Veja como foi achado o único exemplar intacto
e totalmente preservado desta obra, e que foi salva
graças às habilidades de um contrabandista de antiguidades.
Porque para todo egípcio era importante
ser enterrado com um exemplar deste livro.
Segundo pesquisadores,
foi do Livro Egípcio dos Mortos
que o suposto Moisés (se existiu), copiou os 10 mandamentos.
O Livro dos Mortos O Livro dos Mortos
.
Durante o Império Novo (c. de 1550 a 1070 a.C.) a maior parte das fórmulas
dos textos dos sarcófagos, acrescidas de diversas estrofes novas, passaram a ser escritas em rolos de papiro, os quais eram colocados nos ataúdes ou em algum local da câmara sepulcral, geralmente em um nicho cavado com essa finalidade. Quando postos no sarcófago costumavam ser encaixados entre as pernas dos corpos, logo acima dos tornozelos ou perto da parte superior das coxas, antes de serem passadas as bandagens. Tais textos, que formam um conjunto com cerca de 200 estrofes referentes ao mundo do além-túmulo, ilustrados com desenhos para ajudar o defunto na sua viagem para a eternidade, foram intitulados pelos modernos arqueólogos de Livro dos Mortos. Entretanto, conforme explica o especialista em história antiga, A. Abu Bakr, esse título é até certo ponto enganoso: na verdade, nunca existiu um "livro" desse gênero; a escolha das estrofes escritas em cada papiro variava segundo o tamanho do rolo, a preferência do adquirente e a opinião do sacerdote-escriba que as transcrevia. Um "Livro dos Mortos" médio continha entre 40 e 50 estrofes.
Para os egípcios esse conjunto de textos era considerado como obra do deus Thoth. As fórmulas contidas nesses escritos podiam garantir ao morto uma viagem tranquila para o paraíso e, como estavam grafadas sobre um material de baixo custo, permitiam que qualquer pessoa tivesse acesso a uma terra bem-aventurada, o que antes só estava ao alcance do rei e da nobreza.
Em verdade, essa compilação de textos era intitulada pelos egípcios de Capítulos do Sair à Luz ou Fórmulas para Voltar à Luz (Reu nu pert em hru), o que por si só já indica o espírito que presidia a reunião dos escritos, ainda que desordenados. Era objetivo desse compêndio, nos ensina o historiador Maurice Crouzet, fornecer ao defunto todas as indicações necessárias para triunfar das inúmeras armadilhas materiais ou espirituais que o esperavam na rota do "ocidente"
As cenas do julgamento do falecido fazem parte daquela rota e, portanto, de tais papiros.
A decisão era tomada no Saguão das Duas Verdades, um grande salão no qual ficava uma grande balança destinada a pesar o coração do morto. A solenidade é assim resumida pelo egiptólogo Kurt Lange: Osíris, senhor da eternidade, está sentado como um rei no seu trono. Tem em suas mãos o cetro e o leque. Por trás dele, mantêm-se habitualmente suas irmãs Ísis e Néftis. Na outra extremidade, vê-se a deusa da justiça, Maat, introduzir o morto ou a morta. No meio do quadro está desenhada a grande balança em que o peso do coração é comparado ao duma pluma de avestruz, símbolo da verdade. A pesagem é confiada a Hórus e ao guardião das múmias, de cabeça de chacal, Anúbis. O deus Thoth, de cabeça de íbis, senhor da sabedoria e da escrita, anota o resultado da pesagem sobre um papiro, por meio de um cálamo. Quarenta e dois juízes — correspondendo quarenta e duas províncias do Egito — assistem à operação. Diante desse tribunal é que o candidato à eternidade deve fazer as declarações nas quais afirma nunca se ter tornado culpado de certo número de faltas para com seus semelhantes, para com os deuses, para com sua própria pessoa e o bem alheio. Se a sentença dos juízes fosse favorável ao morto, Hórus tomava-o pela mão e o conduzia ao trono de Osíris, que lhe indicava seu lugar no reino do além. Essa é a cena que vemos na ilustração do alto da página. Ela pertence ao Livro dos Mortos de Hunefer, obra originária de Tebas e datada da XIX dinastia (c. 1307 a 1196 a.C.). Caso contrário, o morto estaria cheio de pecados e, então, seria comido por um terrível monstro, Ammut, o devorador dos mortos, que vemos na ilustração acima ao lado de Anúbis. Acima, foto © Canadian Museum of Civilization Corporation
A idéia central do Livro dos Mortos é o respeito à verdade e à justiça, mostrando o elevado ideal da sociedade egípcia. Era crença geral que diante de Osíris de nada valeriam as riquezas, nem a posição social do falecido, mas que apenas seus atos seriam levados em conta. Foi justamente no Egito que esse enfoque de que a sorte dos mortos dependia do valor de sua conduta moral enquanto vivo ocorreu pela primeira vez na história da humanidade. Mil anos mais tarde, — diz Kurt Lange — essa idéia altamente moral não se espalhara ainda por nenhum dos povos civilizados que conhecemos. Em Babilônia, como entre os hebreus, os bons e os maus eram vítimas no além, e sem discernimento, das mesmas vicissitudes.
