quinta-feira, 28 de julho de 2011

OSÍRIS


OSÍRIS E ISÍS 






















Osíris é, indubitavelmente a mais célebre deidade do panteão egípcio e igualmente uma das mais complexas, pelo que não é, pois, de estranhar que os teólogos tenham procurado sintetizar os díspares aspectos desta personagem, através da criação de uma lenda. Para infortúnio de todos os amantes da mitologia egípcia a denominada “Lenda de Osíris” não é relatada integralmente por nenhum documento egípcio, fragmentando-se assim em trechos esparsos que relatam uma ou outra circunstância. 

Na realidade, a descrição completa das suas aventuras é nos oferecida por Plutarco, filósofo e escritor grego, através da sua obra “Ísis e Osíris”, na qual podemos verificar que a lenda se encontra dividida em três momentos fundamentais: o ímpio assassinato de Osíris; o nascimento e a infância de Hórus, seu filho; e o recontro entre este e Seth, aquele que lançara Osíris nos braços da morte.

Mas quem é afinal este deus, venerado por reis e plebeus, cujo coração encarnava a felicidade eterna, oferecida por seu pulsar a todos aqueles que o escutassem? Osíris despontou do seio da famigerada éneade de Heliópolis, denominação concedida à família divina criada por Átum-Rá, e na qual se reuniam nove poderosas deidades, cujas origens são narrados num mito arcaico da criação: Do caos inerte, que envolvia o universo, sob a forma do primitivo oceano Nun, emergiu uma colina de lodo, na qual poisou, latente no corpo de um escaravelho ou serpente, o deus- criador Átum, "Senhor Uno de nome misterioso", que através do seu sémen, gerou o primeiro casal divino, constituído por Shu, a atmosfera, e Tefnut, a humidade, os quais, por ser turno, procriaram Geb, a Terra, e Nut, o céu, cujos corpos achavam-se fundidos em eternas núpcias de luz. 

Devido à intervenção de Ra, a quem desagradava a visão de tal amor, Shu foi coagido a separar o céu e a terra. Porém, ao apartar tão sublimes amantes, o deus estava igualmente a sonhar uma imagem poética, incessantemente, representada pela arte egípcia, na qual, acima de Geb, surge um homem nu, alongado e enfeitado com plumas, erguendo nos braços Nut, de corpo semeado de estrelas. 

O nascimento de Osíris, fruto dos amores entre o céu e a terra é nos relatado por um mito que não carece de originalidade: Quando o deus- sol Ra abraçou a percepção de que no jardim da alma de Nut, desabrochava a rosa do desejo, cujo perfume incensava os seus encontros clandestinos com Geb, ele tomou a resolução de confiná-lo ao álgido Inferno de uma maldição: a deusa é proibida de dar à luz no período de tempo compreendido pelo calendário oficial.

Desesperada, Nut, que se encontrava grávida de quíntuplos, resolve então pedir ajuda a Thot, senhor do tempo, que segundo alguns referem, lhe dedica uma paixão secreta. Após haver meditado sobre todas as soluções plausíveis, Thot enlaça então a resolução de jogar aos dados com a Lua.

Abençoado pela Fortuna, o deus ganha a partida e obtém cinco dias suplementares no calendário. Nestes cinco dias, considerados como distintos do ano de doze meses, a maldição perdia o seu efeito, pelo que Osíris pôde enfim sublimar o mundo com seu nascimento, ocorrido no primeiro destes dias. Segundo a lenda, no instante em que Osíris floresceu para a vida, uma voz incendiou os céus com o fogo da seguinte anunciação:

“O Senhor de tudo veio ao mundo!”. 

Algumas fontes referem também que um certo Pamyles escutou uma voz provinda de um templo tebano, que, num grito tonitruante lhe anunciou que o magnânimo Osíris, rei dos céus e da terra, havia nascido. No segundo dos dias suplementares, Nut deu à luz Hórus, o Antigo; no terceiro, o deus Seth; no quarto, Ísis; e, por fim, no quinto, Néftis, desposada por Seth.
THOT 

É na qualidade de primogénito, que Osíris herda a soberania terrestre, pelo que, após unir-se a Ísis em esponsais divinos, ascendeu ao trono do Egipto, iluminando este país com o Sol de magnanimidade e indulgência que dourava a sua alma. Reinando como soberano da terra, Osíris arrebatou os egípcios às garras da selvajaria que os escravizara até então, concedeu-lhes leis e fê-los descobrir a arte de prestar culto aos deuses. Por seu turno, Ísis, a quem a corrente prática de canibalismo horrorizava, ofereceu aos Homens o trigo e a cevada, que Osíris os ensinou a cultivar, levando-os a abdicar dos seus costumes antropófagos, em prole de uma dieta de cereais. 

Para além disso, Osíris é conhecido por haver sido o primeiro a colher frutos das árvores, a assentar a vinha em estacas e a pisar as uvas, visando a confecção de vinho. Na ânsia de enriquecer o tesouro da humanidade com a jóia rara do conhecimento, Osíris delegou a Ísis todas as responsabilidades subjacentes ao governo do Egipto e percorreu o mundo, saciando a sua sede com o cálice da civilização e a sua fome com o desvendar dos segredos da agricultura. O seu reinado foi assim uma sonata de harmonia perfeita, tocada no piano de luz da felicidade suprema. 

Todavia, em breve um artífice das trevas consagrado mestre da sua eterna confraria de sombras e medos, iria esculpir o mais nefasto silêncio, pois apesar dos poderes inerentes à sua divindade, Osíris viria a aproximar-se da humanidade, ao partilhar com ela a vereda da morte. Seu irmão Seth, esposo de Néftis, cuja alma era escrava da inveja, cobiça e ódio, ofereceu um fausto banquete, no qual exibiu uma extraordinária urna, prometendo oferecê-la, a quem nela coubesse.

Quando Osíris aceitou o desafio, Seth selou a urna e arremessou-a ao Nilo. Ao aperceber-se de que, após uma apaixonada busca, Ísis a havia encontrado, Seth tornou a apoderar-se dela, retalhando o corpo do irmão, para lançá-lo, novamente, ao rio. Desesperada, Ísis tomou então a resolução de recuperar os catorze fragmentos do cadáver de Osíris, percorrendo, para tal efeito, todo o país. Após conquistado o sucesso, Anúbis, deus do embalsamamento, possuidor de uma cabeça de chacal, e que muitos proclamam como filho de Osíris e de Néftis, reuniu os catorze fragmentos do cadáver do poderoso deus, enrolando-os em ligaduras, com o fito de criar a primeira múmia. 

Ísis tomou então a forma de um falcão fêmea, de cujas asas o seu esposo recebeu, uma vez mais, a vida que havia perdido, podendo então gerar o deus- falcão, Hórus, herdeiro do trono que o seu tio Seth havia usurpado. Ultimado este acto, Osíris necessitou de regressar ao submundo, tornando-se no "Senhor da Eternidade", soberano dos mortos, que preside aos julgamentos do além. É representado na arte egípcia como um homem de rosto esverdeado, qual lodo que concebe a vida do Egipto, ostentando as insígnias do poder: coroa, ceptro em gancho e chicote. Contudo, o seu corpo assemelha-se rígido, dado surgir como uma múmia enfaixada. 

Este mito reflecte flagrantemente uma paixão, representando Osíris como um ser que, na terra, foi vítima de uma traição que o teria confinado à extinção eterna, caso um amor isento de limites não se houvesse oposto a tão lúgubre fortuna, reinventando em seu corpo a arte perdida da vida, através de uma esplendorosa ressurreição. Compreende-se assim que todos procurem a benção deste deus, uma vez que somente ele coroa o firmamento da vida com o arco-íris da eternidade. 

Assim, não constitui qualquer surpresa verificar que no Antigo Império, o faraó defunto, na ânsia de com o deus se identificar, recebia o epíteto de Osíris, enquanto que o regente abraçava a denominação de Hórus. Todavia, vicissitudes político- sociais ocorridas no final do mesmo, permitiram que a benção de Osíris deixasse de ser prerrogativa exclusiva dos soberanos, estendendo-se assim a todos funcionários. No entanto, nem sempre Osíris usufruiu desta fama, sendo pois fruto de uma prolixa evolução.


OFERENDASNa realidade, Osíris foi venerado desde uma época muito antiga, principiando por encarnar um deus da fertilidade, relacionado com o milho, com o ciclo do seu enterramento como semente, o seu tempo de repouso debaixo da terra, a sua germinação e, finalmente, o seu retorno à vida. 

