quinta-feira, 10 de novembro de 2011

ABELARDO e HELOISA "Em Nome de Deus..





Abelardo e Heloisa 

"Fujo para longe de ti,
evitando-te como a um inimigo,
mas incessantemente
te procuro em meu pensamento.
Trago tua imagem em minha memória
e assim me traio e contradigo,
eu te odeio, eu te amo."
Carta de Abelardo a Heloísa.

"É certo que quanto maior é a
causa da dor, maior se faz
a necessidade de para ela
encontrar consolo, e este
ninguém pode me dar, além de ti.
Tu és a causa de minha pena,
e só tu podes me proporcionar conforto.
Só tu tens o poder de me entristecer,
de me fazer feliz ou trazer consolo."
Carta de Heloísa a Abelardo

Um dos túmulos mais bonitos que se encontra no Pére Lachaise é o de Pierre Abélard e Héloïse, protagonistas de um trágico romance interrompido na Paris medieval do século XII. Pedro Abelardo era um filósofo que se apaixonou por Heloísa, de quem era tutor e que era 20 anos mais nova.

Os dois tiveram um filho, 
Astrolábio, 
e casaram-se às escondidas. 
Quando o tio de Heloísa, um clérigo de Notre-Dame, soube, mandou castrar Abelardo que foi viver na abadia de St. Denis, onde continuou seus estudos. Heloise retirou-se para um convento. Mesmo distantes, os dois se corresponderam em longas e amorosas cartas, mas nunca mais se falaram pessoalmente.
Os mas hoje
quase 700 anos depois,
estão para sempre juntos 
numa tumba em estilo neogótico.
Pierre Abélard (1079-1142) foi teólogo e filósofo francês, nascido em Le Pallet, perto de Nantes, considerado um dos maiores intelectuais do século XII com especial importância no campo da lógica, e precursor do racionalismo francês. Filho de um militar, foi discípulo de Roscelino de Copiègne e de Guilherme de Champeaux em Paris e de Anselmo de Laon (c.1070-1171).

De vida atormentada e irrequieta, depois de algumas tentativas de ter sua própria escola a partir dos 22 anos, foi professor na Escola de Notre-Dame (1114-1118), primeira universidade livre da França, onde combateu as idéias de Guilherme, obrigando-o a modificá-las. No Concílio de Soisons (1121), algumas de suas teses foram condenadas e no Concílio de Sens (1410), outras foram rejeitadas e foi acusado de heresia. Foi nessa época que começou sua ligação amorosa com sua aluna de nome Héloise (1100-1164), sobrinha do cônego Fulbert, de desastrosas conseqüências .

Após se apaixonar 
e casar secretamente, foi atacado 
e castrado por ordem do irado tio. 
 
Depois disto ele se tornou monge no mosteiro de Saint-Denise, onde continuou lecionando, e ela freira em um convento de Argenteuil, onde se tornou uma das mulheres mais famosas de sua época. Após o infeliz castigo, mesmo como monge, ele não deixou de ser polêmico e colecionou atritos com outros religiosos como bispos e até mesmo com seus colegas monges, criando muitos inimigos. Morreu na prelazia de Saint-Marcel, perto de Châlons-sur-Saône, onde viveu seus últimos dias de vida sob a proteção de Pedro o venerável de Cluny.

Suas obras 
abrangiam três áreas:
lógica, teologia e ética. 
 
Em seu primeiro e mais famoso livro Sic et non (1121-1122) já demonstrava sua polêmia personalidade: nele descreveu sobre 158 questões filosóficas e teológicas que dividiram opiniões. Também merecem destaque Glosas literais, Lógica nostrorum, Logica ingredientibus, Dialectica (a mais polêmica), Theologia summi boni, Commentaria in epistulam Pauli ad romanos, Expositio in hexaemeron e Ethica seu scito te ipsum e uma autobiografia Historia calamitatum ou História de minhas desventuras(clique aqui para ler a obra em inglês).
Pedro Abelardo 
ao lado de Hugo de San-Victor 
delinearão um novo quadro inovador 
dos processos educativos.
 
Abelardo em sua obra autobiográfica, em que narra o atormentado amor por Heloísa, põe em destaque uma nova identidade humana, mais individual, mais racional, mais livre, que se propõe também como um modelo formativo. Assim no Epistolário retornam o Abelardo-professor e o Abelardo-homem, carregado de dúvidas, de paixões, estimulado por um desejo de busca que põe a razão (a dialética) como instrumento chave de uma formação propriamente humana.

Com o já lembrado Sic et Non
Abelardo, porém, consigna à Escolástica 
o método de estudo e de estudo racional 
- articulado sobre a dialética - dos vários assuntos. 
 
