e do universo mesmo. Cf. TEILHARD DE CHARDIN,
2006, pp.186-188 e 244.
21
que apareça espírito é preciso que haja matéria organizada, porque existe um
laço entre a quantidade de matéria organizada e o grau de consciência. Eis o
que satisfaz o pensamento humano e sua necessidade de unidade: espírito e
matéria são duas faces ou fases de uma mesma realidade, e se quero mais
espírito careço de mais organização material. No plano dos fenômenos – e é
esse o plano sobre o qual estou trabalhando –, da observação concreta, o
espírito aparece em função da matéria. E isto não é materialismo. Em estado
de cosmos; ou seja, numa visão imobilista, o espírito é uma forma sem
conteúdo, um brilho da matéria, porém, sob o ponto de vista da cosmogênese,
nada me impede de dizer que a superestrutura consciente – espírito –
desabrocha a partir de dentro da infra-estrutura material.
O materialista
poderia afirmar que o sistema teilhardiano se sustenta, em sua conclusão,
sobre a matéria. No entanto, para o espiritualismo teilhardiano, o que subsiste
como essencial é à parte espiritualizada, o cume é o espiritual: numa via
progressiva interessa o ponto final, o ponto ômega, que no caso do
pensamento teilhardiano é a espiritualização crescente e ascendente da
matéria à medida que se organiza enquanto matéria.
Em suma, de um modo não pouco metafísico, mas, sobretudo,
fenomenológico e científico, Teilhard de Chardin recusa qualquer dualismo e
todo maniqueísmo em sua compreensão da realidade.
A realidade, repito, é um todo orgânico
e neste todo tudo se sustenta sobre tudo.
Tudo depende de tudo
– como numa teia.
Os espiritualistas têm razão quando defendem tão energicamente uma
certa transcendência do Homem, em relação ao resto da Natureza. Os
materialistas também não estão errados quando sustentam que o
Homem é apenas mais um termo na série das formas animais. Neste
caso, como em tantos outros, as duas evidências antitéticas se
resolvem num movimento, desde que, nesse movimento se reserve à
parte essencial ao fenômeno, tão altamente natural, de ‘mudança de
estado’... Sim, da célula ao animal pensante, assim como do átomo à
célula, um mesmo processo (aquecimento ou concentração psíquica)
prossegue sem interrupção, sempre no mesmo sentido. Mas,
precisamente em virtude dessa permanência na operação, é fatal, do
ponto de vista da Física, que certos saltos transformem bruscamente o
sujeito submetido à operação27.
Garantido o espaço do fenômeno e o espaço do processo, é possível
ver a unidade do real na linha contínua dessa caminhada cujos saltos
27 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 189.
22
representam uma superação que compreende as partes superadas.
Paulatinamente, cosmogênese, seguindo, biogênese e noogênese. Um só
processo, continuidade, marcado por saltos qualitativos, descontinuidade, que
hoje culminam no ser humano.
Sintetizando este segundo capítulo, indiquei que o sentido da
evolução é a espiritualização da matéria e que até aqui a evolução caminhou
no sentido do surgimento do ser humano. Este constitui, pois, o terceiro infinito
do universo; i.é, o infinitamente complexo-consciente. Claro está que não me
posso demorar mais nesses temas (embora haja ainda muito o que se explicar)
do pensamento teilhardiano, dado os limites de minha pesquisa. Passo agora à
terceira parte deste trabalho destinada à antropogênese, aqui entendida como
a concepção de homem em Teilhard de Chardin.
23
TERCEIRO CAPÍTULO – Consciência reflexiva, transcendência e
imanência
Muito do que já foi dito nos capítulos anteriores desenhou, por assim
dizer, uma imagem teilhardiana de homem. Trato agora de sintetizar essas
informações e fazer algumas inferências que me parecem plausíveis.
Tendo chegado ao homem a evolução não parou nele, ela se
transmuda profundamente: não caminha mais no sentido do surgimento do
homem, mas agora se apresenta encarnada nele. O próprio ser humano é
evolução; é itinerário rumo à união, à socialização – que pode ser resumido no
termo: espiritualização. Sempre segundo Teilhard de Chardin:
A Humanidade trabalhando, sob o impulso de um instinto obscuro,
para transbordar ao redor de seu ponto de emersão até submergir a
Terra. O Pensamento fazendo-se Número para conquistar todo o
espaço habitável, acima de qualquer outra forma da Vida. Em outras
palavras, o Espírito tecendo e desdobrando as camadas da Noosfera.
