Curso de Filosofia – Régis Jolivet
Capítulo Segundo
O DINAMISMO SENSÍVEL
ART. I.
NATUREZA E DIVISÃO
116 1. Natureza dos fenômenos afetivos. — Os fenômenos afetivos são manifestações de nossas tendências e de nossas inclinações. É evidente que, na falta dessas tendências, poderia existir, no ser vivo, em resposta a uma excitação externa, uma reação mecânica moldada nesta ação, mas não esta manifestação, tão variável nas suas expressões, de sentimentos e de emoções, que definem a vida afetiva do animal.
2. Divisão dos fenômenos afetivos. — Dividiremos, por isso, as manifestações do dinamismo sensível em dois grupos: as tendências e os estados afetivos. Entre as tendências distinguiremos as tendências naturais ou instintos, que derivam das necessidades fundamentais do ser vivo, — e as inclinações, que derivam das necessidades secundárias do ser vivo.
Os estados afetivos podem ser igualmente divididos em dois grupos: os que têm por antecedente uma modificação orgânica (prazer e dor), — os que têm por antecedente um fato psíquico (emoções e sentimentos). — Ficarão por estudar as paixões, que são inclinações levadas a um alto grau de força.
ART. II. O INSTINTO
A. Noção.
117 1. Definição. — Chama-se instinto o conjunto das tendências naturais, que derivam das necessidades fundamentais ou primárias do ser vivo. É em virtude de necessidades deste gênero que o animal é impelido a exercer todos os atos necessários a sua conservação individual ou específica. Estas tendências naturais não constituem faculdades distintas: elas se identificam com a natureza do ser vivo sensível, e se definem por ela.
As tendências adquiridas ou inclinações se enxertam nas tendências naturais ou instintos, de que exprimem as
manifestações acidentais, variáveis em número e em intensidade segundo os indivíduos. Daí se conclui que os instintos servem para definir a natureza específica, enquanto que o sistema das inclinações permite determinar o caráter dos indivíduos.
As tendências, quer sejam inatas ou adquiridas, são inconscientes, como a própria vida. Não podem ser tratadas diretamente e em si mesmas, mas apenas nos seus efeitos, que são os fenômenos afetivos.
2. Instinto, tropismo e reflexos. — O instinto difere dos tropismos ou fenômenos de orientação determinados, nas plantas, por agentes físicos (luz, umidade, peso etc), — dos reflexos, reações desprendidas automaticamente, no animal pelos centros nervosos, sob a ação de certos excitantes (como as secreções salivares j à vista de um prato apetitoso, o ato de fechar os olhos diante de uma luz muito forte, os gestos de proteção de alguém que cai), — O instinto difere também do habito, que não tem o inatismo dos instintos.
B. Caracteres.
118 Distinguem-se os caracteres primários e os secundários. Os primários são o inatismo e a estabilidade dos instintos; os secundários a universalidade específica e a ignorância do fim.
1. O inatismo.
a) Natureza. No que há de essencial, o instinto não com porta nem aprendizagem nem discernimento individual, nem inte ligência que utilize uma experiência anterior. Donde sua infalibilidade e sua perfeição imediata. As operações mais complicadas pa recém ser apenas um certo jogo para certos insetos: as abelha; e as aranhas resolvem problemas de geometria de uma complexidade desconcertante; a borboleta, mal saída do casulo, mergulha de um só jato sua trompa no cálice das flores.
b) Instinto e inteligência. O instinto, como tal, se opõe então à inteligência, definida como a capacidade de se adaptar às-novas situações, com a ajuda do saber anteriormente adquirido. O instinto, sem dúvida, é inteligente., mas o animal não o é, quer dizer que a inteligência, no animal, não é uma faculdade ou uma função: é apenas uma qualidade do instinto.
2. A permanência. O instinto é uma conduta permanente e estável do animal, apesar das modificações que possam afetar uma ou outra das funções que compreende. Esta estabilidade se verifica pelo fato de que, nem no espaço, nem no tempo, se produzem variações notáveis nem progressos importantes e duráveis-no exercício de um instinto. As abelhas trabalham hoje exatamente como no tempo de Virgílio e os gatos não parecem ter feito progressos na arte de apanhar ratos.
3. A universalidade específica. — Cada espécie pode ser definida por um sistema de instintos (ou de técnicas instintivas), tão seguramente quanto por sua estrutura orgânica. É assim que cada espécie de aranha tem uma maneira especial de tecer sua teia, que cada espécie de pássaro constrói um ninho particular, cujos elementos (localização, materiais, sustento) são tão estritamente determinados que o naturalista sabe logo, à vista do ninho vazio do seu ocupante, por que espécie de pássaro foi construído.
Todavia, todo instinto, mesmo nos insetos, admite certas diferenças individuais, quanto às formas que reveste. Estas variações individuais são cada vez mais notáveis à medida que nos elevamos na escala animal, dos insetos aos vertebrados, sobretudo os animais mamíferos e, entre estes, os grandes macacos. Na realidade, a universalidade específica deveria caracterizar-se pela uniformidade dos resultados, mais do que pela uniformidade dos mecanismos.
4. A igualdade do fim. — O animal faz com perfeição o que faz por instinto, mas não sabe nem o que faz nem como faz, quer dizer, não pode escolher nem o fim, nem os meios, pois estes lhe são impostos pela natureza. A estupidez do instinto resulta, então, de sua necessidade e o que explica sua perfeição explica ao mesmo tempo seus erros. Sabe-se que a galinha choca com perseverança um ovo de vidro substituído a um ovo fecundado, que a abelha solitária continua a prover uma célula furada, com um buraco por onde o mel vai-se escoando.
O psiquismo animal é pois,
não-refletido e automático.
A consciência do animal
é uma consciência obscura.
C. Classificação dos instintos.
2. Instinto e técnicas instintivas. — Este ponto-de-vista leva a eliminar da lista dos instintos todas as reações orgânicas reflexas, que nela se introduzem geralmente, como os atos de caminhar, andar de rastos, coçar, bocejar, espirrar etc. — Da mesma forma, não se deve considerar como compreendendo instintos especiais as técnicas pelas quais os instintos se exercem: elas não diferem do próprio instinto. Que significaria o instinto alimentar, se não fosse provido, desde o início, no recém-nascido, da técnica que o torna apto a mamar, ou, no pinto, da técnica inata que lhe permite bicar?
D. Origem do instinto.
120 Propuseram-se diversas teorias para explicar o instinto.1. Teoria biológica. — Não se pode explicar o instinto com os caracteres que o distinguem, a não ser que se admita que exista no animal uma força vital dotada de finalidade interna, quer dizer que organiza o animal por dentro e o dota de todos os Instintos necessários à sua vida, a sua subsistência e à sua propagação. Esta força vital aparece como inteligente e cega ao mesmo tempo: a inteligência, que ela manifesta, é uma inteligência objetiva, a mesma que opera em toda a natureza, o que supõe um Organizador e um Legislador supremo.
2. Teorias inadequadas. — Vê-se pelo que precede que è impossível admitir as diferentes teorias que pretendem quer identificar o instinto e a razão, — quer reduzir o instinto ao puro mecanismo:
a) Teoria dos animais-máquinas. É a teoria de Descartes. Os animais seriam puros mecanismos, cujos movimentos decorreriam da ação dos objetos exteriores (como esses autômatos, cujos movimentos são regulados por molas). — Esta teoria desconhece, evidentemente, a realidade da vida sensível e mesmo de uma certa inteligência (conhecimento, memória) no animal.
b) Teoria intelectualista. Segundo esta teoria, defendida por Montaigne, o instinto seria uma inteligência como a nossa, e mesmo superior em segurança e engenhosidade. — Esta tese deve igualmente ser repelida, pois o instinto, se é geralmente seguro, é rigorosamente limitado a certas técnicas invariáveis, enquanto a inteligência humana é suscetível de uma infinidade de adaptações diversas.
c) Teoria evolucionista.
O instinto, segundo Lamarck e Darwin, seria um hábito adquirido pela espécie., no curso de uma longa evolução, e transmitido por hereditariedade. — Esta teoria não é mais do que uma hipótese, e encontra bastantes dificuldades. Estas dificuldades foram expostas na Cosmologia (84).
Art. III. AS INCLINAÇÕES
A. Natureza das inclinações.
Devemos estudar aqui as inclinações humanas, em si mesmas, e nas suas relações com os instintos.
1. Instinto e inteligência. — É raro que os instintos se manifestem em estado puro na espécie humana, após a idade da primeira infância. No adulto, eles não mais significam do que orientações gerais ou quadros da atividade: a experiência, os hábitos, as coações sociais, sobretudo o ato da inteligência, não cessam de exercer sua ação para refrear, desviar, canalizar ou modificar o ato dos instintos. O homem, por isso, ganha bastante em variedade e multiplicidade de inclinações, mas perde muito em segurança mecânica. Contudo, o lucro é certo, uma vez que às habilidades precisas e seguras, mas estritamente limitadas do instinto, a inteligência humana substitui uma habilidade universal.
2. Instinto e vontade. — O homem possui o poder de suspender o efeito do impulso instintivo por um ato inibidor de sua vontade refletida, O ato instintivo, submetido a um juízo de valor, não tem, normalmente, o caráter explosivo que marca o exercício do instinto entregue a seu próprio capricho. Daí se segue que, no homem, a tendência se desprende, de alguma forma, do ato. Contrariamente ao que acontece no animal, ela pode permanecer potencial ou virtual.
B. As tendências especificamente humanas.
122 O homem tem inclinações específicas, ligadas à sua natureza intelectual e moral. Definem-se comumente como o amor da verdade, do bem e do belo.
1. O amor da verdade, do bem e do belo.
— É impossível enumerar todas as inclinações complexas que derivam das tendências instintivas do homem, para descobrir a verdade, para realizar o bem por sua vida moral, e a beleza pelas obras de arte. Estas inclinações têm sua raiz comum na razão, de que são aspectos diversos, inatos e universais, como a própria razão.
2. Existe um instinto religioso? — A universalidade do fato religioso no tempo e no espaço não autoriza a fazer dele produto de um instinto especial. A "religião natural" resulta do exercício de todas as nossas inclinações ou necessidades racionais: inclinação à verdade, que incita a procurar a explicação de todas as coisas num Deus criador, Pai e Providencia da humanidade, — inclinação ao bem e ao belo, que nos leva a descobrir em Deus a fonte primeira e o exemplar perfeito da Bondade e da Beleza, o princípio de toda a justiça, o juiz das consciências e o supremo desejável.
3. As inclinações sociais. — São a forma, no homem, do instinto gregário, e podem ser reduzidas a três tendências fundamentais: a simpatia, a imitação e o jogo.
a) A simpatia. Distinguem-se uma simpatia passiva e uma simpatia ativa.
A simpatia passiva é a capacidade de sentir com os seus semelhantes, de participar de seus sentimentos e suas emoções. Nos animais, ela se manifesta por uma espécie de contágio emocional (por exemplo, quando o pânico se apodera do rebanho). No homem, a simpatia passiva exerce um papel importante, a um tempo sob a forma espontânea (a visão das lágrimas é por vezes suficiente para fazer que nos venham lágrimas nos olhos), e sob a forma deliberada, quando ela é um produto da atividade moral pela qual queremos participar das alegrias e tristezas do próximo.
A simpatia ativa designa um conjunto de atitudes de benevolência, que tem por fim proteger, ajudar, socorrer ou aliviar o próximo. Está, pois, muito próxima da amizade. Suas causas imediatas podem residir ou na simpatia passiva, ou nos motivos racionais (caridade, filantropia, solidariedade etc).
b) A imitação. A imitação é exclusivamente humana. Os animais são incapazes de imitar: os cavalos, tomados de pânico pelo relinchar apavorado de um congênere da tropa, não imitam a este, mas sofrem o contágio do pavor. A imitação é uma cópia e não uma reação automática. Mas não parece que se possa fazer dela um verdadeiro instinto: é mais uma inclinação extremamente complexa, cujas manifestações se prendem antes de mais nada ao instinto social (simpatia, admiração, submissão ou prestígio etc).
c) O jogo. Define-se o jogo como uma atividade gratuita, quer dizer, tema atividade que não visa a produzir uma obra, mas ao puro desdobramento da atividade. Joga-se por jogar: o jogo encontra seu fim em si mesmo. Pode-se fazer dele um instinto propriamente dito? Não o parece. O jogo parece ser, antes, uma atividade pré-formadora ou supletiva das tendências instintivas: a menina brinca de boneca ou de casa; o menino brinca de soldado. De fato, a atividade do jogo segue exatamente a evolução dos. instintos e parece ser uma inclinação que deriva do conjunto dos instintos, a um tempo nas suas manifestações e no seu desenvolvimento.
C. A redução das inclinações.
123 Podem-se reduzir os instintos e as inclinações do homem à unidade? Muitos filósofos, especialmente La Rochefoucauld, Hobbes e Freud assim pensaram.1. Redução ao egoísmo.
a) Exposição. Segundo La Rochefoucauld, "as virtudes se perdem no interesse, como os rios no mar". Tudo em nós procede do amor-próprio, quer dizer, do amor de si mesmo e de todas as, coisas para si. — Hobbes expõe o mesmo ponto-de-vista. Para ele, a sociedade nasceu de um contrato, destinado a pôr fim ao estado de guerra primitivo, no qual o homem era "um lobo para o homem". A sociedade não seria mais do que uma invenção- disfarçada do egoísmo. Se, pouco a pouco, as práticas do altruísmo adquiriram um valor autônomo, não é menos verdade que tudo deriva do egoísmo, que é, no fundo, o único instinto do homem.
b) Discussão. Toda esta tese repousa em uma concepção equívoca do interesse. Existe um sentido em que é verdade que todas as nossas inclinações são expressões de nosso interesse: o bem é, de fato, o único fim possível de nossa atividade; nós nada podemos amar, desejar ou perseguir a não ser sob o aspecto do bem. Deste ponto-de-vista, tudo está "interessado", não somente nossas tendências sensíveis, mas o próprio desinteresse, o devotamento G o sacrifício de si. Mas este "interesse" é, decerto, completamento diferente do interesse egoísta, uma vez que é este que nos obriga quando o dever o exige, a sacrificar nossos gostos, nossos bens e mesmo nossa vida.
2. Redução à sexualidade.
a) Exposição.
FREUD julga que todos os instintos do homem derivam de um instinto fundamental, que nāo pode ser outro que o instinto sexual, como o prova a força imensa e a influência que o caracterizam. Tudo no homem, diz Freud, provém da libido (sexualidade), seja diretamente, seja indiretamente, enquanto que as potências sexuais, que perderam no todo ou em parte seu uso próprio, aplicam-se a outros fins, pelo processo da sublimação, quer dizer, pelo fato de que a força não empregada e recalcada no instinto sexual é utilizada para fins sem relação direta com este instinto. Sob este aspecto, o heroísmo, o gênio e a santidade resultariam dos. impulsos recalcados da sexualidade.
b) Discussão.
A tese de Freud manifesta uma filosofia das mais discutíveis, quando postula, sem nenhuma prova, que todas as manifestações da atividade humana não podem derivar a não-ser da atividade sensível e, por conseguinte, que nada de natural existe no homem além do que ele tenha de comum com os outros animais. Freud nega pura e simplesmente a realidade das inclinações especificamente humanas. Mas mesmo reduzindo as inclinações do homem aos instintos animais, permaneceria ainda o fato de que estes não podem reduzir-se à sexualidade, de vez que o instinto alimentar e o instinto gregário parecem especificamente distintos desta.
3. Conclusão.
— Devemos, portanto, concluir que é impossível reduzir à unidade os instintos e as inclinações. Os instintos derivam das necessidades, e estas são múltiplas e irredutíveis. Sua unidade não pode ser senão funcional, por serem feitos para o ser vivo, e devem harmonizar-se entre si para assegurar o bem individual e específico do ser vivo. No homem, a redução à unidade teria menos sentido ainda, em virtude da dualidade sensível e intelectual da natureza humana. Esta dualidade implica a realidade de instintos e inclinações essencialmente diferentes.
ART. IV. PRAZER E DOR
§ 1. Natureza
a) É impossível definir o prazer e a dor em si mesmos. São eles estados simples e primitivos, que não se podem explicar, portanto, por outros mais simples. Mas, aqui, importa muito pouco deixar de definir, porque não existe ninguém que não saiba, de experiência própria, o que é o prazer e a dor.
b) Pode-se caracterizá-los, todavia, por suas causas. Deste ponto-de-vista, o prazer aparece como um estado afetivo agradável, resultante do bom exercício de uma atividade ou de uma tendência satisfeita, enquanto que a dor é um estado afetivo desagradável, resultante do mau exercício de uma atividade ou de um pendor contrariado. — Estas definições se aplicam ao mesmo tempo à atividade sensível e à atividade intelectual.
c) É necessário apelar ao mesmo tempo para a atividade e a tendência. A explicação causai do prazer e da dor, que acabamos de dar, associa ao mesmo tempo a teoria aristotélica, ou teoria da atividade, e a teoria biológica e finalista. Os dois pontos-de-vista, o da atividade e o da tendência, devem aqui intervir, porque, de uma parte, a atividade que se exerce de conformidade com as leis que lhe regulam o bom funcionamento gera normalmente o prazer (passear, nas condições de saúde requeridas, é um prazer; ultrapassar, em distância e duração de marcha, o que o estado físico tolera, torna-se dor), — e, de outro lado, a raiz mais profunda destes fatos e estados afetivos se encontra no exercício dos instintos e das tendências, ao passo que o funcionamento e os limites da atividade são por sua vez regulados pelas necessidades nascidas das tendências e dos instintos.
d) As teorias intelectualistas são insuficientes. É necessário, pois, afastar as teorias ditas intelectualistas (Estóicos, — Descartes, — Herbart) , que reduzem o prazer e a dor a juízos ou a idéias mais ou menos confusos. Resultaria destas teorias que nós dirigiríamos o prazer e a dor na medida mesma em que dirigíssemos nossas idéias e nossos juízos: sofrer dor de dentes seria essencialmente pensar nesta dor de dentes, e, para não sofrer, seria suficiente não pensar nisto! — Se estas doutrinas podem valer parcialmente, em certos casos de dor moral, que a atenção vivifica ou aviva, falham necessariamente para os prazeres e as dores físicas, que de forma alguma se reduzem a simples representações.
2. Condição do prazer e da dor. — Não pode existir prazer nem dor sem consciência, pois estes estados são essencialmente subjetivos e, se não são sentidos, são como se não existissem, ou mesmo, mais exatamente, não existem. É assim que um anestésico (ópio, morfina, éter) suprime a dor, pelo próprio fato de que suprime a consciência da dor, ou, mais exatamente, a percepção do estado físico de onde nasce a impressão dolorosa.
3. Existem estados neutros? — Entre o prazer e a dor, estados contrários, não existe uma zona neutra ou um ponto de indiferença total, de zero afetivo? Parece que não. Um estado de indiferença absoluta carece ir realizável: toda atividade, por mais relaxada que seja, comporta ao menos uma certa nuance afetiva. Se. por vezes, os estados tomam uma espécie de caráter neutro, isto provém geralmente de um efeito de contraste em relação a outros estados afetivos mais intensos aos quais sucederam. É necessário ainda notar que existem estados físicos (por exemplo o estado de boa saúde) que não parecem neutros, a não ser porque sua tonalidade afetiva muito real permanece subconsciente, e continuamente recoberta, de qualquer modo, por outros fatos afetivos mais intensos.
§ 2. Papel do prazer e da dor
a) São guias da atividade vital, uma vez que, como se viu, traduzem respectivamente o exercício de uma atividade conforme ou contrária às tendências. Estes guias não devem, contudo, ser seguidos cegamente. Seu papel é somente o de nos dizer o que é bom ou mau, mas de forma alguma o que é moralmente bem ou mal: o que é agradável à sensibilidade não é sempre o bem, o que lhe é desagradável não é sempre o mal.
b) São auxiliares. O prazer tende a aumentar a atividade que o produz; a dor tem o efeito contrário. O prazer dilata, a dor contrai.
2. Papel moral. O prazer é por si mesmo a recompensa do mérito? A dor é sinal de demérito. Não se poderá afirmá-lo sem ir contra a experiência e o senso moral da humanidade, sobretudo pelo fato de que prazer e dor pertencem à ordem corporal, na qual o homem não saberia encontrar seu fim. A dor pode, freqüentemente, ser indício de grandeza e fonte de mérito unicamente se for encarada ou aceita em função do bem moral, superior aos bens sensíveis.
Todavia, parece certo que prazer e dor deveriam representar sanções do mérito e do demérito, e que, em muitos casos, o poderiam realmente ser. Que eles não o sejam sempre, é sinal de uma desordem na nossa natureza. Eis tudo o que a filosofia pode dizer. A fé cristã traz aqui suas luzes, fazendo conhecer a causa e a natureza desta desordem.
ART. V. EMOÇÕES E SENTIMENTOS
§ 1. A EMOÇÃO
a) Definição. A palavra emoção se toma, num sentido muito geral, para significar toda espécie de estado afetivo de uma certa intensidade. Aqui nós a entenderemos, de uma maneira muito estrita, como designando um fenômeno afetivo complexo, provocado por um choque brusco, e compreendendo um abalo mais ou menos profundo da consciência. (Enquanto escrevo, uma detonação ecoa atrás de mim e me põe em sobressalto; estou longe de me refazer da surpresa. — Percorrendo ao acaso um jornal, tomo conhecimento da morte acidental de um amigo querido: com isto,. "recebo um choque", que me mergulha na tristeza).
b) Existem duas espécies de emoções’!
Costuma-se distinguir a emoção-choque (coarse emotion), categoria na qual entram os exemplos precedentes, — e a emoção sutil, ou estado emotivo tranqüilo e durável, rico em elementos representativos. A emoção sutil parece muito difícil de distinguir dos sentimentos e é preferível reservar o nome de emoção ao fenômeno afetivo descrito sob o nome de emoção-choque.
2. Análise.
— Podem-se descobrir na emoção duas espécies de elementos:
a) Elementos psíquicos. Desde que o choque se produz surge toda sorte de representações mais ou menos ligadas, que vêm bruscamente inibir e substituir o curso das representações normais. No mesmo momento, desencadeia-se um fenômeno afetivo de uma extrema intensidade, agradável ou desagradável, e geralmente penoso e difícil de suportar, por causa de sua violência, e de sua brusca aparição. Pouco a pouco, após o primeiro choque, faz-se uma adaptação, mais ou menos laboriosa, que tende seja a prolongar sob forma de estado durável (sentimento) a emoção primitiva, seja a eliminar a lembrança da emoção, quando ela apenas resultou de um fato sem conseqüências.
b) Elementos fisiológicos. Conhecem-se bem estes fenômenos produzidos no corpo pela emoção: aceleração do ritmo do coração e do ritmo respiratório; sensação de não ter passagem na garganta, boca seca; perturbações intestinais, palidez, reflexos incoerentes de. adaptação ou de proteção etc.
3. Natureza da emoção.
a) Qual é a natureza da emoção: psíquica ou fisiológica?
No" primeiro caso, os elementos fisiológicos não são mais do que efeitos do estado mental: choro porque estou triste. No segundo caso, é o inverso: o estado mental é uma simples conseqüência dos fenômenos fisiológicos: estou triste porque choro.
b) A teoria periférica.
A segunda hipótese, ou teoria periférica, sustentada por Descartes, Lange e William James, foi aplicada sobretudo às emoções-choques. Ela afirma que a emoção não é nada mais do que a consciência das perturbações fisiológicas, e invoca em seu favor os fatos das fobias (temores sem causa externa), os casos numerosos em que se assume a atitude exterior da emoção a fim de fazê-la aparecer (caso das comédias, — assobia-se para criar ânimo, — Napoleão quebra um vaso de porcelana para ficar encolerizado etc), os casos igualmente freqüentes em que se suprime uma emoção inibindo os fenômenos fisiológicos que lhe estão ligados (a paralisação das lágrimas diminui a emoção). Resultaria daí que o ato da emoção seria o seguinte: uma representação — reações periféricas — consciência destas reações — emoção. Donde o nome de "teoria periférica" dado a esta explicação do fenômeno emotivo.
c) Apreciação da teoria periférica.
A teoria periférica encontra bastantes dificuldades. De início, ela não se aplicaria senão imperfeitamente às emoções finas. Depois, mesmo limitada às emoções-choques, os fatos que invoca se chocam com dois fatos contrários (o ator que representa sem nenhuma emoção; as lágrimas que acalmam a emoção — diz-se que "chorar faz bem" etc).
Contudo, esta teoria contém um elemento importante de verdade. Ela se opõe justamente à teoria psicológica, que erra em considerar os fatos fisiológicos como acidentais na emoção. Na realidade, estes fatos são essenciais, por sua vez, da mesma maneira que o corpo faz parte da essência da natureza humana. A emoção é ao mesmo tempo um fenômeno psíquico e um fenômeno orgânico: segundo sua intensidade, é ora o fenômeno psicológico ora o fenômeno orgânico que parece ter a preponderância. Mas as duas espécies de fenômenos concorrem juntas para produzir a emoção.
§ 2. OS SENTIMENTOS
Os sentimentos são estados afetivos duráveis de ordem geral. Eles se distinguem por isto dos estados afetivos de ordem física (prazer e dor corporais), — das emoções, que são brutais e temporárias, — enfim, das sensações, que são produzidas por um excitante físico, enquanto que os sentimentos nascem de uma representação (imagem ou idéia) mais ou menos clara.
2. Natureza.
— É errado pensar que os sentimentos pertencem unicamente à alma e não têm nenhum caráter orgânico. Todos os estados afetivos põem em jogo a um tempo a alma e o corpo. Apenas, nos sentimentos (sentimentos de veneração, de tristeza, de ódio, de simpatia, satisfação estética etc), as representações exercem um papel preponderante e a repercussão orgânico, é fraca, ainda que possua regularmente uma tonalidade agradável ou desagradável, que a aproxima da sensação.
3. Função. — A atividade humana é prodigiosamente complexa. Todo um jogo de ações e de reações se produz em conseqüência dos elementos múltiplos e diversos que vêm constantemente integrar-se na vida psíquica: percepções, imagens, idéias, lembranças, crenças, sentimentos, inclinações, prazeres, sofrimentos etc. Neste conjunto, são os estados afetivos que representam o papel principal. Uma situação não é jamais para nós simplesmente uma representação, mas uma coisa ligada a nossas tendências e inclinações. Daí se seguem as reações diversas com as quais a consideramos. Se um ato a realizar nos aparece como fácil e agradável, será executado com satisfação ou alegria; se se apresenta como difícil, acima de nossas forças, oposto a nossos gostos, logo uma influência inibidora se manifestará. É o sentimento que ora favorece, ora refreia e paralisa a ação. O sentimento aparece, assim, cor>o regulador da atividade.
ART. VI. AS PAIXÕES
128 1. Natureza da paixão. — A paixão pode definir-se por comparação com a inclinação.a) Definição. Pode-se definir a paixão como um movimento impetuoso da alma conduzindo-nos ou afastando-nos de um objeto, conforme encontraremos nele uma fonte de prazer ou de dor. Vê-se, assim, que as paixões não são mais do que as inclinações levadas a um alto grau de intensidade.
b) Inclinação e paixão. Não devemos, contudo, reduzir absolutamente a paixão à inclinação. Esta resulta imediatamente da natureza, e é inata, como o instinto que ela manifesta, enquanto que a paixão é adquirida, na proporção em que acrescenta à inclinação de que procede uma intensidade e uma veemência que são mais ou menos obra nossa. — Além disso, a inclinação é permanente como a própria natureza, enquanto que a paixão tem o caráter de uma crise. — Enfim, as inclinações se equilibram mutuamente, enquanto que a paixão é exclusiva, e rompe o equilíbrio em seu proveito.
2. Causas das paixões.
— As causas das paixões podem ser fisiológicas ou psicológicas.
a) Causas fisiológicas. A paixão, já o dissemos, é uma inclinação levada a um alto grau de intensidade. Ora, as inclinações se apóiam imediatamente na natureza. Segue-se daí que as paixões resultam, por ama parte, do próprio temperamento. As inclinações, sem dúvida, se equilibram mutuamente, mas não de maneira perfeita: são, na realidade, desigualmente desenvolvidas, segundo a hereditariedade e o temperamento físico. Desde que demos mais exercício às inclinações predominantes, estamos no caminho das paixões, e pode-se dizer que estas existem em germe nas nossas inclinações, isto é, no nosso temperamento físico e morai.
Este germe pode crescer, sob a influência das circunstâncias exteriores, tais como a educação, os exemplos, as freqüências. Em geral, a paixão nasce lentamente, e as causas psicológicas intervém em todo o seu desenvolvimento.
b) Causas psicológicas. Estas são as mais importantes, porque a paixão não pode assumir extensão e força a não ser pela cumplicidade, ao menos tácita, de nossa vontade, que se torna assim a causa principal da paixão.
— Estes efeitos interessam à inteligência e à vontade.
a) Efeitos sobre a inteligência. A paixão, ao mesmo tempo, enfraquece e superexcita a inteligência. Com efeito, a paixão centraliza as atividades da alma sobre o objeto da paixão, e ao mesmo tempo suspende qualquer forma de atividade que não seja exigida pelos fins da paixão. Produz-se, assim, uma espécie de unificação da alma, por empobrecimento.
Por outro lado, a inteligência fica exaltada e superexcitada quando a serviço dos fins da paixão. O apaixonado (Harpagão Grandet) realiza muitas vezes prodígios de engenhosidade; o monoideísmo, que constitui a paixão, permite-lhe concentrar sua atenção num mesmo ponto, com uma perseverança que não recua diante de nenhum obstáculo, e não conhece outro interesse que o da paixão.
b) Efeitos sobre a vontade. O que se verifica com a inteligência se aplica também à vontade. A paixão pode exaltar a energia da alma: é o caso das paixões nobres. Ela pode também roubar à vontade toda espécie de autonomia, e dela fazer uma verdadeira escrava, pronta a todas as fraquezas e por vezes até mesmo ao crime.
4. A paixão, do ponto-de-vista moral. — A palavra paixão é empregada geralmente num sentido pejorativo, e designa, na linguagem corrente, um apetite desregrado. Na realidade, a paixão não é má por si mesma. Ela não se torna má a não ser em função de seu objeto. Existem paixões nobres: a paixão da verdade, a paixão da caridade, a paixão do amor de Deus, que produz os santos. Estes, em certo sentido, são todos apaixonados. A paixão não se torna culpável a não ser que se dirija para um objeto moralmente mau. Podem-se, por isso, dividir as paixões em si mesmas, independentemente do valor moral de seu objeto.
5. Classificação das paixões. — As paixões podem dividir-se como as inclinações de tal sorte que a cada inclinação corresponda uma paixão (122). Contudo, todas as paixões podem ser reduzidas ao amor e ao ódio, e o próprio ódio pode reduzir-se ao amor, pois o ódio de um objeto não aparece senão pelo amor que se tem por outro, que lhe é contrário.
ART. VII.
PEDAGOGIA DAS INCLINAÇÕES E DAS PAIXÕES
§1. A ARTE DE GOVERNAR DAS INCLINAÇÕES
Dividimos as inclinações em inclinações superiores e inclinações sociais. Estas duas categorias de inclinações devem ser desenvolvidas e dirigidas com o maior cuidado.
1. Inclinações superiores.— Amor da verdade, do bem e do belo, amor de Deus, princípio exemplar de toda verdade, de toda bondade e de toda beleza: aí está o fim mais alto da formação pessoal e o resto não é mais do que um meio dirigido para este fim. Aqui deve, então, intervir o próprio conjunto dos métodos, intelectuais e morais, que dirigem a formação do espírito e do coração, da vontade e do caráter.
Pode-se, contudo, mesmo neste domínio, orientar mal a formação pessoal das inclinações, ou a cultura da personalidade moral, e abdicar deste instrumento impulsionador de progresso que se chama emulação. Estes dois pontos exigem algumas observações.
a) O amor-próprio. O termo amor-próprio pode ser tomai: em dois sentidos contrários. Define-se muitas vezes pelo egoísmo: Neste sentido, é claro que deve ser combatido. Um método de formação que tivesse como resultado, voluntariamente ou não, habituar-nos, sob a capa do amor próprio, a tomar-nos como fim de todas as coisas, e a considerar-nos como o centro do mundo, seria radicalmente mau. — Mas o amor-próprio pode também definir esta preocupação da dignidade pessoal, que é o oposto mesmo de egoísmo, já que nos obriga, como vimos mais acima (123), a colocar a virtude, a justiça e a caridade acima de todos os interesse; materiais e sensíveis. Assim compreendido, o amor-próprio é a mais fundamental de nossas inclinações morais e o motor mais poderoso de nossa formação pessoal.
Sem dúvida, é por vezes difícil discernir se certas fórmulas do amor-próprio não nos levam muito mais a parecer do que a ser, ou, de qualquer forma, a colocar o ser a serviço do parecer. Mas este desvio não nos deve levar a desconhecer o que há de bom e de excelente no sentimento de honra, e na preocupação da dignidade pessoal. São, estes, preciosos auxiliares da formação moral, sob a condição de que se saiba bem colocar a honra e a dignidade humana onde convenha, a saber, muito menos na reclamação: inquieta e obstinada do que alguém nos deve em respeito e consideração, do que na necessidade sentida fortemente de nada fazer que nos obrigue a corar diante de nossa conduta, no íntimo de nossa consciência.
b) A emulação. Daí se depreende o que é necessário pensar da emulação. Ela pode ter sua utilidade. Mas é necessário guardar-se de certos excessos muito freqüentes. É necessário evitar deixar a emulação transformar-se em rivalidade irritante, em orgulho. em desejo de dominar. A melhor emulação não consiste tanto em colocar-se alguém em paralelo com os outros, mas em colocar-se em paralelo consigo mesmo: convém, antes de tudo, comparar o qi>t fomos antes com o que somos hoje, a fim de compreender que se trata menos de ultrapassar os outros, do que ultrapassar a si mesmo.
2. Inclinações sociais. — Estas inclinações se manifestam, sobretudo, sob a forma da imitação e das afeições simpáticas.
a) A imitação. O homem é naturalmente imitador, e pode-se conceber imediatamente qual será o poder do exemplo sobre nós, mormente na juventude, quando não se conseguiu adquirir um juízo pessoal sobre as coisas da vida. Cumpre, por isso, escolher os lugares onde freqüentar, evitar quanto possível qualquer convivência em que se corra o risco de sofrer o contágio dos maus exemplos. É conhecido o provérbio, tantas vezes verificado: "Dize-me com quem andas, que te direi quem és."
b) As afeições simpáticas.
Quanto às afeições simpáticas, elas não são em si más, tanto quanto possam parecer, mas devem ser atentamente vigiadas. As amizades da juventude podem ser simplesmente uma ajuda e um auxílio. Mas acontece muitas vezes, também, que se oferece uma amizade sem reflexão, ou que nos entreguemos ou nos isolemos com uma incrível leviandade. Devemos, por isso, aprender a governar os sentimentos do coração. — Enfim, acontece, por vezes, que certas amizades precoces tenham alguma coisa de inquieto e apaixonado, e se tornem facilmente absorventes. Este é o sinal de uma sensibilidade afetiva desordenada, que é necessário trabalhar para dominar e moderar.
§ 2. Remédios para as paixões más
1. Remédios preventivos. — Sabemos que a paixão pode nascer, quer das disposições fisiológicas ou morais, quer das circunstâncias exteriores. Cumpre, então, chamar a atenção para estes dois pontos:
a) A imaginação é a grande fonte das paixões. Por isso, neste domínio, tudo se resume em aplicar as regras que demos a propósito da imaginação. — Quanto ao temperamento físico, é conveniente esclarecer se ele é ou não perfeitamente são, e, em caso negativo, fazer intervir os remédios físicos apropriados.
b) As circunstâncias exteriores têm uma grande influência sobre a formação das paixões. Estas circunstâncias, na maior parte do tempo, não dependem de nós. Pelo menos, convém não criar voluntária ou imprudentemente circunstâncias que sejam perigosas: deste ponto-de-vista as leituras e os espetáculos devem tornar-se objeto de uma escolha escrupulosa. Que nós nos lembremos destas palavras: "Quem ama o perigo, nele morrerá."
Acima de tudo, é necessário esforçar-se para adquirir uma vontade forte, como o mostraremos mais adiante.
2. Remédios curativos. — Quando uma paixão má se manifesta, como poderemos combatê-la?
a) A luta direta nem sempre é indicada, e é mesmo muito paro que tenha bons resultados. Em regra geral, não se combate eficazmente uma paixão a não ser por uma paixão contrária.
b) Em certos casos, contudo, a luta direta pode mostrar-se eficaz. Seu processo consiste em associar às paixões alguma emoção desagradável. É assim que se luta contra a covardia, contra a sensualidade etc, expondo as detestáveis conseqüências destas paixões: vergonha, desprezo, perturbações físicas. Acima de tudo, a idéia do pecado e a ofensa feita a Deus devem ser eficazes nas almas cristãs.
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Última Modificação: 9 jul, 2009.
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