Não resta dúvida de que o julgamento de seus atos após a morte devia preocupar, e muito, a maioria dos egípcios, religiosos que eram. Mas — pondera Crouzet — a provação era de tal espécie, que podia ser sobrepujada por uma memória eficaz, ajudada pelo papiro colocado junto ao cadáver, que possibilitaria ao defunto enunciar certas sentenças soberanas. Como afastar a palavra "magia", e negar que o emprego destas fórmulas era considerado suficiente para apagar os erros da vida terrena? É claro que o crente era convidado a não cometê-los: seria a melhor maneira de garantir a sua salvação futura. Mas nenhuma reserva, em parte alguma, limitava a eficácia das receitas de que tratava de munir-se, desde que fosse obstinado, embora culpado.
É preciso que se diga que embora o Livro dos Mortos tenha aparecido grafado em papiros apenas a partir do Império Novo, sua origem é muito mais antiga, anterior até mesmo ao período dinástico. Inicialmente, contando apenas com poucas estrofes relativamente simples, adequadas aos costumes de uma época remota, seu conteúdo era transmitido de forma oral. Com o aumento da quantidade e da complexidade dos textos, os sacerdotes se viram obrigados a escrevê-los antes que se perdessem da memória dos fiéis. Num processo de cópias sucessivas foram introduzidas variações e enganos, tanto por equívoco na leitura dos caracteres quanto por desleixo, cansaço do copista e acréscimos feitos pelo próprio escriba interessado em impor sua opinião. A cópia mais antiga encontrada foi escrita para Nu, filho do intendente da casa do intendente do selo, Amen-hetep, e da dona de casa, Senseneb. Esse valioso documento, avaliam os arqueólogos, não pode ser posterior ao início da XVIII dinastia (c. de 1550 a.C.). Ele faz referência a datas dos textos que transcreve e uma delas se refere aos idos de um dos faraós da I dinastia (c. de 2920 a 2770 a.C.).
Foi nos sepulcros de Tebas que os pesquisadores encontraram a maior parte das cópias do Livro dos Mortos. Em tais papiros os comprimentos variam entre 4,57 e 27,43 metros e a largura entre 30,48 e 45,72 centímetros. No início do Império Novo os textos são sempre escritos com tinta preta e os hieróglifos dispostos em colunas verticais, separadas entre si por linhas pretas. Títulos, palavras iniciais dos capítulos, rubricas e chamadas são grafadas com tinta vermelha. Os escribas também enfeitavam os papiros com vinhetas de traços pretos, às vezes copiadas de ataúdes e documentos de dinastias bem anteriores como a XI (c. de 2134 a 1991 a.C), por exemplo. A partir da XIX dinastia (c. de 1307 a 1196 a.C.) as vinhetas passaram a ser pintadas com cores muito brilhantes e cresceram de importância, ao passo que o texto passou a ocupar uma posição secundária. Um dos mais belos papiros ilustrados que existem é o assim chamado Papiro de Ani, cujas vinhetas representam cenas mitológicas, nomes de deuses e cenas do julgamento dos mortos.