Nesse esforço de multiplicação e de expansão organizada, resumem-se
e exprimem-se finalmente, para quem sabe ver, toda a Pré-História e
toda a História, desde as origens até os nossos dias28.
A hominização evidencia o estágio em que se identificam, mas não se
confundem indiferentemente, a evolução e o ser humano.
Neste modo de ver, o homem é ápice da evolução que não terminou
nele, ela dá continuidade ao seu itinerário até o ponto máximo de
espiritualização da matéria, convencionalmente, chamado por Teilhard de
Chardin de ponto ômega29. Trata-se de uma espécie de centro definido pela
última convergência do espírito sobre si mesmo, o ponto natural de
convergência da humanidade e, por meio da humanidade, de todo o universo;
em linguagem religiosa, o encontro definitivo da humanidade com o Deus de
Jesus Cristo; a letra grega ômega sugere conclusão, arremate.
Com o aparecimento do terceiro infinito a evolução adquire
conhecimento de si mesma, nas palavras do jesuíta francês, ganha uma alma,
o que coloca o homem na posição de responsável pelo futuro da marcha
cósmica em direção ao ômega.
28 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p.214.
29 Ibid., pp. 293-302.
24
Mas cabe então perguntar, e tenho o colocado diversas vezes, qual a
concepção de homem que encontramos nos meandros do pensamento de
Pierre Teilhard de Chardin?
A concepção de homem de Teilhard de Chardin, segundo Emile
Rideau30, se expande a partir de dois caracteres primordiais, distintos e
complementares.
O primeiro, a transcendência do homem em relação ao
universo e, simultaneamente, a sua ligação ao mundo; a estrutura psíquica
dotada de consciência reflexiva constitui o segundo aspecto.
A fenomenologia que evidenciou o sentido crescente ascensional da
evolução evidenciou também a emersão da consciência reflexiva, atributo
exclusivo do ser humano.
E, falar da consciência do homem é falar
simultaneamente de sua transcendência e imanência.
O homem sabe que sabe; sabe de si mesmo e sabe do meio no qual
se move. Pode, pois, o homem agir acerca de si mesmo e sobre o seu
ambiente; pode construir, derrubar, reconstruir; pode pensar novos rumos,
novos caminhos, alternativas. Pode dominar o real:
Mas observemos um pouco melhor à nossa volta: esse dilúvio súbito de
cerebralidade: essa invasão biológica de um novo tipo animal que
elimina ou subjuga gradualmente toda forma de vida que não seja
humana; essa maré irresistível de campos e de fábricas; esse imenso
edifício crescente de matéria e de idéias31.
O animal sabe – em certo sentido, pode-se dizer –, mas não sabe que
sabe, conseqüentemente, está fechado para ele todo um domínio do real – no
qual o homem se move.
O real não lhe pertence, não lhe é dado.
Assim, enquanto que para o ser dotado de consciência reflexiva, o
real se apresenta como um horizonte de possibilidades, para aquele sem
reflexibilidade aparece como um fosso intransponível.
A consciência reflexiva possui, portanto, uma ligação bastante
estreita com a transcendência humana para Teilhard de Chardin.
Primordialmente, a transcendência se manifesta na ação humana e a
reflexibilidade é um ato peculiar, exclusivo mesmo, do homem que é capaz de
ultrapassar a animalidade – é um fenômeno espiritual, como já mencionei.
30 RIDEAU, Emile. O Pensamento de Teilhard de Chardin. Tradução [Teresa Raposo.] Lisboa:
Livraria Duas Cidades, 1965, p. 159.
31 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 198.
25
O ser reflexivo, precisamente em virtude de sua inflexão sobre si
mesmo, torna-se de repente susceptível de se desenvolver numa
esfera nova. Na realidade, é um outro mundo que nasce. Abstração,
lógica, opções e invenções ponderadas, matemáticas, arte, percepção
calculada do espaço e da duração, ansiedades e sonhos de amor...
Todas essas atividades da vida interior nada mais são que a
efervescência do centro recém-formado explodindo sobre si mesmo32.
Além de considerar que a reflexibilidade representa um salto
qualitativo do processo evolutivo, Teilhard de Chardin aponta para a idéia de
que esta possui um dinamismo próprio, a saber: “1) de tudo centrar
parcialmente a sua volta; 2) de poder centrar-se cada vez mais sobre si
mesma; 3) de ser levada, por essa própria Centração, a se reunir a todos os
outros centros que a rodeiam”33.