Era sua, portanto, a incumbência de propiciar aos egípcios uma boa colheita, sendo também responsável pela inundação do Nilo. À medida que a sua importância aumentava, Osíris assimilou características de outros deuses, os quais substituiu gradualmente. 

Em Mênfis, por exemplo, adoptou as características funerárias de Sokaris e, em Abidos, usurpou a identidade e o culto de Khentiamentiu, deus dos mortos e soberano das necrópoles. Posteriormente, integrou a cosmogonia de Heliópolis, transformando-se no legítimo herdeiro de Geb e Nut. Como símbolo da ressurreição, Osíris supervisionava as entradas no seu mundo, surgindo como um Sol, durante o poente. 

O culto de Osíris e Isís proliferou-se, com surpreendente popularidade, na bacia mediterrânea, durante a Época Baixa (664-332 a.C./ XXVI- XXX Dinastias), influenciando, segundo muitos historiadores também o cristianismo, com os seus ensinamentos sobre morte e ressurreição. Osíris, Ísis e Hórus formaram a Tríade (família constituída por três divindades) de Abidos, cidade onde se centralizou o seu culto, celebrado num dos maiores santuários egípcios, em cujo interior jazia a cabeça do deus da morte. 

Era de facto naquela que viria a tornar-se na capital da oitava província do Alto Egipto, que decorria o festival anual de Osíris, ao longo do qual a barca do deus era levada em procissão e a vitória de Osíris sobre os seus inimigos celebrada.

Todavia, também outras cidades foram iluminadas pela benção de Osíris, ao receberem partes do corpo retalhado do deus, salientando-se Busíris (“Domínio de Osíris” ou “Lugar de Osíris”, no Delta Central, como uma das mais famosas, dada a sua relação com a espinha dorsal de Osíris. Por seu turno, Per- Medjed, capital da 19ª capital do Alto Egípcio, estava ligada ao mito de Osíris, através do seu falo, que, segundo a tradição, jamais foi descoberto por Ísis. 


Detalhes e Vocabulário Egípcio:
Eneada de Heliópolis: família divina constituída por Átum, deus criador, Tefnu, humidade, Shu, atmosfera, Geb, terra, Nut, céu, Osíris, Ísis, Néftis e Seth.
Ousir- Osíris
Neb djed- O Senhor da Eternidade.
Douat- submundo
Sah- múmia 


Verónica Freitas

Fonte:
Maçonaria.net
http://www.maconaria.net/portal/index.php?view=article&catid=2%3Amitologia-egipcia&id=151%3Aosiris&option=com_content&Itemid=3
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

ISÍS


 

















Nenhuma personalidade do panteão egípcio pode rivalizar com a deusa Ísis, sublime essência da alma de uma das mais excelsas e proeminentes civilizações da antiguidade e maga detentora do esplendor ofuscante que a conduziu até ao auge da popularidade. Surgindo na teologia heliopolitana como fruto dos amores entre o céu (Nut) e a terra (Geb), Ísis reinara com uma sabedoria incontestável nas Duas Terras, o Alto e o baixo Egipto, muito antes do nascimento das dinastias.


O amor que unia Ísis a Osíris 
em ternos esponsais vestia a sua alma 
com uma felicidade que abraçava o Infinito. 

Todavia, em breve a doce melodia que tão mítica perfeição dedilhava na harpa da sua vida seria, pelas trevas, resumida a um rol de acordes dissonantes, orquestrados numa sinfonia de silêncio e dor.

Tão vil prelúdio de uma noite sem fim surgiu sob a forma de um convite de Seth, que solicitava afavelmente a presença de seu irmão Osíris num banquete. Sem jamais cogitar que se tratava de uma ímpia conjuração, Osíris não declinou a oferta, colocando-se então à mercê de um execrável assassino. Algures no decorrer do banquete, Seth apresentou um caixão de proporções verdadeiramente excepcionais, assegurando que recompensaria generosamente aquele que nele coubesse.

Imprudente, Osíris aceitou prontamente o desafio, permitindo que Seth e os seus acólitos pregassem a tampa e consequentemente o tornassem escravo da morte. Cometido o hediondo crime, o assassino Seth, que cobiçava ocupar o trono de seu irmão, lança a urna ao Nilo, para que o rio a conduzisse até ao mar, onde veio a perder-se. Este trágico incidente deu-se no décimo sétimo dia do mês Athyr, quando o Sol se encontra sob o signo de Escorpião.

Quando Ísis tomou conhecimento do ocorrido, baniu de sua alma todo o desespero que a assombrava e abraçou a resolução de procurar o seu marido, a fim de lhe restituir o sopro da vida. Assim, cortou uma madeixa do seu cabelo, estigma da sua desolação, colocou o seu vestuário matutino e errou por todo o Egipto, na ânsia de ver a sua diligência coroada de êxito.

Por seu turno, e após haver dançado nas ondas do mar, a urna atingiu finalmente uma praia, perto da Babilónia, na costa do Líbano, enlaçando-se nas raízes de um jovem tamarindo, cujo prolixo crescimento a prendeu no interior do seu tronco. 

Ao alcançar o clímax da sua beleza, a imponente árvore atraiu a atenção do rei desse país, persuadindo-o a ordenar ao seu séquito que o tamarindo fosse derrubado, com o fito de ser utilizado como pilar na sua casa. Em simultâneo com o crescimento da referida árvore, Ísis prosseguia tão exaustivas busca pelo cadáver de seu marido, pelo que, ao escutar as histórias tecidas em torno da surpreendente árvore, tomou de imediato a resolução de ir à Babilónia, na esperança de ultimar enfim e com sucesso a sua odisseia.

Ao chegar ao seu destino, Ísis sentou-se perto de um poço, ostentando um disfarce humilde e brindou os transeuntes que por ela passavam com um rosto lavado em lágrimas. Os relatos da sua inusitada condição rapidamente chegaram aos reis da Babilónia, que, intrigados, propuseram-se a conhecer o motivo de tanto desespero. Quando Ísis os viu estancar defronte de si, presenteou-os com saudações cordiais, reverentes e, solicitou-lhes que permitissem que os seus cabelos ela entrançasse.

Uma vez que os regentes, embora servos da perplexidade, não impuseram qualquer veto ao seu convite, Ísis uniu o gesto à palavra, incensado as tranças que talhava pouco a pouco com o divino perfume exalado por seu ástreo corpo. Ultimado tão peculiar ritual, a rainha da Babilónia apressou-se a contemplar o resultado final, sendo enfeitiçada pelo irresistível aroma que seus cabelos emanavam. Literalmente inebriada por tão doce perfume dos céus, a rainha ordenou então a Ísis que a acompanhasse até ao palácio.

Assim, a deusa franqueou a entrada do palácio do rei da Babilónia, junto do qual conquistou o privilégio de tornar-se na ama do filho recém-nascido do casal régio, a quem amamentava com o seu dedo. Devido aos laços que a vinculavam à criança, Ísis desejou conceder-lhe a imortalidade, pelo que, todas as noites, a queimou, num fogo divino e, como tal, indolor, para que as suas partes mortais ardessem no esquecimento.

 Certa noite, durante este processo, ela tomou a forma de uma andorinha, a fim de cantar as suas lamentações. Maravilhada, a rainha seguiu a melopeia que escutava, entrando no quarto do filho, onde se deparou com um ritual aparentemente hediondo.

De forma a tranquilizá-la, Ísis revelou-lhe a sua verdadeira identidade, e ultimou precocemente o ritual, mesmo sabendo que dessa forma estaria a privar o pequeno príncipe da imortalidade que tanto desejava oferecer-lhe. Observando que a rainha a contemplava, siderada, Ísis aventurou-se a confidenciar-lhe o lancinante incidente que a coagira a visitar a Babilónia, conquistando assim a confiança e benevolência da rainha, que prontamente aquiesceu em ceder-lhe a urna que continha os restos mortais de seu marido.

Dominada por uma intensa felicidade, Ísis apressou-se a retirá-la do interior do pilar. Porém, fê-lo com tão negligente brusquidão, que os seus escombros de pedra espalharam-se por toda a divisão, atingindo, mortalmente, o pequeno príncipe. Na realidade, existem inúmeras versões deste fragmento da lenda, uma das quais afirma que a rainha expulsou Ísis, ao vislumbrar o aterrador ritual, pelo que esta retirou a urna, sem o consentimento dos seus donos. Porém, a veracidade desta versão semelha-se deveras suspicaz...

