segunda-feira, 27 de junho de 2011

PIERRE TEILHARD DE CHARDIN - II




 "Só o homem pode ajudar o homem
a decifrar o Mundo"
 
A energia que  provoca a União 
é a Ordem espiritual interna:
é o Amor"

Teilhard de Chardin

 
Assim como no montanhismo,
o progresso na vida espiritual depende 
de progredir para cima, descobrindo à medida 
que avançamos, como fez Teilhard.

Drew Christiansen






Nova York / Religião – O ‘Hino à Matéria’ pode ser uma das orações mais estranhas que um sacerdote já escreveu. Os cristãos rezam a Deus, aos santos, aos anjos, e em certas ocasiões a seus seres queridos falecidos. Mas um hino à matéria?

Aos átomos e às pedras, aos gases e ao plasma, aos minerais e ao pó de estrelas? Parece uma idolatria e de fato, quando o autor do hino era um menino estava tão fascinado com as pedras que se referia a elas como “meus ídolos”. Explicou:

“em toda minha experiência infantil, 
não tinha nada no mundo tão duro, 
pesado, resistente e mais durável 
do que esta maravilhosa substância…”.


Depois, quando viu que o fierro se oxidava, percebeu a instabilidade da substância mais dura que conhecia e nasceu sua fome espiritual. O autor da oração, Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), em vida um conhecido paleontólogo e geólogo, depois de sua morte, tornou-se mais conhecido como filósofo da evolução e escritor espiritual. Mas o sacerdote jesuíta jamais abandonou suas pedras.

Tal como a descoberta de seus defeitos levara-o em uma busca mística de um objeto permanente e universal merecedor de sua devoção, Teilhard achava que sem a matéria —sem a resistência, decepções e desafios que a matéria propõe ao homem— nosso desenvolvimento intelectual e espiritual como espécie se veria freado.


MESTRE RIGOROSO


O “Hino à matéria” de Teilhard
louva o material do universo como o rigoroso mestre 
do espírito humano.
“Sem ti, matéria,
 viveríamos inertes, estancados, pueris,
ignorantes de nós mesmos e de Deus”.

“Tu que rompes a cada momento 
nossos esquemas e nos obrigas a procurar 
cada vez mais longe a verdade”,
“Tu que extravasas e dissolves 
nossas estreitas medidas e nos revelas 
as dimensões de Deus”. 
A matéria, como descreveria Teilhard, é a “’matriz do espírito’: aquela da qual a vida emerge e lhe dá suporte, não o princípio ativo do qual surge”.


Fazendo uso de seu itinerário pessoal, intelectual e espiritual como naturalista e sacerdote, Teilhard considerava a obstinação da matéria e a necessidade do esforço humano para descobrir seus segredos como o ponto de partida para o crescimento espiritual.

Enquanto outros gigantes jesuítas do século 20 como Pierre Rousselot, Joseph Marechal e Karl Rahner construíram suas teologias filosóficas sobre o dinamismo inerente da mente para Deus, Teilhard considerou que o duro esforço da aprendizagem como uma abertura privilegiada ao divino.
 
A atenção que o cientista dá ao problema que ele ou ela está estudando serve de prática para a atenção que o místico presta a Deus.

Nesta descoberta, Pierre Teilhard estava na linha de outra filósofa francesa, Simone Weil, cujo ensaio “Sobre o correto uso dos estudos escolares” argumentava que fosse traduzindo Homero ou solucionando um problema de geometria euclidiana, o estudo fomenta a essencial concentração para a oração.
A enérgica e desenvolta abertura do interrogador está emparentada com a disposição alerta e reverente de uma pessoa diante de Deus.


O ASCETISMO DA ATENÇÃO


Teilhard ofereceu suas bençãos no “Hino à material”:


Tu feres e curas,

Resistes e dobras, 
arruínas e constróis,

acorrentas e libertas,

Seiva de nossas almas, 
Mão de Deus, Carne de Cristo,

Matéria, eu te bendigo.


Contrariamente a alguns que acreditam que uma vez que entram no mundo do pensamento podem deixar para trás o mundo físico, Teilhard propôs que o espírito humano amadurasse em seu esforço por compreender (dominar e respeitar) o mundo natural.
Essa compreensão do mundo físico, no entanto, chega através de uma disciplina que o cientista deve suportar. Se o tema for a natureza ou a natureza humana, enfocar nossa mente num problema envolverá grande esforço (incluindo o esforço físico para um naturalista como Teilhard), decepção e desilusão. Só então se encontra a felicidade na descoberta e no prazer no crescimento acumulado do conhecimento.


