quarta-feira, 30 de abril de 2014

A HIPOCRISIA DESARMAMENTISTA - Mario Cesar Flores - USP





Desarmamento é Armadilha - Olavo de Carvalho -  7min.
História do Controle de Armas -58min.
 
 
 Por traz do Desarmamento - 13min.

A Hipocrisia

Desarmamentista
Mario Cesar Flores


A questão estrutural do tema das novas dimensões do desarmamento comporta dois
conceitos básicos, complementares e, sob alguns ângulos de análise, entrelaçados.
Conceitos obviamente discutíveis e sujeitos a controvérsias e contestações, sobretudo da
parte dos que hierarquizam o idealismo moral e jurídico acima das realidades do poder, dos que imaginam ser possível construir a tranqüila felicidade dos povos sobre a utopia do bom comportamento natural dos homens - algo que a história não endossa.

O primeiro conceito diz respeito à idéia de trânsito freqüente no pacifismo idealista
e, por força das circunstâncias culturais de alguns povos, no preconceito anti-militar, a
saber: os sistemas militares são a causa principal, são os impulsionadores auto-inspirados e autônomos das políticas armamentistas dos países. O segundo se refere à inversão ilógica mas insistente em certos meios que, usando uma figura da retórica popular, põe o carro na frente dos bois: o armamentismo e suas exponenciações por vezes paranóicas seriam causa e não efeito dos antagonismos e rivalidades entre países.

O registro inicial desses dois conceitos deixa, desde logo, claras minhas convicções
básicas que, em síntese e embora a contragosto, aceitam a supremacia de fato das razões de Estado sobre os princípios idealistas abstratos e entendem que, ressalvados os raros casos históricos de regimes militaristas condicionados por preocupações primordialmente estratégicas, os militares, suas concepções estratégicas e seu preparo são mais instrumento que inspiração. Em virtude da tendência militar à autonomia, o instrumento militar pode até ultrapassar os limites do razoável, sobretudo onde, por tradição histórico-política, apatia ou ignorância do poder político e da sociedade civil, é frágil o controle político sobre o sistema militar, mas dificilmente ele atropela de forma drástica a alma nacional.

Exemplificando: o armamento naval da Alemanha da virada do século XD(. para o
XX, que estimulou o antigermanismo inglês, decorreu da política global da Alemanha de Guilherme II; o Almirante Tirpitz apenas deu-lhe forma estratégica. A transformação dos EUA em potência naval foi inspirada no mercado mundial para a produção industrial do leste e agrícola do centro-oeste norte-americano; o almirante Alfred T. Mahan  apenas lhe deu racionalidade intelectual. Os tratados de restrição naval de 1922 e 1933 fracassaram em virtude das ambições políticas conflitantes dos EUA, Japão e Inglaterra; seus almirantes foram apenas os arquitetos técnicos da burla aos tratados, a substituição dos encouraçados por porta-aviões. O re-armamento alemão dos anos 30 foi, essencialmente, a reação da nação alemã às iniqüidades de Versailles; aos militares coube apenas dar-lhe a configuração de que resultaram as vitórias de 1939 a 42, inviável sem o engajamento psicossocial do povo. E, para citar exemplos atuais, índia, Paquistão e Israel não se teriam nuclearizado e o Iraque não teria sido tentado pelas armas de destruição de massa se suas políticas de poder e segurança regional não os tivessem compelido a isto.

Enfim e em síntese: o armamentismo de qualquer natureza (e não apenas o do tema
desta mesa) anda a reboque das concepções nacionais de poder político e econômico, com suas ambições e rivalidades e não o inverso. Os sistemas militares geralmente apóiam tais concepções, mas raramente decidem com autonomia a adoção de políticas armamentistas fortes.

Assim parametrado, penso que só existem dois caminhos para controlar o
armamentismo ou promover o desarmamento, convencional e o relativo às armas
apocalípticas. Um deles, a redução das razões políticas e econômicas que estimulam
antagonismos e rivalidades capazes de justificar o armamentismo e modelar sua
configuração. Razões inspiradoras da transformação do poder econômico em poder militar, em princípio em proveito do econômico mas, não raramente, contribuindo para seu colapso mesmo sem derrota em guerra, simplesmente por exaustão, como foi o caso da ex-URSS na sua economicamente mal sustentada corrida armamentista com os EUA.

O outro caminho é o da coerção moderadora dos efeitos armamentistas das razões
indutoras de antagonismos e rivalidades. Não se pode negar a este caminho um certo sabor imperial ou hegemônico, singular ou coletivo e, mesmo quando o estímulo à coerção tem respaldo coletivo, ela não atinge sentido prático na ausência de um poder hegemônico (uma potência ou um grupo solidário de potências) capaz de liderar a coerção, por persuasão política e econômica mas, se necessário, mediante ações sigilosas, ameaça ou uso efetivo da força.