Com a urna em seu poder, Ísis regressou ao Egipto, onde a abriu, ocultando-a, seguidamente, nas margens do Delta. Numa noite, quando Ísis a deixou sem vigilância, Seth descobriu-a e apoderou-se, uma vez mais dela, com o intento de retirar do seu interior o corpo do irmão e cortá-lo em 14 pedaços, que foram, em seguida, arremessados ao Nilo. Ao tomar conhecimento do ocorrido, Ísis reuniu-se com a sua irmã Néftis, que não também tolerava a conduta de Seth, embora este fosse seu marido, e, juntas, recuperaram todos os fragmentos do cadáver de Osíris, à excepção, segundo refere Plutarco, escritor grego, do seu sexo, que fora comido por um peixe.

Novamente deparamo-nos com alguma controvérsia, uma vez que outras fontes egípcias afirmam que todo o corpo foi recuperado. Acto contínuo, Ísis organizou uma vigília fúnebre, na qual suspirou ao cadáver reconstituído do marido:

“Eu sou a tua irmã bem amada.
Não te afastes de mim, clamo por ti!
Não ouves a minha voz? Venho ao teu encontro e,
de ti, nada me separará!”

Durante horas, Ísis e Néftis, de corpo purificado, inteiramente depiladas, com perucas perfumadas e boca purificada por natrão (carbonato de soda), pronunciaram encantamentos numa câmara funerária ignota, que o incenso queimado impregnava de espiritualidade. A deusa invocou então todos os templos e todas as cidades do país, para que estes se juntassem à sua dor e fizessem a alma de Osíris retornar do Além.

Uma vez que todos os seus esforços revelavam-se vãos, Ísis assumiu então a forma de um falcão, cujo esvoaçar restituiu o sopro de vida ao defunto, oferecendo-lhe o apanágio da ressurreição. Seguidamente, Ísis poisou no sítio do desaparecido sexo de Osíris, fazendo-o reaparecer por magia, e manteve-o vivo o tempo suficiente para que este a engravidasse. Em contraste, outras fontes garantem que Osíris e a sua esposa conceberam o seu filho, antes do deus ser assassinado pelo seu irmão, embora a versão mais comum seja a relatada, primeiramente. Assim, ao retornar à terra, Ísis encontrava-se agora grávida do filho, a quem protegeria até que este achasse-se capaz de enfrentar o seu tio, apoderando-se (como legítimo herdeiro) do trono que Seth havia usurpado.


Alguns declaram que Ísis,
algum tempo antes do parto, fora aprisionada por Seth,
mas que Toth, vízir de Osíris,
a auxiliara a libertar-se.

Porém, muitos concordam que ela ocultou-se, secretamente, entre os papiros do Delta, onde se preparou para o nascimento do filho, o deus- falcão Hórus. Quando este nasceu, Ísis tomou a decisão de dedicar-se inteiramente à árdua incumbência de velar por ele. Todavia, a necessidade de ir procurar alimentos, coagiam-na pontualmente a ausentar-se, deixando assim o pequeno deus sem qualquer protecção. Numa dessas ocasiões, Seth transformou-se numa serpente, visando espalhar o seu veneno pelo corpo de Hórus, pelo que quando Ísis regressou da sua diligência, encontrou o seu filho já próximo das morte.

Todavia, a sua vida não foi ceifada,
devido a um poderoso feitiço
executado pelo deus- sol, Ra.

Dada a sua devotada protecção, Ísis era constantemente representada na arte egípcia a amamentar tanto o seu filho, como os faraós. Sendo um dos mais populares vultos da mitologia egípcia, cujo nome é representado por um trono (e crê-se que terá mesmo esse significado), Ísis assume o lugar de deusa da família e do casamento, a quem foram concedidos extraordinários poderes curativos, empregues, essencialmente, para salvar crianças de mordeduras de cobras.

Devido às suas qualidades maternais, surge, por vezes, com a forma de uma porca ou de uma vaca, o que leva a que seja confundida com Háthor (deusa do amor), com quem, na realidade, se fundiu, na Época Baixa (664-332 a.C./ XXVI- XXX Dinastias), período de tempo em que o seu culto atingiu o auge. Deste modo, o seu culto proliferou-se por toda a bacia mediterrânea, na qualidade de Ísis- Afrodite, o que demonstra bem a forma como os romanos lhe prestavam culto, esculpindo imagens em sua homenagem, nas quais ela surgia, muitas vezes, com uma túnica que flutua ao vento e com um toucado composto por espigas, chifres de vaca, um disco solar e penas de avestruz.

Em torno do seu temperamento bravio (tão díspar da sua maternidade e benevolência!), teceu-se igualmente outra lenta, que narra a forma como Ísis, intrigada com o segredo que sustinha os poderes de Ra, conjura para obter o nome secreto do Senhor Universal, matriz das suas forças e esplendor. Assim, recolhe um pouco da sua saliva, amassa-a com terra e, com essa argila, molda uma serpente em forma de flecha, que coloca na encruzilhada dos caminhos desbravados pelo cortejo solar. Escrava da magia de Ísis, a serpente não hesita em morder Ra à sua passagem, que, com um silvo de dor, desfalece.

Quando recupera a consciência, o deus- sol evoca, desesperado, todos os deuses, relatando-lhes o seu infortúnio: “ O meu pai e a minha mãe ensinaram-me o meu nome e eu dissimulei-o no meu corpo, para que mago algum o possa pronunciar como malefício para mim. Tinha eu saído para contemplar a minha criação, quando algo que desconheço me mordeu. 

Não foi nem fogo, nem água; mas o meu coração está em chamas, o meu corpo treme e os meus membros estão frios. Tragam-me os meus filhos, os que conhecem as fórmulas mágicas e cuja ciência chega aos céus!”. Ísis debruça-se sobre Rá e, simulando uma estupefacção imensurável, questiona: “ Que se passa? Ter-se-ia um dos teus filhos erguido contra ti? Então, destruí-lo-ei graças ao meu poder mágico e farei com que seja expulso da tua vista!” Quando o deus- sol lhe confidenciou a matriz do seu padecimento, Ísis assegurou-lhe que somente lhe entregaria o vital antídoto, caso este lhe revelasse a origem das suas imensuráveis forças.

Exasperada por Rá se negar a atender á sua reivindicação, Ísis solicitou, novamente:


“Diz-me o teu nome,
meu divino Pai! Porque o homem só revive
quando é chamado pelo seu nome!”

Escravizado pelo desespero, a personificação da luz oferece a Ísis um rol interminável de nomes falsos, na ânsia de que a deusa não alcançasse a percepção de que ele procurava ludibriá-la. Todavia, Ísis replicou:

“ O teu nome não está entre aqueles que citaste!
Diz-mo e o veneno abandonará o teu corpo,
porque o homem revive quando
o seu nome é pronunciado.”

Subjugado pela dor, Rá aceita o ultimato, mesmo sabendo que tal concederia a Ísis autoridade sobre a sua pessoa. Num suspiro, declara então:

“Olha, minha filha Ísis,
de modo que o meu nome passe
do meu corpo para o teu... Mal ele saia do meu coração,
repete-o ao teu filho Hórus,
submetendo-o a um juramento divino!”

Na realidade, todas as deusas egípcias possuíam esta dualidade, que as colocava entre a crueldade extrema e a indulgência infinita, num jogo de luzes e sombras que não as impediram de ser adoradas através dos tempos. A sua imagem é omnipresente e tanto cobre os sumptuosos santuários do Vale do Nilo, como os mais íntimos testemunhos de devoção pessoal. Porém, ao percorrermos o Egipto, deparamo-nos com três locais particularmente abençoados com a magia de Ísis:

Behbeit el- Hagar, no Delta, onde um sumptuoso templo foi erigido em honra de Ísis. Malogradamente, o halo de magia e espiritualidade que nimba esta excelsa deidade revelou-se impotente para deter aqueles que, não votando qualquer respeito pela sua índole sagrada, cometeram a ignomínia de destruir tão colossal santuário, onde os céus se reflectiam e renovavam num jogo divino, a fim de o transformar numa pedreira. Consequentemente, Behbeit el- Hagar é na actualidade um local quase literalmente desconhecido dos turistas e que semeia uma franca desilusão nos corações dos intrépidos que ainda o ousam visitar, pois a grandeza daquele que fora outrora um templo dedicado a uma divindade verdadeiramente excepcional resume-se agora a um monte de escombros e blocos de calcário ornados de cenas rituais.

Dendera, no alto Egipto, eterno berço de feitiços onde Ísis desabrochou para a vida, onde nos deparamos com um santuário de Háthor parcialmente conservado, com um templo coberto e com o mammisi, ou seja, “templo do nascimento de Hórus), assim como com um exíguo santuário, onde a etérea Ísis nasceu, deslumbrando o mundo com sua pele rosada e revolta cabeleira negra.