No decorrer da XXI e da XXII dinastias (c. de 1070 a 712 a.C.) houve deterioração do trabalho de escribas e desenhistas e a qualidade do mesmo diminuiu sensivelmente, além de ter havido alterações no conteúdo dos textos. Outros temas não relacionados com o mundo dos mortos, como a criação do mundo, por exemplo, foram incluídos nos papiros dessa época. Às vezes o texto nada tem a ver com a vinheta que o acompanha. Nesse período também se estabeleceu o costume de encher com os papiros figuras ocas de madeira do deus Osíris, as quais eram colocadas nos túmulos. Quando os papiros diminuíram de tamanho, passaram a ser armazenados em cavidades menores nas bases de tais figuras. Do final da XXII dinastia em diante, até o início da XXVI dinastia (664 a.C.) ocorreu um período de desordem e tumulto. Os sacerdotes perderam gradualmente o seu poder religoso e temporal e a crise provocou redução das despesas com cerimônias funerárias, tendo caído em desuso o costume de se fazer cópias do Livro dos Mortos.
Quando os faraós da XXVI dinastia assumiram o poder houve uma renovação dos antigos costumes mortuários, templos foram restaurados e textos antigos esquecidos foram relembrados e novamente copiados. No que se refere ao Livro dos Mortos tais cópias passaram a ser feitas de forma sistemática. Os capítulos passaram a ter uma ordem fixa, mantidos na mesma ordem relativa nos diversos papiros, ainda que alguns contivessem mais texto do que os outros, e quatro capítulos novos foram acrescentados, refletindo as novas idéias religiosas da época. Esses escritos continuaram a ser usados durante o período ptolomaico (304 a 30 a.C.). Nessa época, porém, só eram grafados os textos que se acreditava absolutamente necessários à salvação do morto. Textos que refletiam uma mitologia há muito esquecida eram ignorados.
As Crenças Funerárias As Crenças
Os antigos egípcios formularam algumas teorias a respeito dos elementos que formavam o ser humano. Um de tais elementos era o ba, palavra que pode ser traduzida por sublime, nobre, poderoso e cuja idéia se assemelha ao nosso conceito de alma. Nos papiros e monumentos ele está representado por um falcão com cabeça humana, como nessa vinheta extraída do Livro dos Mortos do escriba Ani. O arqueólogo E. A. Wallis Budge explica que o ba podia deixar a sepultura e subir ao céu onde se acreditava que desfrutasse de uma existência eterna num estado de glória; era-lhe dado, no entanto, revisitar o corpo na tumba, e não deixava de fazê-lo; e, conforme certos textos, parecia capaz de reanimá-lo e manter conversação com ele.
Outro elemento era o ka, a força viva que acompanhava uma pessoa desde o nascimento e que, depois da morte, habitava os restos mumificados do defunto, sustentado por oferendas. Ele é definido pelo autor já citado como uma individualidade ou personalidade abstrata, dotada de todos os atributos característicos e que possuía existência independente. Tinha liberdade para mover-se de um lugar a outro da terra, à sua vontade, e podia entrar no céu e conversar com os deuses. As oferendas feitas nos túmulos em todos os períodos visavam a alimentar o ka, que era capaz, segundo se supunha, de comer, beber e apreciar o cheiro do incenso. No período em que se edificaram as pirâmides acreditava-se que o falecido, de certo modo, podia ser purificado, sentar-se e comer pão com ele "incessantemente e para sempre".
Como se vê, em certo sentido o ka corresponde ao "eu" do indivíduo. Nasceu com a pessoa e forma parte integrante do seu ser mas, apesar disso, é encarado em alguns aspectos como distinto dele. Era para esse ka que os egípcios providenciavam todo o equipamento funerário, a comida e a bebida das tumbas e o próprio túmulo era conhecido como a casa do Ka. O ka atravessaria muitos perigos para alcançar a vida aterna após a morte.
Amuletos simbólicos e feitiços escritos no Livro dos Mortos o protegeriam. Esculturas colocadas nas tumbas representando o morto de corpo inteiro impediriam o ka de vagar para muito longe e o abrigariam se a múmia fosse destruída. O salão superior de uma mastaba abrigava o ka e a falsa-porta permitia que ele circulasse entre o mundo dos vivos e o dos mortos. São incluídos navios e barcaças nos funerais porque segundo a mitologia egípcia o ka viaja para o além-túmulo num barco Nilo abaixo.