Com sua tomada de posição em torno da questão dos universais (os universais são conceitos de gênero - ex., humanidade - : eles existem in re, in mente ou são puros nomina?), que interpreta estes como conceitos (seguindo Aristóteles), tendo estatuto lógico e lingüístico, ele delineia uma concepção crítica do pensamento e da pesquisa filosófica que diz respeito à formação de um sujeito como intelectual autônomo e, justamente, crítico, já muito próximo do sujeito moderno.
Abelardo e Heloísa - Uma História de Amor. 

(este trecho trata-se de um resumo 
romanceado sobre a história dos dois)

Conhecidos como os amantes imortais, 
ambos viveram em Paris no século XII. 
 
O romance entre Heloísa e o filósofo Pedro Abelardo iniciou-se em Paris, no período entre o final da Idade Média e o início da Renascença.

Abelardo havia sido transferido recentemente e nomeado professor pela Escola Catedral de Notre Dame, tornando-se, em pouco tempo, muito conhecido por admirar os filósofos não-cristãos, numa época de forte poder da Igreja Católica.

Heloísa, que já ouvira falar sobre Abelardo e se interessava por suas teorias polêmicas, tentou aproximar-se dele através de seus professores, mas suas tentativas foram em vão.

Numa tarde Heloísa saiu para passear com sua criada Sibyle, e aproximou-se de um grupo de estudantes reunidos em torno de alguém. Seu chapéu foi levado pelo vento, indo parar justamente nos pés do jovem que era o centro da atenções, o mestre Abelardo. Ao escutar seu nome, o coração de Heloísa disparou. Ele apanhou o chapéu, e quando Heloísa aproximou-se para pegá-lo, ele logo a reconheceu como Heloísa de Notre Dame, convidando-a para juntar-se ao grupo. Risos jocosos foram ouvidos, mas cessaram imediatamente quando o olhar dos dois posaram um sobre o outro. Heloísa recolocou seu chapéu, fez uma reverência a Abelardo e se retirou.

Desde esse encontro, porém, Heloísa não consegui mais esquecer Abelardo. Fingiu estar doente, dispensou seus antigos professores e passou a interessar-se pelas obras de Platão e Ovídio, pelo Cântico dos Cânticos, pela alquimia e pelo estudo dos filtros, essências e ervas. Ela sabia que Abelardo seria atraído por suas atividades e viria até elas. Quando ficou sabendo dos estudos de Heloísa, conforme previsto por ela Abelardo imediatamente a procurou.

Abelardo tornou-se amigo de Fulbert de Notre Dame, tio e tutor de Heloísa que logo o aceitou como o mais novo professor de sua sobrinha, hospedando-o em sua casa, em troca das aulas noturnas que ele lhe daria. Em pouco tempo essas aulas passaram a ser ansiosamente aguardadas e, sem demora, contando com a confiança de Fulbert, passaram a ficar a sós. Fulbert ia dormir, e a criada retirava-se discretamente para o quarto ao lado.

Em alguns meses, conheciam-se muito bem, e só tinham paz quando estavam juntos. Um dia Abelardo tirou o cinto que prendi a túnica de Heloísa e os dois se amaram apaixonadamente. A partir desse momento Abelardo passou a se desinteressar-se de tudo, só pensando em Heloísa, descuidando-se de suas obrigações como professor.

Os problemas começaram a surgir. Primeiro, esse amor começou a esbarrar nos conceitos da época, quando os intelectuais, como

Heloísa e Abelardo, 
racionalizavam o amor, acreditando 
que os impulsos sensuais deveriam ser
reprimidos pelo intelecto.
 
Não havia lugar para o desejo, que era um componente muito forte no relacionamento dos dois, originando um intenso conflitos para ambos. Ao mesmo tempo Sibyle, a criada, adoecera, e uma outra serva que a substituíra encontrou uma carta de Abelardo dirigida a Heloísa, e a entregou a Fulbert, que imediatamente o expulsou. No entanto isso não foi suficiente para separá-lo.
Heloísa 
preparou poções para seu tio dormir e, 
com a ajuda da criada Sibyle, 
Abelardo foi conduzido ao porão,
local  que passou a ser
o ponto de encontro dos dois.
 
Uma noite, porém, alertado por outra criada, Fulbert acabou por descobri-los. Heloísa foi espancada, e a casa passou a ser cuidadosamente vigiada. Mesmo assim o amor de Abelardo e Heloísa não diminuiu, e eles passaram a se encontrar onde pudessem, em sacristias, confessionários e catedrais, os únicos lugares que Heloísa podia freqüentar sem acompanhantes a seu lado.