Filae, ilha- templo de Ísis, que serviu de refúgio à derradeira comunidade iniciática egípcia, mais tarde (séc. VI d. C., mais precisamente) exterminada por cristãos escravos do fanatismo.

Verónica Freitas
Actualizado em ( Terça, 24 Junho 2008 15:14 )

Fonte:
Maçonaria.net
http://www.maconaria.net/portal/index.php?view=article&catid=2%3Amitologia-egipcia&id=150%3Aisis&option=com_conte
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

PITÁGORAS E A SUA FILOSOFIA


ANTÓNIO ROCHA FADISTA
O filósofo grego Pitágoras, que deu seu nome a uma ordem de pensadores, religiosos e cientistas, nasceu na ilha de Samos no ano de 582 a.C. A lenda nos informa que ele viajou bastante e que, com certeza, teve contato com as idéias nativas do Egito, da Ásia Menor, da Índia e da China. A parte mais importante de sua vida começou com a sua chegada a Crotona, uma colônia Dórica do sul da Itália, então chamada Magna Grécia, por volta de 529 a.C.

De acordo com a tradição, Pitágoras foi expulso da ilha de Samos, no mar Egeu, pela tirania de Polycrates. Em Crotona ele se tornou o centro de uma organização, largamente difundida, que era, em sua origem, uma irmandade ou uma associação voltada muito mais para a reforma moral da sociedade do que uma escola de filosofia.

A irmandade Pitagórica tinha muito em comum com as comunidades Órficas que buscavam, através de práticas rituais e de abstinências, purificar o espírito dos crentes e permitir que eles se libertassem da “roda dos nascimentos”. Embora o seu objetivo inicial tenha sido muito mais fundar uma ordem religiosa do que um partido político, a Escola de Pitágoras apoiou ativamente os governos aristocratas.

A verdade é que esta Escola chegou a exercer o controle político de várias colônias da Grécia Ocidental, principalmente as existentes no sul da Itália. Foi também a sua influência política que levou ao desmembramento e à dissolução da Escola de Pitágoras. A primeira reação contra os Pitagóricos foi liderada por Cylon e provocou a transferência de Pitágoras de Crotona para a cidade de Metaponto, onde residiu até à sua morte, no final do séc. VI ou no início do séc. V a.C.

Na Magna Grécia, isto é, nas colônias fundadas pelos gregos na Itália, a Ordem Pitagórica se manteve poderosa até à metade do séc. V a.C. A partir daí foi violentamente perseguida, e todos os seus templos foram saqueados e incendiados. Os Pitagóricos remanescentes se refugiaram no exterior: Lysis, por exemplo, foi para Tebas, na Beócia, onde se tornou instrutor de Epaminondas; Filolaus, que segundo a tradição, foi o primeiro a escrever sobre o sistema Pitagórico, também se refugiou em Tebas.

O próprio Filolaus, junto com mais alguns adeptos de Pitágoras, retornou mais tarde à Itália, para a cidade de Tarento, que se tornou a sede da Escola Pitagórica. Entre eles estava Archytas, amigo de Platão, figura proeminente da Escola, não só como filósofo como também como homem de estado, na primeira metade do séc. IV a.C. No entanto, já no final deste século, os Pitagóricos tinham desaparecido, como Escola Filosófica.

A ESCOLA PITAGÓRICA
Parece que, por volta da metade do séc. V a.C., houve uma divisão dentro da Escola, De um lado, estavam os “matemáticos”, representados por nomes do peso de Archytas e Aristoxenus, que estavam interessados nos estudos científicos, especialmente em matemática e na teoria musical; de outro lado estavam os membros mais conservadores da Escola, que se concentravam nos conceitos morais e religiosos, e que eram chamados de akousmatikoi (plural de akousmata, os adeptos das tradições orais). Estes elementos – religiosos e científicos – estavam já presentes nos ensinamentos de Pitágoras.

As doutrinas ensinadas por Pitágoras são as seguintes:
1. - Em primeiro lugar, e acima de tudo, estava a crença de Pitágoras na existência da alma. Ele também acreditava na transmigração das almas dos indivíduos, mesmo entre diferentes espécies. Esta transmigração poderia ocorrer em seres mais ou menos evoluídos. Se um indivíduo tivesse uma vida virtuosa, o seu espírito poderia inclusive se libertar da carne, isto é, deixaria de reencarnar. Este conceito filosófico foi atribuído a Pitágoras por Platão, em sua obra Fédon (que relata os momentos que antecederam a morte de Sócrates pela ingestão de cicuta). Não se pode deixar de ressaltar a importância deste conceito na história das religiões.

2. - Levar uma vida virtuosa consistia em obedecer a certos preceitos, muitos deles vistos hoje como tabus primitivos, como, por exemplo, não comer feijão ou não remexer no fogo com um pedaço de ferro. Estritamente morais eram as três perguntas que cada um devia se fazer ao final do dia, e que eram: Em que é que eu falhei hoje? O que de bom eu deveria ter feito hoje? O que é que eu não fiz hoje e deveria ter feito? Um dos principais meios externos que ajudavam a purificar o espírito era a música.

3. - A fascinação da Escola pelos números deve-se ao seu fundador. A maior descoberta de Pitágoras foi a dependência dos intervalos musicais de certas razões aritméticas existentes entre cordas de comprimentos diferentes, igualmente esticadas. Por exemplo, uma corda com o dobro do comprimento de outra emite a mesma nota musical, mas uma oitava acima, isto é, mais aguda.
Tal fato contribuiu decisivamente para cristalizar a idéia de que “todas as coisas são números, ou podem ser representadas por números”. Este princípio foi a pedra de toque da filosofia de Pitágoras. Em sua obra Metafísica, Aristóteles afirma que os números representavam na filosofia de Pitágoras o que os quatro elementos – Terra/Ar/Fogo/Água representaram no simbolismo de outros sistemas religiosos. De acordo com este princípio, todo o universo poderia ser reduzido a uma ”escala musical e a um número”. Assim, coisas como a razão, a justiça e o casamento, poderiam ser identificadas com diferentes números. Os próprios números, sendo ímpares e pares, ou limitados e ilimitados, de acordo com Aristóteles, se constituíam na primeira definição das noções de forma e de matéria.

Os números um e dois encabeçavam a lista dos dez primeiros pares de opostos fundamentais, dos quais os oito pares seguintes eram “um” e “muitos”, “direita e esquerda”, “masculino e feminino”, “repouso e movimento”, “reto e curvo”, “luz e escuridão”, “bom e mau” e “quadrado e oblongo”. Esta era a filosofia do dualismo metafísico e moral, através da qual se chegou ao princípio que via o universo como a harmonia dos opostos, no qual “o um” gerou toda a serie de números existentes.

Assim, a música e a crença no paraíso estelar, (originalmente associados à Astrologia da Babilônia) são os pontos de união entre o conteúdo religioso da filosofia de Pitágoras com os estudos matemáticos e científicos realizados mais tarde pela ala científica de sua Escola. O primeiro a apresentar um sistema compreensivo foi Filolaus, um de seus discípulos.

A ARITMÉTICA PITAGÓRICA
Para Pitágoras a Divindade, ou Logos, era o Centro da Unidade e da Harmonia. Ele ensinava que a Unidade, sendo indivisível, não é um número. Esta é a razão porque se exigia do candidato à admissão na Escola Pitagórica a condição de já haver estudado Aritmética, Astronomia, Geometria e Música, consideradas as quatro divisões da Matemática. Explica-se também assim porque os Pitagóricos afirmavam que a doutrina dos números, a mais importante do Esoterismo, fora revelada ao Homem pela Divindade, e que o Mundo passara do Caos à Ordem pela ação do Som e da Harmonia. A unidade ou 1 (que significava mais do que um número) era identificada por um ponto, o 2 por uma linha, o três por uma superfície e o quatro por um sólido. A Tetraktys, pela qual os Pitagóricos passaram a jurar, era uma figura do tipo abaixo:
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representando o número triangular 10 e mostrando sua composição como sendo 1 + 2 + 3 + 4 = 10. Adicionando-se uma fileira de cinco pontos teremos o próximo número triangular de lado cinco, e assim por diante. Mostrando que a soma de qualquer série de números naturais que comece pelo número 1 é um número triangular. A soma dos números de qualquer série numérica composta por números ímpares e que comece por 2 é um número quadrado. E a soma dos números de qualquer série numérica de números pares que comece pelo número 2 é um número oblongo, ou retangular.

