domingo, 1 de novembro de 2009

A CREAÇÃO - HAYDN - -Mozart - Ave verum corpus


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A CRIAÇÃO - Franz Joseph Haydn





a.r.t.e.
MÚSICA
Haydn e o nascimento do Universo
Por Matheus G. Bitondi

Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo abriu a sua temporada 2005 com o grandioso oratório “A creação”

No último dia 3 de março, na Sala São Paulo, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, sob a batuta de seu regente titular John Neschling, deu início a sua temporada 2005. Na ocasião, a orquestra, o coro e cantores solistas convidados apresentaram “A criação”, do compositor austríaco Franz Joseph Haydn (1732-1809).

A obra consiste em um oratório dividido em três partes que totaliza cerca de duas horas de duração e narra os sete dias ao longo dos quais, segundo a Bíblia, Deus teria criado o Universo. Para isso, o compositor alterna textos extraídos do Gênesis e do “Paraíso perdido”, de John Milton, ambos traduzidos para o alemão por Gottfried van Swieten.

Em 1797, ao estrear esse oratório, Haydn, que já havia ajudado a definir a estética do classicismo do século XVIII, com o estabelecimento, por exemplo, do quarteto de cordas e da sinfonia como gêneros musicais mais importantes, dava um passo em direção ao romantismo, estética que predominaria no século XIX. Já a abertura da peça, sintomaticamente intitulada “A representação do caos”, apresenta uma certa instabilidade harmônica e passagens cromáticas que, 80 anos mais tarde, se tornariam características típicas da música de Richard Wagner.

Outro prenúncio do romantismo contido em “A criação” é a ilustração musical quase pictórica do conteúdo do texto. Em passagens como a separação entre a terra e os mares, podemos ouvir verdadeiras ondas jorrando da orquestra, e na separação entre a luz e as trevas Haydn contrasta momentos de orquestrações graves e escuras a momentos de uma luminosidade ofuscante, representados por um acorde maior em tutti orquestral.

Também o primeiro nascer do sol e a criação das estrelas recebem tratamentos orquestrais que dispensariam o texto cantado que os explica. Esse tipo de discurso musical descritivo viria a ser, anos depois, a tônica dos poemas sinfônicos de Liszt e Berlioz. Vale ainda ressaltar que todos esses efeitos pictóricos são compostos sem qualquer recurso tecnológico ou instrumental não usuais para a época, à exceção talvez de um contrafagote que representa os primeiros passos dos animais sobre a Terra.

Um último traço romântico a ser realçado na obra -e bem menos óbvio aos ouvidos- é o deslocamento da dramaticidade da forma para camadas mais superficiais da estrutura musical, como a harmonia e a melodia. À diferença de uma sonata clássica, na qual a dramaticidade era gerada pelo contraste entre as suas várias seções e seus respectivos temas -que se portavam tais como personagens em uma obra literária-, nas obras do romantismo ela passou a se associar à não resolução de acordes cada vez mais dissonantes e à assimetria das linhas melódicas, o que viria a culminar no conceito de "melodia infinita" elaborado por Wagner e na desintegração do sistema tonal pela condução cada vez mais longínqua da harmonia.

Todos esses fatores fazem com que essa magnífica obra, juntamente com as últimas sinfonias de Beethoven, se configure como base do espírito romântico que então nascia em terras germânicas, segundo o qual os artistas -e principalmente os compositores- seriam elevados a postos de divindades por filósofos e pensadores da arte como Nietzsche e Schopenhauer. Nesse contexto, a obra de Haydn funcionaria ainda como metáfora da própria criação artística.

Também é interessante notar que, para apontar os caminhos a serem trilhados pelos românticos, Haydn se apropria de um gênero já antiquado para a sua época: o oratório, que havia se consagrado sob a pena de compositores barrocos como Bach e Händel. Deste modo, mais uma vez, o compositor austríaco se antecipava aos seus colegas românticos que, insuflados pelo nacionalismo que uniria o povo alemão, elegeriam estes dois compositores barrocos como "pais" de toda a música germânica.

Num plano bem mais modesto, “A criação”, por seu caráter grandioso, proporcionou uma ótima abertura para a série de concertos que a Osesp programou para este ano de 2005.

A execução primorosa deste verdadeiro quadro musical por partes da orquestra, do coro e dos solistas convidados -com destaque para o baixo João Fernandes- pôde dar uma boa idéia do que será o restante da programação, que prevê obras de igual importância, como a “Sinfonia Turangalîla”, de Olivier Messiaen, a “Paixão segundo São Mateus”, de Johann Sebastian Bach, e várias obras raramente executadas de compositores brasileiros como Jocy de Oliveira, Almeida Prado e Marlos Nobre, além de ilustres convidados, como a violista Tabea Zimmermann e o oboísta e regente Heinz Holliger.

Matheus G. Bitondi
É compositor, mestrando em música pela Unesp.

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Leia entrevista com Almeida Prado
 
 No princípio era o Verbo
gerador de infinitos universos
- no homem , o fractal
 

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