Teilhard propôs que na medida em que a disciplina da ciência nos ajude a compreender melhor a criação de Deus, esta é uma espécie de ascetismo, uma prática espiritual com o potencial de aprofundar a vida espiritual. A espiritualidade tradicional enfatizava o controle do corpo através da simplicidade, do jejum, da castidade e da disciplina física.
Por sua vez, Teilhard apontava à disciplina inerente na vida ativa e especialmente na aplicação da mente à aprendizagem, uma disciplina que ele praticava na pesquisa de campo, assim como também nas pesquisas em museus e laboratórios: identificar e analisar fatos distintivos, classificar e relacionar as descobertas, propondo hipóteses, verificando ou desmentindo-as. Tal como nós, os cristãos praticamos a mecânica da aprendizagem, os nossos espíritos também podem crescer.
Assim como o impulso da mente interessada acorda seu particular entusiasmo no aluno, o processo de pesquisa guarda o potencial para estimular nosso apetite pelo infinito mistério da existência.


Um problema que nos afeta hoje em dia, assim como aconteceu na época de Teilhard, é que com freqüência há muito pouca disciplina intelectual naqueles que são considerados como as autoridades da vida espiritual. Confundem a totalidade da fé com suas expressões mais elementares e consideram a catequese de pergunta-e-resposta como equivalente à teologia séria.

Não há dúvida, assim como escreveu Alfred North Whitehead, a religião ocorre “em todas as latitudes” ao longo de uma escala de potencialidades humanas. 
No entanto, uma vida intelectual mais rica com freqüência pode dar lugar a uma experiência espiritual mais rica e a uma teologia mais profunda. Teilhard nos ensina que nem só as descobertas da ciência podem contribuir ao nosso assombro religioso, mas a maneira científica do conhecimento pode reforçar também a ascensão da mente a Deus.


BOM OLHO PARA AS ROCHAS — E PARA DEUS


Como cientista de terreno, Teilhard tinha grande reputação de ter muito bom olho para as rochas, percebendo rapidamente as características que tinham escapado da observação de seus colegas, e compreendendo suas implicâncias. Não é surpreendente, portanto, que enquanto os antigos mestres da oração ensinavam a liberar a mente de preocupações, para ficarem mais aberto à divindade, Teilhard acreditava que a atenção da ciência nos detalhes mais mínimos do mundo físico tornava a mente mais capax dei ainda, “radicalmente aberta a Deus”.
Ele acreditava que o segredo tanto para a vida espiritual, como para a ciência, radica na mais absoluta atenção aos detalhes. À medida que começamos a apreciar a riqueza e complexidade do universo, nossa percepção da glória de Deus também cresce.


Certamente que há outros mestres espirituais que também enfatizaram a atenção nos detalhes. O “pequeno caminho” de Santa Teresa de Lisieux, por exemplo, consiste em fazer as pequenas coisas da vida diária com devoção. Embora a maneira de Teilhard difira da de Santa Teresa ou da dos Pais do Deserto, em dois aspectos. Em primeiro lugar, trata-se da vida ativa, na qual os humanos exercitam sua criatividade e inventiva.
A criatividade do artista, a solução de problemas do cientista, a inventiva do engenheiro em computação, o diagnóstico do médico, todos oferecem a oportunidade para crescer em santidade tanto como a atenção às rotinas dos mosteiros ou da sacristia.


Segundo, a atenção aos detalhes se relaciona especialmente com a atividade intelectual e especialmente com a pesquisa científica. A erudição bíblica e os clássicos tiveram um papel na espiritualidade beneditina e depois no humanismo cristão, mas a ciência envolve a pesquisa ativa e mais do que isso, a revisão dos pensamentos originais.
À medida que a mente se encontra com a resistência do universo material —as rochas, átomos, genes e galáxias— “nossos esquemas” se rompem e “nossas pequenas unidades de medida” são destruídas. A pesquisa do mundo natural nos faz abandonar os preconceitos aos quais, de outra forma, nos aferraríamos; e à medida que descobrimos as infinitas maravilhas do universo, a mente se abre às insuspeitáveis dimensões de Deus.


O ascetismo nos chega quando somos estudantes aplicados, abandonando os preconceitos e as teorias obsoletas, adquirindo novas destrezas.