Este é o princípio matemático que levou à 47ª Proposição de Euclides, o matemático grego que divulgou o Teorema de Pitágoras, pelo qual o quadrado da hipotenusa de um triângulo retângulo é igual à soma dos quadrados dos dois outros lados, ou catetos. A demonstração deste teorema é a Jóia do Ex-Venerável mais recente de uma Loja Maçônica, em homenagem a Pitágoras, e que simboliza a doutrina científica e esotérica de sua Escola de Filosofia. O mesmo raciocínio usado na formulação do teorema acima, quando o triângulo retângulo é isósceles, (com catetos ou lados iguais) levou os Pitagóricos a descobrir os números irracionais, como, por exemplo, a raiz do número 2, que é igual a 1,4142,,,, (dízima periódica).

A GEOMETRIA PITAGÓRICA
Em Geometria não se pode obter uma figura totalmente perfeita, nem com uma, nem com duas linhas retas. Mas três linhas retas em conjunção produzem um triângulo, a figura absolutamente perfeita. Por isso é que o triângulo sempre simbolizou o Eterno – a primeira perfeição, o Grande Arquiteto do Universo. A palavra que designa a Divindade principia, em todas as línguas latinas, por um D, e em grego por um “delta”, ou triângulo, cujos lados representam a natureza divina. No centro do triângulo está a letra Yod , inicial de Jehovah – o Criador, expresso nos idiomas teuto-saxônicos pela letra G, inicial de God, Got ou Gottam, cujo significado filosófico é geração.

Numerosas – e valiosas – foram as contribuições da Escola de Pitágoras no campo da Geometria. Assim, por exemplo, a demonstração de que a soma dos ângulos internos de um triângulo é igual a dois ângulos retos, ou 180 graus. Também formularam a teoria das proporções e descobriram as médias aritmética, geométrica e harmônica. Foi ainda Pitágoras quem descobriu a construção geométrica dos cinco sólidos regulares, isto é, o tetraedro ou pirâmide de quatro lados, o octaedro, o dodecaedro e o icosaedro. A construção do dodecaedro requer a construção de um pentágono regular, também conhecida dos Pitagóricos, que usavam o Pentagrama ou Estrela Pentagonal ou Flamígera, como símbolo de reconhecimento entre os seus membros.

Em resumo, a Geometria Pitagórica cobriu todos os assuntos da obra de Euclides, que compilou e registrou todo o conhecimento existente nesta área, na antiga Grécia.

A ASTRONOMIA PITAGÓRICA
Pitágoras foi o primeiro a afirmar que a Terra e o Universo tinham forma esférica. Ele também anteviu que o Sol, a Lua e os Planetas então conhecidos possuíam um movimento de translação, independente do movimento de rotação diário. A Escola de Pitágoras desenvolveu também um sistema astronômico, conhecido como sistema Pitagórico. A última versão deste sistema, atribuída aos discípulos Filolau e Hicetas de Syracusa, deslocava a Terra do centro do Universo, e fez dela um planeta do mesmo modo que os planetas então conhecidos, que giravam em torno do fogo central – o Sol. Este sistema, elaborado cerca de 400 a.C., antecipou em cerca de 2.000 anos os mesmos princípios defendidos por Galileu Galilei, pelos quais foi condenado pela Santa Inquisição. Galileu demonstrou a base científica do sistema, a partir da qual Copérnico e Kepler iriam comprovar que era o Sol e não a Terra o centro da Via Láctea – a nossa Galáxia.

A MÚSICA PITAGÓRICA
Pitágoras não só utilizava a música para criar uma inefável aura de mistério sobre si mesmo, como também para desenvolver a união na sua Escola. A música instruía os discípulos e purificava suas faculdades psíquicas. Na educação, a música era vista como disciplina moral porque atuava como freio à agressividade do ser humano. Pitágoras considerava a música o elo de ligação entre o homem e o cosmos. O Cosmos era para ele uma vasta razão harmônica que, por sua vez, se constituía de razões menores, cujo conjunto formava a harmonia cósmica, ou harmonia das esferas, que só ele conseguia ouvir.
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Pitágoras, avatar do deus Apolo, compunha e tocava para seus discípulos a sua lira de sete cordas. Deste modo ele refreava paixões como a angústia, a raiva, o ciúme, anseios, a preguiça e a impetuosidade. A música era uma terapia que ele aplicava não só para tranqüilizar as mentes inquietas, mas também para curar os doentes de seus males físicos.

Pitágoras foi o descobridor dos fundamentos matemáticos das consonâncias musicais. A partir daí, ele visualizou uma relação mística entre a aritmética, a geometria, a música e a astronomia, ou seja, havia uma relação que ligava os números às formas, aos sons e aos corpos celestes. A Tetraktys era o símbolo da música cósmica, e Pitágoras, como o deus da Tetraktys, era a única pessoa que podia ouvi-la. A teoria da música cósmica, ou harmonia das esferas foi descrita por Platão, no Timeu. Filolau, outro notável discípulo de Pitágoras também faz descrição minuciosa da teoria que resulta na música cósmica e na harmonia das esferas (ou planetas).

A HERANÇA DE PITÁGORAS
A história posterior da filosofia de Pitágoras se confunde com a da Escola de Platão, discípulo de Sócrates e mestre de Aristóteles, e que foi também ardente admirador e discípulo de Pitágoras. Platão herdou, de um lado, as doutrinas de seu mestre e, de outro, bebeu a sua sabedoria nas mesmas fontes do filósofo de Samos. Segundo Amônio Sacas, toda a Religião-Sabedoria estava contida nos Livros de Thot (Hermes), onde Pitágoras e Platão beberam os seus conhecimentos e grande parte de sua filosofia.

Desde os primeiros séculos da era cristã que é comprovada a existência, em Roma, das práticas e doutrinas religiosas de Pitágoras, principalmente as relacionadas com a imortalidade da alma. Pitágoras disputava então, com outras religiões, um lugar predominante no panteão da Roma Imperial. A comprová-lo as capelas pitagóricas descobertas pela arqueologia, nas quais os iniciados aprendiam os mistérios de Pitágoras, e onde eram introduzidos no culto de Apolo.
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Os afrescos encontrados no sub-solo da Porta Maggiore, em Roma, mostram temas Pitagóricos. O nacionalismo romano também está ligado a Pitágoras através da obra Metamorfoses, de Ovídio, que nela relatou a teoria da reencarnação, defendida pelo filósofo de Samos. Os discípulos diretos de Platão também retornaram aos princípios Pitagóricos; e os neo-Platônicos, com Jâmblico, no séc. IV d.C. também os adotaram, juntamente com os mais recentes escritos Pitagóricos, isto é, os Hinos Órficos. Do séc. I d.C. ao séc. VI d.C. a doutrina de Pitágoras influenciou grandes filósofos que escreveram e divulgaram a sua filosofia. Alguns deles foram Apolônio de Tiana, Plotino, Amélio e Porfírio.

Depois que os cristãos conquistaram, no séc. IV d.C. o controle do Estado, os Pitagóricos tornaram-se, gradualmente, uma minoria perseguida. No entanto, as idéias de Pitágoras continuaram a ser pregadas na antiga escola de Platão, a Academia de Atenas, e em Alexandria, até que no séc. VI d.C. Justiniano, imperador do Oriente, fechou a Academia e proibiu a pregação da filosofia e das doutrinas consideradas pagãs pelo catolicismo. A partir desta época prevaleceu a era do obscurantismo da Idade Média. Mas as doutrinas de Pitágoras foram abertamente pregadas por um período de 1.200 anos, que se estende do séc. VI a.C. ao sec. VI d.C.

Apesar de perseguido pela religião oficial Pitágoras foi, para grandes figuras do Catolicismo, como Santo Ambrósio, uma figura de referência por ter sido visto como intermediário entre Moisés e Platão, No séc. XVI, de acordo como o interesse do autor, Pitágoras era apresentado como poeta, como mágico, como autor da Cabala, como matemático, ou como defensor da vida contemplativa. Rafael, famoso pintor italiano, retratou Pitágoras como um homem idoso, de longas barbas, entre filósofos, no quadro “Escola de Atenas”.