Um exemplo do primeiro caminho nos diz respeito direto: o acerto de ponteiros
entre Argentina e Brasil, cujos antagonismos e rivalidades herdados da história viveram
um último espasmo nos anos 70 em função do aproveitamento do rio Paraná (o caso Itaipu x Corpus), que chegou a gerar preocupação militar. Resolvido o caso, redemocratizados os dois países e deslanchadas as bases de um convívio político e econômico profícuo, exorcizamos não apenas as preocupações de defesa convencional (de que são reflexos a redução da ênfase tradicionalmente dedicada ao sul pelo nosso Exército), como principalmente as preocupações nucleares. Argentina e Brasil deram a conhecer, um ao outro, seus programas nucleares e criaram a Agência Brasileiro-Argentina de Controle (ABAC), que inspeciona e acompanha nossas atividades nucleares e acabou por se inserir no sistema de controle centrado na Agência Internacional de Energia Atômica da ONU (AIEA, Viena), uma inserção lógica diante da adesão da Argentina e do Brasil, ao TNP.

O grande exemplo atual do segundo caminho, o da coerção, está sendo a ação da
ONU, estimulada e hegemonicamente conduzida pelos EUA com o apoio ou a
complacência das maiores potências, destinada a extinguir os programas de armas de
destruição de massa do Iraque. Mas, ressalvada a excepcionalidade do problema iraquiano, emoldurado pela ameaça do uso da força, mais importantes sob a perspectiva de maior prazo são os mecanismos e as práticas que, usando formulações retóricas criadas nos anos 60 por um diplomata brasileiro, vêm conseguindo manter desarmados os desarmados, vêm conseguindo manter relativamente congelado o perfil básico do poder estratégico mundial - ou relativamente, por conta de algumas exceções Sue perturbam a estabilidade do congelamento, como são os casos da Índia e do Paquistão.

Esses mecanismos e práticas são constituídos, fundamentalmente, pelos tratados e
convenções cerceadores das armas de destruição de massa (adesão por convicção ou por
rendição a estímulos ou pressões) e pela atuação de instrumentos como o Missile
Technology Control Regime (MTCR), um acerto controlador de transferência de
tecnologia, entre sócios de relevo tecnológico. Tudo complementado e servido por medidas indutoras do bom comportamento (louvável, embora por vezes apimentado pelo tempero amargo da pressão), como são certas inibições políticas, alguns embargos tecnológicos e tratamento discriminatório nas relações econômicas. Vale lembrar que o Brasil foi bastante atingido pelos embargos tecnológicos (e por algumas inibições políticas, como a não participação no diretório do MTCR) que, esperamos, terão cessado como resultado de nossas posições recentes, nas questões nuclear e missilística (terão mesmo?). Entretanto, embora essas medidas coatoras, abaixo do uso da força, sejam as preferenciadas, o bom comportamento é eventualmente imposto até pela força, valendo como exemplo o bombardeio aéreo israelense a instalação nuclear do Iraque, supostamente útil ao projeto iraquiano de desenvolvimento da arma nuclear.

Resumindo, para apoiar a continuidade da exposição: o primeiro caminho do
controle das armas de destruição de massa, evidentemente o ideal, está alicerçado na
inexistência de razões conflitantes o bastante para justificar esse tipo extremo de 4
armamentismo. O segundo, na hierarquia de poder, que proporciona as condições para o
exercício da coerção política, econômica e, se necessária, militar um caminho
obviamente discutível sob a perspectiva dos conceitos da igualdade jurídica e da soberania dos Estados, vigentes desde Westphália.

No tocante ao segundo caminho, o problema reside no confronto entre as razões do
Estado que se arma e as da humanidade, que precisa de tranqüilidade perturbada pelas
armas de destruição de massa. Avaliação delicada porque atinge os conceitos a que acabo
de me referir, mas vital porque no século XXI os conflitos entre países abaixo do primeiro
nível de poder serão muito mais prováveis que os praticamente inverossímeis conflitos
totais entre grandes potências nuclearizadas e, é claro, para a humanidade é preferível
manter os mais prováveis sob tetos de violência menos dramáticos.