Heloísa acabou engravidando, e para evitar aquele escândalo, Abelardo levou-a à aldeia de Pallet, situada no interior da França. Ali, Abelardo deixou Heloísa aos cuidados de sua irmã e voltou a Paris, mas não agüentou a solidão que sentia, longe de sua amada, e resolveu falar com Fulbert, para pedir seu perdão e a mão de Heloísa em casamento.

Surpreendentemente, Fulbert o perdoou e concordou com o casamento.
Ao receber as boas novas, Heloísa, deixando a criança com a irmã de Abelardo, voltou a Paris, sentindo, no entanto, um prenúncio de tragédia. Casaram-se no meio da noite, às pressas, numa pequena ala da Catedral de Notre Dame, sem nem trocar alianças ou um beijo diante do sacerdote.
 O sigilo do casamento não durou muito, e logo começaram a zombar de Heloísa e da educação que Fulbert dera a ela.

Ofendido, Fulbert 
resolveu dar um fim àquilo tudo. 
Contratou dois carrascos e pagou-os 
para invadirem o quarto de Abelardo durante a noite 
e arrancar-lhe o membro viril.
 
Após essa tragédia, Abelardo e Heloísa jamais voltaram a se falar.
Ela ingressou no convento de Santa Maria de Argenteul, em profundo estado de depressão, só retornando à vida aos poucos, conforme as notícias de melhora de seu amado iam surgindo. Para tentar amenizar a dor que sentiam pela falta um do outro, ambos passaram a dedicar-se exclusivamente ao trabalho.

Abelardo construiu uma escola-mosteiro 
ao lado da escola-convento de Heloísa. 
Viam-se diariamente, mas não se falavam nunca.
Apenas trocavam cartas apaixonadas.
 
Abelardo morreu em 142, com 63 anos, Heloísa ergueu um grande sepulcro em sua homenagem, e faleceu algum tempo depois, sendo, por iniciativa de suas alunas, sepultada ao lado de Abelardo.

Conta-se que, ao abrirem a sepultura de Abelardo, para ali depositarem Heloísa, encontraram seu corpo ainda intacto e de braços abertos, como se estivesse aguardando a chegada de Heloísa.
Leia mais esse texto sobre um interessante livro que trata da correspondência trocada entre os dois:

Uma história de amor: Abelardo e Heloísa
por Alexandre Piccolo
 Correspondência de Abelardo e Heloisa - Martins Fontes






















O caso de Abelardo e Heloísa é uma história de Amor das antigas, anterior a Romeu e Julieta, do século XII para ser mais preciso. Pouco sabemos de verdade sobre este amor entre professor e aluna, sequer se existiu. O livro em si, Correspondência de Abelardo e Heloísa *, além de um breve estudo inicial, nos apresenta cinco epístolas - gênero muito difundido na antiguidade latina - trocadas entre os famosos "amantes", as quais juntas costuram um tecido de uma apaixonante colcha de casal medieval, sem rasgá-lo ou remendá-lo por completo. Ao contrário, deixam dúvidas descobertas tão atrozes que inúmeros estudos e hipóteses são bordados há quase 1000 anos. Enfim, um belíssimo texto no sentido pleno.

A primeira das cartas é, na verdade, uma confissão de Abelardo a um amigo. Toda a história dos infortúnios é contada longa e complacentemente: das aulas (e confusões) de filosofia que o professor ministrava nas incipientes escolas medievais, dos primeiros encontros furtivos com a bela e jovem Heloísa ao trágico episódio da castração do protagonista (sim, castração!) e o longo e conseqüente arrefecimento de uma "concupisciência literária" amaldiçoada na obra.

O gênero epistolar e a tragédia da emasculação podem parecer desestimulantes ou desagradáveis (principalmente aos homens...) mas, ao contrário, a prosa é por demais envolvente e impetuosa.

O tom íntimo e confessional da carta, bem como a retórica e erudição do autor - exageros de linguagem característicos destes tempos "barrocos" - cativam e inebriam, ainda que desconfiemos da soberba do protagonista em suas confissões, ora puramente arrogante, ora calorosa: "Sob o pretexto de estudar, entregávamos inteiramente ao amor. As lições nos propiciavam esses tête-à-tête secretos que o amor anseia. Os livros permaneciam abertos, mas o amor mais do que nossa leitura era o objeto dos nossos diálogos; trocávamos mais beijos do que proposições sábias.

Minhas mãos voltavam 
com mais freqüência a seus seios
do que a nossos livros. O amor mais freqüentemente 
se buscava nos olhos de um e outro 
do que a atenção os dirigia sobre o texto" [1].
Heloísa coloca sua colher na obra quando recebe e lê por acaso a carta endereçada ao amigo de Abelardo. Responde-lhe então com o fervor e a paixão do amor feminino, mas um amor já contido e amargurado pela desgraça dos infortúnios que lhes afligira (certamente, muito mais a ele!), um amor já em princípio de revolta, tamanha submissão religiosa por ela aceita - ambos dedicam-se à vida monástica após o fracasso amoroso. Abelardo recebe e responde a epístola de sua amada, porém ensaia uma resposta com ensinamentos de uma frieza tão grande que chega a parecer desdém aos pedidos de boa notícia que Heloísa tanto lhe rogava. Aí ela "roda a baiana" na quarta carta - um reconhecido ponto alto da obra.
 