Embora remotamente, não podemos deixar de registrar a existência de pontos comuns entre a filosofia de Pitágoras e o sistema Positivista de August Comte. Pitágoras, racionalista, procurou explicar a cosmogonia universal através da ciência. Comte trilhou caminho semelhante. Antes de tudo, Pitágoras buscou o conhecimento da Verdade e só por isso já deve ser reverenciado por toda a Humanidade

BIBLIOGRAFIA
Pitágoras – Amante da Sabedoria - Ward Rutherford - Editora Mercúrio - São Paulo
Pitágoras – Uma Vida - Peter Gorman - Editora Pensamento - São Paulo
A Doutrina Secreta -Volumes II e V - H.P.Blavatsky - Editora Pensamento - São Paulo
Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia – Nicola Aslan – Artenova - Rio
A Simbólica Maçônica - Jules Boucher - Editora Pensamento - São Paulo
Maçonnerie Occulte et L’Initiation Hermétique – J.M.Ragon - Cahiers Astrologiques - Paris
Diálogos - Platão - Abril Cultural - São Paulo


ANTÓNIO ROCHA FADISTAM.'.I.'., Loja Cayrú 762 GOERJ / GOB - Brasil
Fonte:
Maçonaria.net
http://www.maconaria.net/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=47
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

LIRA - CÍTARA - HARPA - ALAÚDE



LIRA (cítara*, harpa*, alaúde)
Escrito por Profecias   
A lira, inventada por Hermes*
ou por uma das nove Musas, Polímnia,
é o ins­trumento musical de Apoio e de Orfeu*,
de melodias prestigiosas, e o símbolo dos poetas.

De modo mais geral, é o símbolo e o instrumento da harmonia cósmica: ao som da lira, Anfião construiu os muros de Tebas. Na iconografia cristã, evoca a par­ticipação ativa na união beatífica. Esse papel é o da harpa de Davi. 

As sete cor­das da lira 
corresponderiam aos sete pla­netas:  

harmonizam-se em suas vibrações, como aqueles nas suas revoluções cósmi­cas; quando o número das cordas foi elevado a doze, quis-se ver nelas uma correspondência com os doze signos do Zodíaco. 

A noção de harmonia exprime-se também 
pelas harpas dos vencedores 
da besta do Apocalipse.  

O belíssimo apólogo de Chenwenn, relatado por Lie-tse, não é menos significativo a esse respeito: tocando as cordas, P'ao-pa fazia os pássaros e os peixes dançarem; mas Chen-wenn conseguiu produzir, com o som de cada uma das quatro cordas, o nascimento de cada uma das estações e, com a harmonia das quatro, a ordem perfeita de um mundo, que é o dos Imortais. 

O alaúde ou a cítara (vina) 
é o emblema de Sarasvati, xácti de Brama,
personificação da Palavra, do som criador
(também o dos kinnara, pássaros*).

O alaúde de cinco cordas primitivo dos chineses não tivera outro objetivo a não o de reduzir a atividade dos ventos e excesso de yang. Mas terá havido mau uso? O resultado foi imperfeito e teve de corrigido pela dança. O alaúde maravilhoso fabricado a partir do navio da ilha Ajahl, de que fala o Konjiki, tem certamente relação com a harmonia do império, reflexo da harmonia cósmica.

Na Roda da Existência tibetana, 
Avalokiteshvara aparece com um alaúde
no mun­do dos deva: a idéia é acordar os deuses
de suas ilusões ao som do Dharma.

Tomai como modelo o tocador de cítara, escreve Calisto II Xanthopoulos: a cítara é o coração, as cordas são os sentidos, o tocador a inteligência, e o arco a lem­brança de Deus. 

A lira é um dos atributos de Apolo e simboliza os poderes de divinação próprios do Deus. Enquanto atributo das Musas Urânia e Érato, a lira simboliza a inspira­ção poética e musical.

Baseando-se na narrativa mitológica da invenção da lira, Jean Servier considera-a como um altar simbólico a unir o céu e a terra. Tendo roubado bois de Apolo, Her­mes cobriu com a pele de um deles uma carapaça de tartaruga, fixou nesta um par de chifres e estendeu cordas de tripa sobre essa caixa de ressonância. 

Ora, nas civili­zações mediterrâneas,
o boi representa o Touro Celeste...
Fazer vibrar a lira é fa­zer vibrar o mundo. 

As núpcias cósmicas se cumprem, a terra é fecundada pelo céu; chove sobre os campos e os flancos das mulheres tornam-se pesados. Todos os ins­trumentos musicais parecem ter possuído iguais meios de chegar à harmonia secreta do mundo.
Fonte:
Profeciasnet
Ter, 23 de Fevereiro de 2010 00:45
http://www.profeciasnet.com.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=930:lira-citara-harpa-alaude&catid
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HERMETISMO E MAÇONARIA


Doutrina, História, Atualidade
INTRODUÇÃO

Faz já mais de vinte anos foi publicado na França Science de l'Homme et Tradition 1; seu autor, o discutido Gilbert Durand, ao referir-se à decadência do racionalismo, do positivismo, etc., quer dizer, das ciências humanas atuais, sustenta que a única possibilidade de tirá-las de seu beco sem saída, é a presença do Hermetismo, ou seja a aceitação de tudo aquilo que significam os deuses enquanto pautas, enquadramentos e padrões do pensamento, em particular o versátil Hermes, deidade das adaptações, mensageiro e portanto veículo da comunicação e do Ensino (Psicopompo). 


Segundo G. Durand isto já ocorreu outras vezes, o que está implícito, adicionamos nós, em sua própria denominação de Hermes Trismegisto, ou seja, de três vezes grande, que não só está em relação com sua própria identidade, mas também com sua atuação no devir, sua intervenção histórica. De fato, esta figura percorre toda a história do Ocidente até nossos dias já que não só é o Trismegisto alexandrino, o Hermes grego e o Mercúrio romano, entidades tão móveis e inquietas como seus múltiplos atributos, que abrem caminhos e resolvem encruzilhadas, mas também da mesma forma o Thot egípcio, deidade escritora que aparece aqui e acolá como herói cultural.



De fato esta figura é universal e pode assimilá-la aos Odín e Wotan Nórdicos, com os Enoque, Elias e Eliseu bíblicos, com o Zoroastro iraniano, e com o Quetzalcoátl tolteca e seus análogos em toda a América2, com quem compartilha muitos de seus atributos e funções, dos quais se diz que não morreram, mas foram arrebatados ao céu, estão vivos, e se afirma têm que voltar para final dos tempos, quer dizer deste ciclo humano. 



De fato, estes deuses são antediluvianos, atlantes, e ainda de origem anterior, hiperbóreos, e sua presença foi contínua ao longo da presente humanidade articulando as tradições conhecidas por sua própria função, e até aquelas das quais perdemos notícia. Inclusive é muito importante na última revelação religiosa, o Islã, onde é conhecido como o profeta Idris (como tal é mencionado no Corão) e onde é assimilado ao Mahdi, personagem que também aparecerá ao final dos tempos3, e que de fato se apresentou cada vez que esta tradição esteve em perigo de extinção ou corrupção.



As comparações com Jesus, o Cristo, –assim como suas relações com os deuses de distintos panteões, especialmente o grego– levar-nos-iam muito longe para os limites desta introdução, embora não podemos deixar de assinalar as numerosas equiparações da alquimia cristã4 Medieval e Renascentista entre o Mercúrio Solar e a divindade crística, e igualmente as relações hebraicas entre o Metatron e esta divindade, filha direta do Pai, quer dizer, nosso irmão5.



O Hermes grego, segundo os hinos homéricos, nasce na obscuridade de uma gruta, –como Jesus num presépio– na noite, e finalmente tem que converter-se no sol do amanhecer6. Seus pais são Zeus e Maia7 (relacionar este nome com o da mãe de Buda) e, como todas as deidades análogas, através de um processo ascendente alcança a plenitude de suas possibilidades e o ser humano então se deifica através de céus, ou planos –o mundo intermediário–, como o Corpus Hermeticum e outros textos atestam; o que é o mesmo que dizer que os númens ou anjos se fazem nele (de modo descendente)8, posto que o recipiente de sua alma conseguiu lhes dar capacidade mediante uma reciprocidade harmônica, possibilidade que pode se expressar em cada alma individual, ou ser coletivo, ainda que em nossos dias sombrios.



Assinalamos a estreita vinculação do Hermetismo com o Cristianismo, e também com a Tradição Hebraica (Enoque, Elias, Metatron) mas queremos adicionar quanto a esta última sua relação com o Egito, onde os judeus viveram cativos e foram liberados por meio de Moisés, filho adotivo do Faraó, que certamente recebeu determinados conhecimentos tradicionais dessa civilização.



Igualmente outra influência muito destacada é a caldéia, já que o patriarca Abraão era da cidade de Ur; isto se encontra vinculado, então, a importantes legados astrológicos e "mágicos", já que na Antigüidade estes termos estavam identificados com o vocábulo caldeu. Isso sem negar a absoluta originalidade da Tradição Judaica e sua língua sagrada.



