segunda-feira, 4 de março de 2013

SE EXISTE O MAL, EXISTE DEUS? ao som de BEETHOVEN "Missa Solemnis" D-Dur op.123- 1:13:31



Beethoven "Missa Solemnis" D-Dur op.123

picture : Oura Catholic Church Nagasaki Japan
cond. Kurt Masur
orch. The Leipzig Gewandhaus Orchestra
Kyrie 0:0008:01
Gloria 08:0324:46
Credo 24:5044:20
Sanctus 44:2158:29
Agnus Dei 58:31
 

Se existe o mal, existe Deus?


Dom Redovino Rizzardo
Bispo de Dourados (MS)

«Os Salmos podiam afirmar que Javé “chovia” ou “trovejava”, 
que era ele que causava a guerra e mandava a peste. 
O Novo Testamento podia supor que determinada enfermidade era causada pelo demônio. Hoje, porém, isso não é mais possível. Mesmo que o quiséssemos, não podemos ignorar que a chuva e o trovão têm causas atmosféricas bem definidas; que a doença obedece a vírus, bactérias ou disfunções orgânicas; e que as guerras nascem do egoísmo humano. 

Ao falarmos de fenômenos acontecidos no mundo, impôs-se a evidência de que a “hipótese Deus” é supérflua como explicação. Mais ainda, é ilegítima e, obstinar-se nela, acaba fatalmente prejudicando a credibilidade da fé»

É com estas e outras considerações que Andrés Torres Queiruga procura explicar a ação de Deus no mundo em dois de seus livros: 

Um Deus para hoje” e “Repensar o mal”. Dada a importância do assunto, permito-me aprofundá-lo em quatro artigos, deixando-me conduzir, nos três primeiros, pelo teólogo espanhol e, no último, por Bento XVI, que ratificará – ou retificará – o pensamento do Pe. Andrés.
Queiruga começa com um questionamento: 

«O problema mais sutil – e, por isso mesmo, a tarefa mais difícil – aparece pelas posições de meio-termo, em que ou se aceitam os princípios, mas não se tiram as consequências, ou se admitem alguns elementos, mas se resiste a aceitar outros que, no entanto, são solidários. Assim, não se pensa mais que Deus “chova”, mas, em alguns lugares ou ocasiões, se fazem preces para pedir chuva; não se crê mais que Deus mande a guerra, mas se celebram missas por suas campanhas; reconhecem-se os gêneros literários na Bíblia, mas continua-se tomando à letra o sacrifício de Isaac. A intenção pode ser boa, mas os danos acabam sendo muito graves».

A raiz do problema foi sintetizada no que se costuma denominar

 “O dilema de Epicuro”. Nele, o filósofo grego nega a existência de Deus a partir da presença do mal na história humana: «Ou Deus quer tirar o mal do mundo, mas não pode; ou pode, mas não quer; ou não pode nem quer; ou pode e quer. Se quer e não pode, é impotente; se pode e não quer, é mau; se nem quer nem pode, é fraco e perverso; se pode e quer, então, por que não o elimina?».

Queiruga comenta o dilema com estas palavras: «Em vista dos grandes males que afligem o mundo, um Deus que, podendo, não os elimina, acaba por força aparecendo como ser mesquinho e insensível, indiferente e, até mesmo, cruel. Porque, quem, se pudesse, não eliminaria – sem pergunta prévia de qualquer tipo – a fome, as pestes e os genocídios que assolam o mundo? Seremos nós melhores que Deus? Como disse Jürgen Moltmann, diante da recordação de Verdun, Stalingrado, Auschwitz ou Hiroxima, um Deus que permite tão escandalosos crimes, fazendo-se cúmplice dos homens, dificilmente se pode chamar Deus».

Para Santo Tomás de Aquino, porém, o que o argumento de Epicuro prova é... a existência de Deus: «Se existe o mal, existe Deus. O mal não existiria se não existisse o bem, do qual é privação. E o bem não existiria se Deus não existisse». Outro teólogo para quem o sofrimento não impede a crença em Deus é o mártir evangélico Dietrich Bonhoeffer, morto num campo de concentração nazista em 1945. Para ele, a vida brota do amor – o qual, por se identificar com a busca do bem, exige uma constante conversão.
Contudo, de acordo com o Pe. Andrés, tais conceitos precisam ser bem entendidos: «Bonhoeffer encontrou a melhor resposta para o nosso tempo: 

“Só o Deus sofredor pode salvar-nos”. Mas essa afirmação só é válida se se situa dentro do paradigma de um Deus não intervencionista e delicadamente respeitoso da autonomia do mundo. Enquanto se mantiver, de modo acrítico e talvez inconsciente, o velho pressuposto de uma onipotência abstrata e definitivamente arbitrária, no sentido de que Deus poderia, se quisesse, eliminar os males do mundo, converte-se a resposta em pura retórica, que a longo prazo mina pela raiz a possibilidade de crer. 

De nada serve a própria proclamação de que Deus sofre com nossos males, se antes pôde tê-los evitado, pois, nesse caso, chegariam tarde demais sua compaixão e sua dor. Pode até provocar o riso, como se diz do espanhol rico e piedoso que construiu um hospital para os pobres... depois de tê-los empobrecido!»

 Li-Sol-30
Fontes:

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