Essa tríplice propriedade da consciência
permitiu a Teilhard de Chardin formular o conceito de noosfera; i.é, o centro
recém-formado referido na citação acima. Segundo o jesuíta:
Exatamente tão extensiva, mas muito mais coerente ainda, como
veremos, do que todas as camadas precedentes, é verdadeiramente
uma camada nova, a ‘camada pensante’, que, após ter germinado nos
fins do Terciário, se expande desde então por cima do mundo das
Plantas e dos animais: fora e acima da Biosfera, uma Noosfera34.
Noosfera é a camada da vida reflexiva sobre a terra, uma nova
esfera, um todo específico e orgânico que, embora distinto, engloba a biosfera
– a esfera da vida não-reflexiva – e a geosfera – a esfera do corpo sólido da
terra, pré-vivo em linguagem teilhardiana.
Esta, a noosfera, esfera na qual o homem se move, é a parte do real
que lhe cabe, o seu lugar no universo, o seu existenciário – mas, é importante
destacar que também esta camada está em expansão junto com o universo.
Como se trata de uma esfera e, considerando-se que o movimento
sobre uma esfera é circular, pode-se falar de um encontro da humanidade,
uma socialização dos seres humanos pela noosfera; i.é, a terceira propriedade
da consciência, a capacidade de se reunir a todos os outros centros que a
rodeiam. Por isso, Teilhard de Chardin pode afirma que agora o processo
32 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 186.
33 Ibid., p. 294.
34 Ibid., p. 197.
26
evolutivo tende na direção de sintetizar e constituir um todo espiritual –
reunião de todos as raças e civilizações humanas35.
A esse ambiente no qual se move – a noosfera, e lembro que ela
compreende também a biosfera e a geosfera – o ser humano se liga e
transcende simultaneamente. O homem que age, que ultrapassa os limites da
animalidade e as determinações da matéria não seria possível sem mundo. O
homem é um ser histórico, temporal, obedece à lei de complexidadeconsciência
e, por isso, intimamente ligado ao mundo. Mas essa ligação longe
de constituir uma limitação, mostra, faz ver que o homem se encontra em
conjunção com a totalidade do universo, comunga da existência de todas as
coisas. A observação do processo evolutivo revela esse dado: há no homem a
convergência do todo.
No sistema teilhardiano, se é que posso usar este termo,
transcendência e imanência são dimensões de uma única e mesma realidade.
São dimensões que se perpassam, se entrecruzam e que em alguns momentos
se apresentam antepostas, assim como o esquerdo se antepõe ao direito, o
dentro ao fora, o acima ao abaixo. Todavia, como o esquerdo que se antepõe
e, simultaneamente, completa o direto e, assim também, o dentro completa o
fora e o acima se antepõe e completa o abaixo, do mesmo modo
transcendência e imanência. Num primeiro momento essas dimensões
humanas se antepõem, mas quando observadas sob o prisma do processo
evolutivo elas se complementam porque são dimensões da única e mesma
realidade para a qual tudo converge; i.é, o homem.
Que é, então, o homem e o que quer dizer Teilhard de Chardin ao
chamá-lo, em citações anteriores, de alma da terra e eixo e flecha da
evolução? Creio que ele está dizendo que: o homem é um ser que, consciente
de si mesmo e do meio no qual se move e dotado de uma energia profunda,
pode caminhar em direção a um fim, o ômega; é também um ser de
dimensões: transcendente no que se relaciona à sua profundidade; consciente
no que se refere à interioridade; imanente no que diz da exterioridade. Numa
palavra, eu digo que, na concepção teilhardiana, o homem é o existente; isto é,
aquele que por excelência existe, isto porque sabe que existe e, embora
35 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, pp. 214 a 228. Capítulo com o título: O Desdobramento da
Noosfera.
27
Teilhard de Chardin não tenha usado especificamente esse termo, creio que é
isso exatamente que ele quer dizer ao afirmar:
Se, como decorre do que foi dito, é o fato de se encontrar ‘refletido’
que constitui o ser verdadeiramente ‘inteligente’, podemos nós duvidar
de que a inteligência seja o apanágio evolutivo do Homem e só do
Homem? E podemos nós, por conseguinte, hesitar em reconhecer, por
não sei que falsa modéstia, que sua posse representa para o Homem
um avanço radical em relação a Vida antes dele?36.