Entretanto, em épocas posteriores, na Idade Média, surgem na Espanha com a aparição do Zohar, e em toda a Europa, várias correntes relacionadas não somente com a Árvore da Vida Cabalística (Sepher Yetsirah, Sepher Bahir), que tiveram parentesco com o pensamento gnóstico e neoplatônico, conforme autorizados investigadores; este é o caso de Gershom Scholem, e atinge o cerne do judaísmo, pois tudo isso foi incorporado à doutrina, à Cabala, termo cuja tradução, como se sabe, é literalmente "Tradição" e, portanto, nós adicionamos, igualmente ligada por intermédio da Gnose com a Tradição Hermética. Tudo isso sem mencionar à Cabala Cristã –que se denomina assim por constituir a aparição da Tradição judaica no seio do cristianismo, tal como o termo Hermetismo Cristão com respeito a Hermes, na Tradição cristã– de tanta influência no Renascimento (e ainda na Idade Média) e que se projetará até nossos dias.

No caso do Islã, um povo, o dos sabeus, rendia culto a Hermes.



Posteriormente foram islamizados e, como já dissemos, seu antigo Deus passou a ser o profeta Idris9. Diz-se que este povo "descendia" da Rainha de Sabá, e daí sua vinculação com Salomão e seu Templo, deste modo tomado como modelo da Maçonaria, cujo parentesco com o Hermetismo se estudará no presente livro. 



Por isso Hermes, Pastor do rebanho celeste, Deus verdadeiramente Universal, é ao mesmo tempo a deidade mais antiga de todos os panteões –sendo antediluviano– e portanto um númen que bem poderia ser qualificado de Arquetípico, ou melhor, o Arquétipo da deidade no plano intermediário, ou identificado ao Ensino, como forma de comunicação, por mediação do Conhecimento, com os planos mais altos da Cosmogonia e a Ontologia, e da mesma forma com os autênticos suportes da Metafísica10.

Igualmente Hermes está vinculado com a música e a arte em geral, pois é o inventor da lira –que entrega a Apolo– e tem estreito parentesco com as Musas11, já que suas três primeiras irmãs, em Delfos, personificavam as cordas desse instrumento.12

De fato, a música, cuja origem é divina, está relacionada com o plano intermédio, e é capaz de estabelecer vínculos entre a audição e o Verbo, quer dizer entre o que se ouve e o sopro do inaudível.

Comparou-se a estrutura do cosmo com uma arquitetura musical, já que os sons e os números expressam proporções arquetípicas de harmonia e movimento coincidentes tanto no macro como no microcosmo. Não só a música é terapêutica –e aqui é preciso recordar a vara mágica que Apolo deu a Hermes em troca da lira, que podia curar13, ou despertar, tanto como dar o sonho e a morte, e que logo se converte no eixo de seu caduceu–, mas também manifesta estruturas invisíveis e inaudíveis que se expressam por sua intermediação. Por outra parte, é sabido que a música se propaga pelo ar e as asas do caduceu mercurial representam esta idéia, já que a deidade transmissora se vale fundamentalmente deste meio para revelar suas mensagens, assim como o vento anuncia a bênção das chuvas.

A.-J. Festugière, em seu livro La Révélation d'Hermès Trismégiste, afirma que há um hermetismo popular e um hermetismo culto. Estamos de acordo com ele mas não por suas razões, já que parece confundir povo com "massa". De outra parte, cataloga o hermetismo popular como se expressando mediante mancias, tais como a astrologia, ou por conjuros, ou talismãs, o que considera superstições, ao mesmo tempo em que só destaca os textos sapienciais (sem entendê-los por seus preconceitos, claro, embora este é outro assunto). Não obstante nós queremos também destacar esse outro grupo de ensinos e costumes, próprios de todas as tradições, e que só podem ser qualificadas de supersticiosas quando se as compara com outros ritos que se entendem como oficiais, ou apoiando-se no racionalismo mais evidente e numa lógica que exclui o pensamento analógico. Se todo um povo acreditar em certos amuletos –em primeira instância símbolos– que expressam a energia desse deus, é que esse deus está vivo para eles, e invocado permanentemente. Por isso é que existe igualmente uma Tradição Hermética popular, tão válida quanto a sapiencial, pois o Deus ao qual se invoca naquela se encontra tão vivo como o que possa existir nesta.14 Nos momentos em que Hermes presidiu um povo, uma instituição, um grupo, pelo consentimento deste e, sobretudo, por Sua graça, a diferença entre os conhecimentos é só questão de grau numa sociedade organizada de tal maneira que todos participem de acordo com as suas capacidades e condições especiais, que têm sua função dentro dela, sem nenhuma exclusão por motivos artificiais, ou por uma diferenciação contundente, como nos é possível observar cotidianamente.

Como se pode apreciar, as revelações do Deus Hermes são múltiplas e a deidade aparece de muitíssimos modos distintos no curso da História.15Deste modo se poderá observar neste estudo a íntima relação de nosso deus com a Maçonaria, como arauto do Grande Arquiteto do Universo. Para nosso trabalho tomamos em geral modelos míticos greco-romano-alexandrinos, que posteriormente poderão ser assimilados a outros panteões, mas a deidade, ou o conjunto de deidades intermediárias, segue sendo o mesmo, agrupado sob a entidade chamada Hermes (Hiram), que está tão presente hoje em dia como o fora em outros tempos e espaços, e se continua revelando de muitas diferentes maneiras, de acordo às diversas mentalidades, grupos e indivíduos que habitam o planeta.

O caduceu ou a vara –junto com as asas já mencionadas– é o elemento principal da iconografia do Hermes greco-romano, mas estes elementos estão presentes de diversos modos em outras muitas representações. De fato, as serpentes enroscadas no eixo da vara se encontram em diferentes tradições; no caso do Hermes-Mercúrio, é óbvio que elas representam à dualidade, própria de tudo o que é criado no Cosmo. E a interação destas serpentes enroladas no eixo universal em três níveis reflete, por um lado o plano do Universo, e por outro a conjunção dos opostos efetuada igualmente em todos os mundos. Mediante esta união dos contrários, pode-se escalar através do eixo até que essa dualidade é superada pela função polar do próprio eixo, que transcende os opostos, e vitorioso se eleva para um espaço definitivamente outro.

Por sua agilidade, nosso deus é preparado, espontâneo
e rápido, por isso foi reconhecido como o númen de comerciantes16 e diplomatas, inclusive de ladrões; isso está claro em seu currículo, já que uma de suas primeiras façanhas é roubar cinqüenta vacas do rebanho de Apolo, o que indigna a este, embora que seja posteriormente perdoado. Além das significações astronômicas atribuídas a este mito, isto ao mesmo tempo o localiza dentro das deidades "trapaceiras", ou seja, as que vivem em sua raiz o paradoxo da dualidade cósmica, à qual são capazes de transcender de súbito, através de uma conjuntura pela qual podem filtrar-se.

Sem dúvida a Hermética é uma tradição complexa, como é a vida, o plano do Universo, e as relações entre os homens; ousar é quase necessário para nos tirarmos as cadeias que nos fazem escravos de nossa programação, ou das que querem nos infligir outros, verdadeiros policiais do pensamento, espíritos totalitários cujo refúgio é a norma, embora esta seja notoriamente falsa. Ninguém vem nos oferecer ou nos dar a liberdade; uma das condições para obtê-la é fazê-lo por nós mesmos, sem se deixar enganar por qualquer "mestre" ou diretor espiritual, mas sim por meio do plano intermediário, invocando ao Mestre Interno.

Apesar da sua ambigüidade, a entidade numênica será capaz de nos guiar no caminho, de tutelar nossas peregrinações e de nos tirar dos labirintos aos quais constantemente acedemos; e, se nos amparar com sua graça, seremos capazes de encontrá-la em cada volta da viagem, e reconhecê-la sob as diferentes maneiras e os diversos disfarces com que se reveste.

Por isso não sempre é fácil para todos conseguir uma filiação com esta Tradição –tampouco Hermes tem que lha outorgar a qualquer um sem que este pague seu preço– nem a realização nessa via, que não se expressa de maneira religiosa ou sentimental-devocional, que não possui ortodoxias teologais estritas, a não ser a vivência de sua doutrina por meio do Conhecimento, o que obriga constantemente ao Aprendiz a constatar o que acontece no itinerário de seu próprio caminho, em seu ser interno, quer dizer, em sua Iniciação, sem o consolo que lhe soem brindar determinadas crenças relativas ao aparato religioso, que, entretanto, podem ser observadas desde outro nível simbólico, depurando-as, ou seja, em termos alquímicos, "retificando-as". Por isso é que a denominou uma Tradição "à intempérie" e pode ser considerada pouco apta para certos espíritos pacatos que não se arriscam e, portanto, desta forma não podem calar ou deixar de se queixar por suas vicissitudes, ao invés de prosseguirem seu caminho, presidido pelo silêncio hermético.