Um terceiro elemento era o espírito ou inteligência espiritual, denominado de khu e entendido como uma forma brilhante, luminosa e intangível do corpo. As funções desse elemento não são muito claras, mas ele também ia para o céu viver com os deuses. Para evitar que ficasse aprisionado no túmulo, eram recitadas fórmulas especiais
Finalmente, kat era a palavra que denominava o corpo físico e esse termo indica algo que tem a decadência como componente que lhe é inerente. Era isto — diz Wallis Budge — que se enterrava na tumba após a mumificação, e o objetivo dos amuletos, cerimônias mágicas, orações e fórmulas, desde os primeiros até os últimos tempos, era preservá-lo de toda e qualquer destruição. O próprio deus Osíris possuía um corpo nessas condições e os seus vários membros eram preservados como relíquias em diversos santuários do Egito.
Entretanto, os egípcios sempre reconheceram, mesmo quando o processo de mumificação estava em seu auge, que os cuidados que tomavam para preservação dos corpos eram insuficientes para atingir os efeitos desejados. Um dos meios de contornar essa situação foi apelar para a magia. No culto aos mortos, acreditavam que um modelo podia servir de substituto para qualquer coisa que fosse na prática dificil de suprir como objeto real. Por exemplo, — escreve I.E.S.Edwards — em algumas mastabas da II dinastia (c. 2770 a 2649 a.C.), vasos falsos eram usados ao invés de vasilhas cheias de provisões e supunha-se que teriam a mesma validade para o ocupante da tumba. De forma similar, uma estátua ou mesmo uma figura esculpida em relevo era considerada como sendo um substituto efetivo para o corpo humano na eventualidade de sua destruição.
Por essa razão, e considerando que a múmia podia ser destruída, colocavam no túmulo uma ou várias imagens do defunto. Se o corpo se deteriorasse, o ka poderia penetrar em uma dessas figuras as quais, para maior garantia, eram confeccionadas em material duro como madeira, calcário ou granito.
Uma das mastabas mais conhecidas da III dinastia (c. 2649 a 2575 a.C.), pertencente ao chefe dos dentistas e dos médicos de nome Hezyre, apresentava figuras de seu proprietário esculpidas em relevo em painéis de madeira embutidos em nichos da parede leste da construção. Tais imagens tinham por finalidade permitir que Hezyre saisse e retornasse livremente ao seu túmulo. Porém, painéis expostos eram muito vulneráveis e os arquitetos egípcios criaram, dentro das mastabas, um cômodo fechado, que ficou conhecido modernamente com o nome de serdab, destinado a receber a estátua do morto a qual, assim, ficava melhor protegida.
O uso crescente da pedra na estatuária, ao invés da madeira, aumentou ainda mais a garantia de que o ka encontraria sempre a maneira de se perpetuar. A ilustração acima mostra uma estátua esculpida quase em tamanho natural, encontrada em Gizé na mastaba de um vizir da IV dinastia (c. 2575 a 2465 a.C.).
Outro artifício mágico, utilizado no decorrer tanto da IV quanto da V dinastia (c. 2465 a 2323 a.C.), era a representação em pedra da cabeça do defunto, a qual era colocada na câmara mortuária. Presume-se que se destinavam a servir como substitutas da cabeça verdadeira, caso essa viesse a ser destruída. Chamadas de cabeças de reserva, eram verdadeiros retratos do morto. Nos modelos encontrados, as orelhas estão geralmente quebradas e às vezes existe uma linha de incisão que vai do topo à parte posterior do crânio. Os arqueólogos não conseguiram explicar o motivo de tais mutilações.
Havendo a crença de que o ka podia continuar a viver no interior do túmulo, tornava-se imperioso alimentá-lo. Nos primeiros anos após o falecimento, os descendentes piedosos cuidavam da tarefa levando oferendas ao sepulcro: bolos de cevada, guloseimas, frutas, legumes, peças de carne, etc. Porém, todos sabiam que com o passar do tempo o morto seria esquecido. Por esse motivo, passaram a representar nas paredes tumulares a produção, o preparo dos alimentos e outras atividades do cotidiano, sobretudo aquelas que o falecido gostaria de vivenciar novamente no além. Cenas que o mostrassem caçando, como essa que se vê ao lado da mastaba de Kayemmi, pescando ou inspecionando suas propriedades — acreditava-se — lhe forneceriam os meios para que pudesse continuar com tais atividades após a morte. Igualmente as cenas de colheita, de abate de animais, de fabricação de pão ou de cerveja garantiriam um constante suprimento dos alimentos cuja produção representavam.