O segundo caminho não é suficientemente eficaz para conter países de razoável
grau de desenvolvimento científico e tecnológico, dotados de recursos para aplicar em
programas de armamento de alto custo, quando suas razões, reais ou manipuladas por suas
lideranças, são psicossocialmente convincentes o bastante para justificar o sacrifício do
bem estar social de seus povos em proveito de tais programas. Razões em geral
relacionadas com o jogo de poder regional (inserem-se aqui a índia, o Paquistão e, de certa
forma, o Irã e o hoje manietado Iraque) e, eventualmente, com o sentimento de
inconfiabilidade nos princípios abstratos da segurança coletiva operacionalizada pelo
Conselho de Segurança da ONU, cuja eficácia depende dos interesses das grande potências
e, em particular, dos EUA, hoje o fiel estratégico mundial. Note-se que o jogo do poder
regional e o sentimento de insegurança, podem se somar como acontece com Israel. As
restrições das grandes potências dificultam e encarecem os programas dos países em
patamares tecnológico e econômico minimamente adequados e psicossocialmente
motivados, mas não pode detê-los de modo categórico, inclusive porque a interferência
extrema, militar, seria de alto custo e risco, no caso desses países.

A incontenção objeto dessas minhas últimas considerações talvez viesse a
acontecer no Brasil e na Argentina, se não tivéssemos acertados nossos ponteiros no pós
regimes militares, um acerto que será tanto mais consolidado quanto maior for o sucesso
do Mercosul, que impulsionará (em coerência com o primeiro conceito apresentado nesta
exposição) a consolidação da tranqüilidade estratégica (a primazia da estratégia sobre o
econômico só teria cabimento se houvesse uma grave ameaça econômica comum, como
ocorreu na Europa ocidental diante da URSS). Se preservados os regimes democráticos,
menos propensos a devaneios geopolíticos, Brasil e Argentina não embarcarão em
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aventuras armamentistas heterodoxas, menos por inviabilidade tecnológica e até financeira
(se as lideranças nacionais conseguissem justificar o sacrifício do povo) e mais porque
estão sendo viradas as páginas do antagonismo histórico (sobrará, sem solução, a
rivalidade no futebol...).

Essas observações sobre Brasil e Argentina são úteis para compreendermos a Ásia
e o Oriente Médio. Índia e Paquistão provavelmente não teriam se sentido compelidos à
nuclearização bélica se suas independências tivessem sido melhor conduzidas, amainados
os contenciosos que os intranqüilizam, em particular o relativo à Cachemira. Israel não
teria tido interesse de chegar à arma atômica se não estivesse incrustado no mundo
islâmico hostil. E Iraque e Irã (este, curiosamente, hoje poupado da crítica internacional)
não teriam se engajado em programas caros e de alto risco (armas NBQ e mísseis) não fora
a disputa pela hegemonia regional, a que não faltam os resíduos das dissensões islâmicas
de mais de mil anos!

Expressando um otimismo não de todo impossível, eu diria que esses países talvez
até regridam em seus programas, quando as questões que os atribulam tomarem rumos
tranqüilizadores (difícil é fazer que isso aconteça...). E outros países afetados por
contenciosos latentes, por ora vulneráveis à coerção inibidora do armamentismo radical,
não adotarão esse tipo de armamentismo se seus problemas caminharem para acomodações
satisfatórias.

Abro aqui um parêntese para abordar as armas convencionais, elas também de alto
risco. Governos e instituições das sociedades dos países desenvolvidos e ricos
freqüentemente criticam o armamentismo convencional dos menos desenvolvidos, ou
pobres, mas esbravejam quando esses menos desenvolvidos, ou pobres, compram armas de
seus concorrentes, inclusive invocando a excelência letal de suas ofertas e as facilidades de
financiamento que as acompanham. De fato, o armamentismo convencional é hoje muito
estimulado pelo interesse comercial das empresas produtoras de armas, comumente
apoiadas pelos seus governos e seus bancos de fomento à exportação embora seja justo
mencionar que os EUA são mais cuidadosos e seu Eximbank não financia exportação de
armas. Creio ser lícito temer que tais práticas se estendam - se é que já não existem ao
material e às tecnologias úteis às armas de destruição de massa, inclusive porque o controle
é difícil dada a ambigüidade de uso civil e militar.

Fechado o parênteses, faço agora uma breve observação relativa às maiores
potências, aos EUA e à Rússia, China, França e Reino Unido. Para essas potências a
coerção é evidentemente sem sentido e o único caminho adequado para produzir
6
moderação no armamentismo de destruição de massa é o do acervo dos macroproblemas
internacionais que as afetam; no caso nisso, também o controle do espólio nuclear da ex-
URSS. Tudo isso está, aparentemente, bem andado hoje em dia, já tendo sido dados alguns
primeiros passos limitadores, como o Tratado de Banimento das Explosões (infelizmente
ainda não adotado por todos os países nuclearizados) e a redução do número de mísseis e
ogivas (ainda suficientes para uma catástrofe nuclear). Talvez a incógnita temporária neste
contexto seja a China, mas também ela haverá de conduzir-se com moderação responsável,
em seu processo de re-inserção no mundo, ora em curso. Ressalto, porém, que as medidas
limitadoras não podem se restringir à área nuclear, devem se estender às armas
bacteriológicas e químicas, mantidas num nebuloso sigilo estranhamente escamoteado do
sensacionalismo da imprensa (apenas o cinema explora este tema). Afinal, as selvas do
Vietnã não perderam suas folhas por força de um outono norte-americano, perderam-nas
por força das armas químicas norte-americanas.