Ela confessa-lhe um amor inimaginável, supremo e irrestrito, acima do Deus a quem ela serve por obrigação do pedido de Abelardo, unicamente como prova de amor incondicional a seu amado terreno. Assim, Heloísa profere vitupérios ao destino (a deusa Fortuna, para a cultura latina), à sabedoria, à prudentia, à temperança, à castidade e a todos os valores que lhe parecem falsos por terem lhes conduzido à infeliz ruína amorosa - resumo de sua vida conjugal. E o aparato filosófico e bíblico esquenta o conflito entre intelecto monástico e mente pecaminosa, caliente em diversas passagens:

"Os prazeres amorosos 
que juntos experimentamos têm para mim tanta doçura 
que não consigo detestá-los, nem mesmo expulsá-los 
de minha memória. Para onde quer que eu me volte,
eles se apresentam a em meus olhos 
e despertam meus desejos. 
Sua ilusão não poupa meu sono. 
 
Até durante as solenidades da missa, em que a prece deveria ser mais pura ainda, imagens obscenas assaltam minha pobre alma e a ocupam bem mais do que o ofício. Longe de gemer as faltas que cometi, penso suspirando naquelas que não pude cometer" [2].

Nem os homens
nem mesmo as mulheres 
escapam a suas vociferações 
("As mulheres não poderão então jamais 
conduzir os grandes homens senão à ruína" [3])
- argumento a favor da manipulação 
e falsidade da própria obra.
 
Capa do filme Em Nome de Deus - título original Stealing Heaven , do diretor Cllive Donner 






















Abelardo encerra neste livro o conjunto das correspondências com uma carta consoladora. Uma espécie de tratado que defende os valores sacrossantos do matrimônio (pois resignou-se a acreditar que seu casamento fora um atentado ao pudor - ah, se eles imaginassem a lascívia do mundo de hoje...), uma contra-argumentação sólida dos pontos fortes expostos por Heloísa que se assemelha a um primeiro tratado de pura retórica. E digo "neste livro" e "primeiro tratado" pois parece haver continuação desta seqüência de epístolas, de essência puramente filosófica, diferente destas apaixonantes cartas - tema de novos tratados para um outro livro.

Para os mais eufóricos com o cinema, há uma adaptação de 1988 deste caso de amor para as telas, o filme Stealing Heaven (traduzido no Brasil como Em nome de Deus), que, além das cores reluzentes, não guarda a mágica das palavras, ainda que conte quase a mesma história...

Há um encaixe perfeito entre as epístolas (ou coesão do conjunto, um discurso compacto e persuasivo, segundo Duby [4]) que nos faz questionar não só a autenticidade da correspondência mas também o propósito monástico de tais escritos. Há um ambiente cristão misturado a valores pagãos, o que tempera a imaginação com muito misticismo medieval. Uns se questionam: houve mesmo tamanho desencontro e sofrimento nesta tragédia, no sentido medieval do termo (ação com final infeliz), como nos lembra Zumthor no prefácio do livro. Há a valorização da tradição latina em confronto com o ideal cavaleiresco que surge no período e inúmeros outros apontamentos.

Enfim, muito já se falou 
e ainda é possível falar sobre 
esta facinante história de amor 
de tão longes tempos.
 
E uma infinidade de leituras permite também uma inesgotável gama de análises - proposta que foge do objetivo deste curto ensaio. Como este amor fracassou ou por quê Abelardo foi castrado? - estas ciladas da curiosidade ficam ao leitor e leitora que desejam saber mais de uma história de Amor que vale a pena ser conhecida.

* Correspondência de Abelardo e Heloísa, 
tradução do francês de Lúcia Santana Martins,
prefácio de Paul Zumthor, ed. Martins Fontes, SP - 2000, p. 41
[1] Op. cit. , p. 41
[2] Op. cit., p. 119
[3] Op. cit., p. 116
[4] Duby, G., Heloísa, in Heloísa, Isolda e outras damas no século XII,
Companhia das Letras, SP - 1995, p.68    
  Fontes:
Na internet:


Bibliografia:
DUBY, George .Heloísa, Isolda e outras damas no século XII.
São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
CAMPI, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: UNESP, 1999. 
sábado 19 maio 2007 15:17 , em FILOSOPHIA
Li
Fonte:
*
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Que tal comentar agora?