Antes de finalizar estas palavras preambulares, queremos destacar um meio do qual se vale o hermetismo. De fato, para os hermetistas, o livro é um transmissor direto de conhecimentos, que se unem numa doutrina, que é absolutamente transformadora já que, tomando consciência de nós mesmos, conhecemos também nosso ser no mundo, quer dizer, os segredos da cosmogonia em virtude das leis da analogia que estabelecem as correspondências entre macro e microcosmo. A intermediação deste conhecimento do "Si", sempre é pela mediação simbólica de um terceiro elemento, capaz de conectar duas proposições e realizar o milagre da triunidade do Ser, tanto do homem quanto do mundo, posto que sabemos que a cosmogonia é o Ser (ontologia) do Universo.

Por este motivo se justifica que comecemos esta obra com um capítulo dedicado aos livros herméticos –que fixam o ensino oral– onde se poderá apreciar a história desta deidade, tanto quanto de suas doutrinas no mundo greco-romano e alexandrino, na Idade Média e no Renascimento e seus epígonos atuais.

Nesse sentido, o Corpus Hermeticum, a coleção de escritos mais emblemática da Tradição Hermética, no cap. XXIII (5-8) dos "Extratos de Estobeu", denominado a Pupila do Cosmo ou Koré Kosmou, afirma:

    "Agora, oh maravilhoso filho meu, Hórus, não é num ser de raça mortal onde isto poderia se produzir –de fato nem sequer existia ainda–, a não ser numa alma que possuísse o laço de simpatia com os mistérios do céu: eis aí o que era Hermes, quem tudo conheceu.
Viu o conjunto das coisas; e, tendo visto, compreendeu; e, tendo compreendido, teve poder de revelar e ensinar. De fato, as coisas que conheceu, gravou, e, havendo-as gravado, ocultou-as, tendo preferido melhor, a respeito da maior parte delas, guardar um firme silêncio antes que falar, a fim de que tivesse que as buscar toda geração nascida, depois, do mundo. Nisto, Hermes se dispunha a remontar para os astros para escoltar os deuses seus primos. Entretanto deixava por sucessores a Tat, simultaneamente seu filho e o herdeiro destes ensinos, logo, pouco depois, a Asclépios o Imuthés, segundo os intuitos de Ptah-Hefaistos, e a outros ainda, a todos aqueles que, pela vontade da Providência rainha de todas as coisas, deviam realizar uma busca exata e conscienciosa da doutrina celeste. Hermes pois, estava a ponto de dizer em sua defesa, ante o espaço circundante, que nem sequer tinha entregue a doutrina íntegra a seu filho, em vista da ainda muito pouca idade deste, quando, havendo-se levantado o dia, sendo que, com seus olhos que a tudo vêem, contemplava o Oriente, percebeu algo indistinto e, à medida que o examinava, lentamente, ao fim, veio-lhe a decisão precisa de depositar os símbolos sagrados dos elementos cósmicos perto dos objetos secretos de Osíris e, depois, assim que realizou ainda uma prece e pronunciado tais e quais palavras, subiu ao céu."

    "Mas não convém, meu menino, que deixe este relato incompleto: é necessário que refira tudo o que disse Hermes no momento de depositar os livros. Ele, pois, falou assim: 'oh livros sagrados que foram escritos por minhas mãos imperecíveis, vós sobre os quais, havendo-os ungido com o elixir da imortalidade, tenho todo poder, permaneçam imputrescíveis e incorruptíveis, através dos tempos de todos os ciclos, sem que se lhes veja ou se lhes descubra nenhum daqueles que terão que percorrer as planícies desta terra, até o dia em que o céu envelhecido da luz a organismos dignos de vós, aqueles que o Criador chamou Almas'."




NOTAS
1 Há edição em castelhano recente: Ciencia del Hombre y Tradición, Ed. Paidós, Barcelona 1999.
2 Quetzalcoátl (serpente alada) é também deus Asteca e como tal se estendeu por toda a área deste império, inclusive o sudoeste dos E.U.A. A mesma deidade recebe os nomes de Kukulcan, Gucumatz e Votam (notar o parentesco do nome com a deidade nórdica) entre os Maias, Bochica nos Chibchas colombianos, Viracocha entre as culturas incaicas, etc. etc., os quais bem poderiam ser chamados os Hermes Atlantes.
3 Ver L. Massignon, apêndice bibliográfico sobre "L'Hermétisme Arabe", em La Révélation d'Hermès Trismégiste: A.-J. Festugière, Les Belles Lettres, Paris 1989.
4 Muitos textos dão conta dela. Virtualmente toda a alquimia ocidental está posta sob o patrocínio de Hermes, invocado dentro da Tradição Cristã.
5 Ver Charles Mopsik. Le Livre Hébreu d'Hénoch. Moshé Idel, Hénoch c'est Métatron. Ed. Verdier, Lagrasse, França 1989.
6 Ou seja, a possibilidade de cada um ser um Hermes não nascido, que posteriormente fará despontar a alvorada.
7 Maia é uma das Plêiades, filhas de Atlas, daí sua relação com a civilização Atlântida e suas resultantes, ou seja: com a raça vermelha.
8 Ainda que ambos movimentos, ascendente-descendente, são na verdade simultâneos.
9 Ver Henry Corbin, Historia de la Filosofía Islámica. Editorial Trotta, Madrid 1994.
10 Se houver uma tradição Primordial, quer dizer: Arquetípica, e todas as formas em que se manifesta são só maneiras diferentes devido a condições de tempo, espaço e mentalidade, também há deuses arquetípicos e unânimes em todos os panteões, e se revelam também de diversas maneiras. De fato, Hermes, senhor do plano intermediário e condutor sutil nas estruturas do pensamento, é universal, e portanto cósmico e capaz de nos levar pelos caminhos do Conhecimento até os graus mais altos, e igualmente dos modos mais inesperados.
11 Ver W. Otto, Las Musas, el origen divino del canto y del mito. Eudeba, Bs. As. 1981.
12 No início, segundo Erastóstenes em sua Mitologia do Firmamento (Catasterismos = transformação em estrelas), a lira estava feita "a partir da carapaça de uma tartaruga e dos chifres das vacas de Apolo; tinha sete cordas, em lembrança das filhas de Atlas [Plêiades]. Foi entregue a Apolo, que, depois de entoar um canto com ela, deu-a de presente a Orfeu, o filho de Calíope, uma das Musas, que ampliou o número de cordas a nove" em honra das mesmas. (Alianza Ed. Madrid 1999).
13 Quanto à medicina, o Caduceu preside até hoje através do bastão de Esculápio (Asklepios) seu filho, todas aquelas ciências não só vinculadas a esta mas também a farmacopéia.
14 Recordemos aqui uma forma de Hermes, como a antiga divindade Tracia, invocada pelos pastores para cuidar e reproduzir seus rebanhos, daí que na Arcádia fosse representado com o falo ereto, o que chegou a ser extremamente popular entre os camponeses que o colocavam nas frontarias de suas casas, passando posteriormente como um poderoso talismã às cidades gregas.
15 Por exemplo –e para citar só um caso–, nas tradições pré-colombianas, Quetzalcoátl e seus análogos já citados possuem distintos atributos e formas, mas não é difícil reconhecer à deidade em sua função mediadora e transmissora. "Salve Hermes, dispensador de alegria, mensageiro, doador de bens!" (Hino Homérico XVIII).
16 A presença de Hermes como deus do comércio está testemunhada em numerosas cidades de diversos continentes nos edifícios dedicados às Bolsas, ao comércio marítimo, (nossa deidade não só é fundamental na viagem iniciática mas também em todas as viagens, e especialmente nas grandes empresas de navegação –sem contar as terrestres– que deram lugar ao descobrimento de novos mundos), aos seguros, etc. Muitas destas esculturas ou baixos-relevos, emblemas e alegorias, são verdadeiras obras de arte, e em especial foram produzidas nos séculos XVIII e XIX.

Fonte:
Hermetismo e Maçonaria

http://simbolismoyalquimia.com/hermetismo-pt.htm
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.