Para eliminar qualquer risco do espírito do morto não reconhecer sua estátua — esclarece I.E.S.Edwards — ela é geralmente identificada com o seu nome e títulos em hieróglifos. De forma similar, nas cenas esculpidas em relevo, breves inscrições explanatórias são inseridas como uma espécie de comentário, dando frequentemente os nomes das pessoas representadas e, às vezes, descrevendo as ações que elas executam. Tais pessoas são geralmente parentes do morto ou seus criados, que têm assim assegurados um pós-vida a serviço de seu amo.
Apesar de toda a representação pictórica, um suprimento regular de provisões frescas sempre foi considerado essencial para o bem estar do morto. Para recebê-las existia nas mastabas um altar baixo e plano em frente à falsa-porta construída na parede oeste da capela do culto. As primeiras oferendas provavelmente eram trazidas por um filho que assim, provendo as necessidades de seu pai, simbolizava Hórus, o filho de Osíris. As oferendas subsequentes, entretanto, eram trazidas por sacerdotes mortuários — chamados de servidores do ka — que a isso estavam obrigados por contratos escritos e eram pagos pelo serviço. Tais pagamentos eram representados por propriedades deixadas em testamento aos sacerdotes pelo morto. As terras passavam automaticamente para os sucessores dos sacerdotes, os quais herdavam também as obrigações religiosas com relação ao túmulo.
A prática, entretanto, demonstrou que até os mais rígidos contratos eram cumpridos apenas por um período limitado. Foi por essa razão que, desde os tempos primitivos, foram introduzidas nos sepulcros as chamadas estelas funerárias, como essa que se vê ao lado de Amenemhet I, cuja finalidade era a de substituir as verdadeiras oferendas. Elas continham uma fórmula mágica — explica I.E.S.Edwards — declarando que o morto havia recebido as oferendas diárias em abundância; acima da fórmula havia geralmente uma cena, esculpida em relevo, mostrando-o sentado à uma mesa repleta de oferendas a ele apresentadas pelos membros de sua família. Embora não visassem dispensar o suprimento regular de provisões frescas, a estela, por meio do poder mágico de suas palavras escritas, fornecia ao morto um valioso método de garantia contra a desnutrição e a negligência.
Outro elemento de proteção à espiritualidade do morto consistia em gravar, nos sarcófagos e nas paredes dos túmulos, cenas e inscrições que eram adaptações do mito sobre a morte de Osíris e encantamentos que visavam proteger o falecido em sua perigosa jornada pelo mundo subterrâneo. A etapa final da passagem para o além-túmulo era o julgamento do defunto por Osíris, deus do mundo subterrâneo, em um ritual conhecido como a Pesagem do Coração. Se a pessoa tivesse levado uma vida correta, seria julgada merecedora da vida eterna. Muitos dos encantamentos destinavam-se a garantir um julgamento favorável. Durante o Império Novo (c. de 1550 a 1070 a.C.) tais textos passaram a ser escritos em papiro e eram chamados de Capítulos do Sair à Luz e nos tempos modernos ficaram conhecidos como O Livro dos Mortos.
Uma atenção toda especial era dada ao nome do homem, designado pela palavra ren e considerado como uma das partes mais importantes do ser humano. Para os antigos egípcios a eliminação do nome de um homem correspondia à sua própria destruição. O autor Wallis Budge explica o porquê dessa crença: um ser sem nome não poderia ser apresentado aos deuses e, como nenhuma coisa criada existe sem nome, o homem que não tinha nome estava em pior situação diante dos poderes divinos do que o mais frágil dos objetos inanimados.
O bom filho se obrigava a perpetuar o nome do pai e manter os túmulos dos mortos em bom estado de conservação, de modo que todos pudessem ler os nomes dos que neles se achavam enterrados, era um ato muito meritório. Por outro lado, se o falecido conhecesse os nomes de seres divinos, fossem eles amigos ou inimigos, e soubesse pronunciá-los, obtinha incontinenti poder sobre eles e era capaz de obrigá-los a fazer a sua vontade.
Durante a XI dinastia (c. 2040 a 1991 a.C.) começa a surgir nas tumbas um novo tipo de objeto: estatuetas funerárias, denominadas de shabtys pelos antigos egípcios. Eram pequenas figuras humanas, frequentemente nuas, envoltas em linho e colocadas em miniaturas de ataúdes, que vinham inscritas com preces pedindo oferendas de alimentos e que, provavelmente, destinavam-se, nos primeiros tempos, a servir como morada alternativa para o ka. O autor John Baines nos esclarece que essa função se modificou ao longo dos anos, sendo que a própria concepção desses objetos é obscura e não parece fazer parte de um corpo coerente de crenças, mas antes aparenta ser uma idéia isolada.
Um ritual egípcio que desempenhou importante papel em todos os tempos foi a purificação pela água. Em Helipólis, por exemplo, no templo de Ré, o faraó era lavado em cerimonial no lago sagrado, antes de adentrar no edifício. De forma análoga, antes que seu corpo morto pudesse penetrar no recinto sagrado de seu túmulo, era necessário que fosse purificado pela lavagem. Acreditava-se que através dessa purificação o rei morto seria regenerado, assim como se acreditava que o deus-Sol renascia a cada manhã lavando-se em um lago, antes de embarcar para sua jornada através do céu.
Outra das cerimônias que se realizavam por ocasião do funeral de um faraó, além da purificação, era a da abertura da boca. Os sacerdotes aspergiam água sobre uma estátua do morto, fumigavam-na com incenso, ofereciam-lhe sacrifícios, ornavam-na com as insígnias reais, tocavam-lhe a boca com vários instrumentos e esfregavam leite em sua boca. Em épocas posteriores ao Império Antigo (2575 a 2134 a.C), tais cerimônias passaram a ser executadas na própria múmia. Por meio desses rituais acreditava-se que a estátua ou a múmia pudessem ser dotados com as faculdades do ser humano e que a estátua pudesse transformar-se numa morada para o ka do defunto que ela representava.
Com o passar do tempo a ênfase nesta ou naquela crença funerária mudou, mas poucas desapareceram. Os túmulos passaram a conter objetos correspondentes a várias concepções diferentes e, diz John Baines, não se deve procurar nelas qualquer consistência global, exceto na medida em que se relacionam com a esperança na ressureição e na continuação da vida depois da morte.
Esta fabulosa coleção de textos funerários começou a aparecer nas tumbas egípcias por volta de 1.600 a.C. São uma espécie de guia para que o falecido pudesse alcançar uma vida feliz após a morte. Seu propósito era ser lido pelo morto durante sua jornada através dos Mundos Subterrâneos, pois o ajudaria a superar obstáculos e não se desviar de seu caminho.
Para isso, continha diversos ensinamentos codificados em senhas, fornecendo pistas e revelando atalhos que permitiriam ao morto responder às perguntas que lhe seriam feitas e atravessar todas as ameaças. Seu conteúdo garantia a ajuda e a proteção dos poderosos deuses egípcios, pois com ele o morto proclamava sua identidade com as divindades.
O papiro de Ani é um dos mais ricos e completos exemplos desta tipo de texto funerário egípcio que sobreviveu aos nossos dias. Atualmente ele se encontra em Londres, no Museu Britânico.
Perdido por milhares de anos e descoberto a cerca de um século atrás, trata-se da primeira descrição escrita de qualquer religião. Além disso, é considerado como sendo a verdadeira fonte dos Dez Mandamentos.
Este documentário acompanha o Livro Egípcios dos Mortos desde a sua criação há milênios na cidade de Tebas até a sua redescoberta – ou roubo, se preferirem – em 1887 d.D.
Estudiosos da Bíblia Hebraica afirmam que porções do Velho Testamento descendem diretamente deste texto egípcio, e existem arqueologistas que sugerem que Moisés deve ter conhecido e até mesmo carregado consigo uma cópia quando fugiu do Egito.
Li-SolSou-30
Fontes:
Publicado em 18/04/2012-Licença padrão do YouTube