Sintetizando, para finalizar: não existe mágica desarmamentista. Vamos ter que
continuar convivendo com as armas de destruição de massa, mas já existem sintomas
positivos de moderação, ainda tímidos, como são as Conversações para a Limitação das
Armas Estratégicas (SALT), as Convenções sobre armas químicas e bacteriológicas e o
Tratado sobre o Banimento de Explosões Nucleares (complementar ao TNP). Avanço mais
rápido e mais profundo depende da redução das tensões internacionais que afetam as
grandes e médias potências e, também, da eficiência das restrições e pressões inibidoras
deste tipo de armamento.

Paz-Picasso-
 Desarmamento


 

* Texto do evento “O Brasil e as Novas Dimensões da Segurança Internacional” realizado no IEA no dia 11 de setembro de 1998.
∗∗ Almirante de esquadra e ex-ministro da Marinha.
2 -As opiniões aqui expressas são de inteira responsabilidade do autor, não refletindo necessariamente as posições do IEA/USP.


Cem anos após a 1ª, quais as chances de uma 3ª guerra mundial?

Atualizado em  24 de fevereiro, 2014 - 10:39 (Brasília) 13:39 GMT
Cemitério da Primeira Guerra Mundial em Ieper, na Bélgica (AP)

Cemitérios com soldados mortos durante a Primeira Guerra Mundial estão espalhados pela Europa, como este, perto de uma ferrovia na Bélgica
Parece improvável que, cem anos depois do início da Primeira Guerra Mundial, outra guerra nesta escala possa ser desencadeada.
Mas era exatamente isto que as pessoas acreditavam antes do assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando e de sua esposa dele por um extremista sérvio em junho de 1914.
Atualmente, existem no mundo alguns focos de conflito: a Europa e a Rússia vivem um momento de tensão devido à situação na Ucrânia, e a China e o Japão também discutem a posse de algumas ilhas no Mar do Leste da China.

Em tempos como estes, há dois riscos específicos. O primeiro é que países menores possam arrastar os maiores para conflitos.
Em 1914, após o assassinato do arquiduque, Rússia, França e Grã-Bretanha se envolveram com o lado sérvio, enquanto a Alemanha apoiou a Áustria.

O segundo risco é que os governos fiquem tentados a acreditar que podem iniciar guerras limitadas e bem-sucedidas que vão acabar rapidamente. Geralmente eles estão errados.

Literatura

Nos dias de hoje presumimos que nosso mundo globalizado está conectado demais para que uma guerra mais ampla aconteça. Talvez, mas em 1910, um homem chamado Norman Angell também pensava assim.

Angell escreveu o livro A Grande Ilusão para provar que a guerra seria uma loucura, devido aos laços comerciais existentes entre as grandes potências na época.
O livro foi um grande sucesso mas, apesar de Angell estar certo em sua percepção de que um conflito seria insano e de ter recebido o Prêmio Nobel da Paz 22 anos depois, a guerra aconteceu de qualquer jeito.

No entanto as coisas mudaram muito em cem anos. Não importa o que possa parecer, nosso mundo é menos perigoso, e a tendência à guerra é menor do que era.
A ameaça de um conflito nuclear generalizado também não existe mais.
No momento, existem mais de 30 guerras em andamento no mundo. Mas elas tiram menos vidas humanas do que antes.

Entre 1950, quando a Guerra da Coreia começou, e 2007, quando o número de mortes na Guerra do Iraque finalmente começou a cair, ocorriam algo perto de 148 mil mortes por ano devido a guerras.
De 2008 a 2012 este número caiu de forma dramática, para 28 mil por ano. E poderá ser ainda menor em 2014.

Ao analisar os números de uma forma um pouco diferente, vemos que nos 14 anos do século 21, até o momento, o número médio de mortes em guerras foi de 55 mil - apesar de sempre haver uma polêmica cercando estes números, principalmente no que diz respeito ao número preciso de pessoas que morreram no Iraque depois da ofensiva americana e britânica no país.
Mas este número é a metade do que foi registrado na década de 1990 e um terço do número de mortes que ocorreram durante a Guerra Fria.

Teremos uma guerra mundial em um futuro próximo?
Não podemos saber mais do que Norman Angell sabia em 1910 quando lançou seu livro. Mas, desta vez, com certeza, é mais seguro esperar que não teremos.


 Fontes:
 BBC News
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