Em relação a tudo mais que existe, por ser reflexivo, o homem não é
apenas diferente, mas é outro. A vida biológica que manifestou a ascensão de
consciência não pode continuar sua trajetória indefinidamente sem se
transformar profundamente, sem dar um salto. Ela assumiu consciência de si,
tornou-se existência no existente. A grandeza tornou-se diferente de si para
continuar ela mesma, fez-se homem.
Teilhard de Chardin fez ver o ser humano, então, como terceiro
infinito, ligado ao mundo e, simultaneamente, transcendente, como portador
da evolução nos tempos atuais; fez ver o homem em sua totalidade, um ser de
dimensões para o qual, de certa forma tudo converge. E eu agora fiz a
inferência do termo o existente – um vocábulo a mais para fazer ver o
fenômeno humano. Que conclusão é possível tirar de tudo isso? Creio que,
fundamentalmente, é possível concluir que o ser humano é um ser em
processo de vir-a-ser aquilo que ele é realmente ou àquilo que poderá ser. É
um ser inacabado, não pronto. E nenhum termo ou terminologia, tomada
isoladamente o esgota, o classifica completamente. Nenhuma ciência sozinha é
capaz de conhecê-lo definitivamente e dizer o que ele é, porque o que ele é
não se completou. Uma hiperfísica, uma ciência que o veja em sua totalidade e
imerso na totalidade do seu universo é capaz de traçar as linhas gerais do
fenômeno humano – por isso falou o jesuíta: “o fenômeno, mas o fenômeno
inteiro”37. Portanto, não há antropologia, o que há é antropogênese; quero
dizer, a gênese do ser humano. Falar do homem, estudá-lo, ver o homem não é
enquadrá-lo no sistema dessa ou daquela disciplina é contribuir com a sua
gênese, é dar continuidade ao processo evolutivo que começou com a
formação do universo e da terra, seguiu com o aparecimento da vida neste
36 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 187.
37 Ibid., 2006, p. 25.
28
planeta, chegou ao estágio em que se encontra – o ser existente – e segue,
seja com a socialização ou com a espiritualização, enfim, segue seu sentido
ascensional crescente.
Esta é a natureza humana e sua grandeza – e também seu desafio –,
ser alguém cujo universo e o futuro representam um horizonte de
possibilidades, ser alguém que não pode ser enquadrado porque está em
movimento, porque transcende a tudo que se lhe apresenta como obstáculo,
pensa alternativas, quebra esquemas, re-interpreta interditos e ao mesmo
tempo se liga a tudo, se identifica no mundo, se encontra no mundo, mas se
liga e se identifica por aquela dimensão de profundidade, por aquela
capacidade de descobrir significado e, concomitantemente, significar o real. O
homem não mais
centro estático do Universo, como ingenuamente o havíamos
acreditado – mas, o que é muito mais belo, o Homem flecha
ascendente da grande síntese biológica. O Homem constituindo, por si
só, a mais nova, a mais fresca, a mais complicada, a mais matizada
das Camadas sucessivas da Vida38.
CONCLUSÃO
Há uma limitação de primeira grandeza no meu texto, limitei-me e
esforcei-me a fazer ver o filósofo Teilhard de Chardin. Concentrei minha
atenção na fenomenologia do homem e não atentei ao caráter teológico do
autor. Essa opção foi necessária para manter-me fiel ao tema específico a que
38 TEILHARD DE CHARDIN, 2006, p. 246.
29
me propus e dado os limites de minha pesquisa. Faltou, portanto, apresentar
melhor a fundamentação teológica do pensamento teilhardiano e explicar a
prospectiva inferida por Teilhard de Chardin; ou seja, explicar o rumo que ele
aponta para o processo evolutivo; i.é, fiquei a dever a explicação dos conceitos
de socialização, espiritualização e, finalmente, do ponto ômega. Estes
conceitos, contudo, versam acerca de um pensamento mais teológico do que
filosófico – portanto, não era objetivo meu e não me vejo apto para esclarecer
tais conceitos hoje.
Não obstante, porém, a esse recorte, creio ter conseguido fazer ver
os traços gerais da concepção de homem de Teilhard de Chardin. Creio ter
mostrado o que concluiu a fenomenologia que observou o homem em sua
totalidade e imerso na totalidade do universo no qual ele se move. Cumpre
dizer que o valor primeiro deste trabalho consiste em resgatar o cerne do
pensamento de um autor que depois de ter se tornado uma “febre” caiu em
esquecimento e ficou relegado à história do pensamento contemporâneo. Em
cada momento que parei para ler ou escrever acerca deste jesuíta francês que
muito admiro, tive presente a consciência de pertencer a uma geração que não
conhece Teilhard de Chardin e que vive a angústia de não ter dado atenção
para aquilo a que ele tanto chamou a atenção, a saber, o que é o homem e
qual o seu lugar no universo. A grandeza deste trabalho, portanto, – se é que
ele tem alguma – está na possibilidade de ser melhorado, enriquecido,
aprofundado e, o digo com franqueza e serenidade, em ser superado.