No início, o desenvolvimento da mente do estudante implica aprender de cor, mas a esperança é que a tabela atômica e o DNA se transformem em algo tão natural que os alunos sejam capazes de aplicá-los nos exercícios do colégio, desenhar suas próprias experiências, observar as anomalias e finalmente verificar suas descobertas através da duplicação.

Todas as etapas —aprendizagem de memória, 
aplicação, experimentação, exame de anomalias, 
duplicação— implicam disciplina. 
Para o cientista ou estudante consciente de si mesmo, o esforço que implica provar um fato simples lhe dá uma pista da dedicação que também requer o crescimento no espírito. Da mesma maneira, para aqueles que crêem ou buscam o espiritual, a prática da ciência deveria sugerir o gradual incremento das habilidades, incluindo as habilidades espirituais, implícitas na cooperação humana com a graça divina.


AVANÇANDO


No decorrer do tempo, Teilhard chegou a considerar a matéria num sentido mais lato, não só como o objeto da ciência física, mas como tudo na vida que ao colocarmos resistência nos ajuda a avançar, seja em conhecimento, progresso material ou desenvolvimento espiritual.
Em O meio divino ofereceu uma analogia iluminadora que é a chave para a apreciação espiritual da matéria.
“É a ladeira da qual podemos tanto subir
como descer
  o meio que pode sustentar ou deixar cair, 
o vento que pode virar ou elevar”.
O papel adequado da matéria é o de ser o caminho à santificação. “As coisas criadas não são exatamente obstáculos, mas sim pontos de apoio, intermediários para serem usados, nutrição que devemos tomar, seiva que deve ser purificada e elementos com os quais nos associamos e que carregamos conosco” em nossa viagem, a caminho da luz.


A materia não é uma coisa estática.
É o livro que acabou de ser lido, a hipótese que foi confirmada ou desmentida. São as linhas de telefonia, os faxes, os modens e o computador Apple. É as experiências de Gandhi com a verdade e o movimento Tea Party. É o passado que nos trouxe ao futuro e o passado que nos reteve. A matéria é o ponto de apoio do espírito na história. Esse ponto de apoio define duas zonas:


1- a zona que já deixamos para trás ou onde chegaremos, aonde não regressaremos, ou na qual não devemos detener-nos,a menos que retrocedamos —esta é zona da matéria no sentido material e carnal;
2- e a zona que se oferece a nossos renovados esforços ao progresso, a pesquisa, a conquista e a ‘divinização’, a zona da matéria tomada no sentido

espiritual; e a fronteira entre ambas é essencialmente relativa e cambiante.


Devemos apoiar-nos nas coisas deste mundo para avançarmos ou quando eles cederem, retrocedemos. A apreciação espiritual da matéria envolve tanto contar com sua resistência para suportar-nos à medida que nós pressionamos para frente como esperar o esforço que nos exige para avançar. Ambas forças são necessárias.


Assim como o montanhismo, a vida espiritual requer um movimento ascendente constante, refletia Teilhard. A menos que o montanhista que está firme em seu ponto de apoio se mova para cima, escorregará e cairá. “Aquilo que é bom, santificador e espiritual para meu irmão que está mais abaixo ou a meu lado na ladeira da montanha, pode ser falso ou mau para mim”, adverte Teilhard. 
“O que eu me permiti ontem com justiça, 
talvez hoje eu deva negar-me”.


Como funciona a matéria depende da rota do progresso espiritual de cada pessoa. O que eu fizer das perguntas que encontrar no meu trabalho, o que eu fizer das coisas que ocorrerem em minha vida, como transformar as crises que enfrentar em oportunidades, tudo isso determinará o quão profundamente participarei (e o grau no qual os demais compartilham) na divinização de nosso mundo em Cristo.
Assim como no montanhismo, o progresso na vida espiritual depende de progredir para cima, descobrindo à medida que avançamos, como fez Teilhard, que a matéria de nossa vida é “a seiva de nossas almas, a mão de Deus, o corpo de Cristo”.

Fonte:
Mirada Global.com
http://www.miradaglobal.com/index.php?option=com_content&view=article&id=1561%
3Aen-la-ladera-con-teilhard&catid=52%3Areligion&Itemid=82&lang=pt
Sejam felizes todos os seres  Vivam em paz todos os seres
Sejam abençoados todos os seres

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