BIBLIOGRAFIA
Primária:
TEILHARD DE CHARDIN, Pierre. O Fenômeno Humano. Tradução José Luiz
Archanjo. 1ª Edição, 6ª Re-impressão. São Paulo: Cultrix, 2006.
· Secundária:
ABBAGNANO. Nicola, Dicionário de Filosofia. Tradução Alfredo Bosi. São Paulo:
Martins Fontes: 2003.
30
ARCHANJO, José Luiz. A Hiperfísica de Teilhard de Chardin. Tese de Doutorado.
São Paulo: Faculdade São Bento, 1974.
CUENOT, Claude. Aventura e Visão de Teilhard de Chardin. Tradução Camilo
Martins de Oliveira. Lisboa: Livraria Duas Cidades, 1966.
DALLE NOGARE, Pedro. Humanismo e Anti-humanismo. 11ª edição. Petrópolis:
Vozes, 1988.
MONDIN, Battista. O Homem, Quem é Ele? 12ª ed. São Paulo: Paulus, 2005.
RIDEAU, Emile. O Pensamento de Teilhard de Chardin. Tradução Teresa
Raposo. Lisboa: Livraria Duas Cidades, 1965.
VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Universo Científico e Visão Cristã em Teilhard
de Chardin. Petrópolis: Vozes, 1967.
· Sites Consultados:
<http://www.teilhard.org>
<http://www2.portaluno.com.br/onze/>
31
2 Dados biográficos de: CUENOT, Claude. Aventura e Visão de Teilhard de Chardin. Tradução
[Camilo Martins de Oliveira]. Lisboa: Livraria Duas Cidades, 1966. Apresento um pequeno resumo
da vida de Teilhard de Chardin: O primeiro registro da família Teilhard data de 1325. Uma
escritura prova a existência de Pierre Teilhard, um notário em Dienne, atual Auvergne, França.
Em 1686 nasce Marguerite Catherine Arouet irmã de Voltaire, bisavó de Berthe Adélie de
Dompierre d´Hornoy. Data de 1816 a carta na qual Luis XVIII confirma nobreza de Pierre Teilhard
avô de Pierre-Cirice Teilhard. Este, em 1841, casa-se com Marie Marguerite Victoire Barron de
Chardin, donde a aquisição do nome ‘de Chardin’ pelos filhos de Pierre-Cirice Teilhard, dentre os
quais, Emanuel Teilhard de Chardin que se casará, em 1875, com Berthe Adélie de Dompierre d
´Hornoy os país de Marie-Joseph Pierre Teilhard de Chardin. Pierre Teilhard de Chardin nascido
na França em 1881 e tendo falecido nos Estados Unidos em 1955, entrou na Companhia de Jesus
em 1899. Estudou matemática, filosofia e teologia antes de fazer-se padre, depois, continuou os
estudos em geologia e paleontologia. Foi professor no Cairo, Egito. Pesquisador na China,
Mongólia, Índia, África do Sul e Estados Unidos. Tendo viajado quase o mundo todo e sendo
pessoa de personalidade empática, humilde e profunda, conquistou muitos amigos que, após sua
morte, organizaram-se na Association des Amis de Teilhard de Chardin (site:
http://www.teilhard.org), com representação em mais de seis paises e que ainda hoje organiza e
publica escritos de ou sobre Teilhard de Chardin. Entre os grandes feitos científicos de Teilhard
de Chardin, conta-se a participação da expedição que em 1930, na China, encontrou o fóssil do
Sinanthropus Pequinenses, ancestral distante do homo sapiens. As obras completas somam mais
de doze volumes, dentre as quais, as mais conhecidas são O Meio Divino (1927-28) e O
Fenômeno Humano (1938).
3 TEILHARD DE CHARDIN, Pierre. O Fenômeno Humano. Tradução [José Luiz Archanjo]. 1ª Edição,
6ª Re-impressão. São Paulo: Cultrix, 2006.
5
-------o0o--------
Pablo Picasso
Li
Fonte: