quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

LACIR PECORA: PADRE ANTÔNIO VIEIRA - SERMÕES,USP



Luís Filipe Silvério Lima * 
Os Sermoens são a obra pela qual o jesuíta Antônio Vieira (1608-1697) ficou conhecido, sendo depois considerado por suas prédicas impressas o “Imperador da língua portuguesa”, na expressão recorrentemente lembrada de Fernando Pessoa.

Em vida, os Sermoens circularam impressos simultaneamente tanto como sinal de sua autoridade e fama de pregador quanto veículo de afirmação dessa autoridade – sua e, por decorrência, da ordem jesuítica. Teriam sido impressos, segundo consta em cartas, contra sua própria vontade, a pedido de seus superiores de ordem, para servir como modelo de pregação. Preferiria ficar trabalhando nos seus tratados proféticos, nos quais propunha um Quinto Império do mundo, tratados e projeto que chamava de seus “altos palácios” diante das “pequenas choupanas” dos sermões.

Não obstante, como ele indica no prefácio do primeiro tomo, também começou a organizá-los para combater os volumes não autorizados que foram editados em castelhano, impressos já na década de 1660 e que circularam não só na península Ibérica e na Europa, mas eram a versão lida em muitos lugares das Américas. Sinal do prestígio do pregador e da sua importância como modelo de sermonista, estas edições foram feitas à sua revelia, sem sua autorização, por meio de cópias falhas ou mesmo de textos “alheios”, inventados, alguns completamente diferentes do que havia proferido. Por isso, a importância de ordenar, rever e preparar para edição os seus sermões, segundo os seus critérios. Publicar sua versão escrita dos sermões era, assim, uma marca da sua autoridade como exemplo de pregador e, ao mesmo tempo, um sinal da defesa da sua autoria sobre aqueles textos. 

Os Sermoens começaram a sair em 1679, quando ainda estava em Lisboa, e o último volume organizado por ele que veio a lume foi estampado um ano após sua morte em Salvador, na Bahia. 

Obra do final da vida, iniciada aos 71 anos, os 12 volumes organizavam, em alguns casos, atualizavam uma vida de pregador que se iniciara antes mesmo da sua ordenação em 1636, no colégio dos jesuítas na capital do Estado do Brasil. Dos 12 tomos, dois reúnem prédicas dedicadas a Ns. Sra. do Rosário, entre os quais estão os famosos sermões aos homens pretos, e um é dedicado a S. Fco. Xavier. Afora a organização por homenagem a figuras santas desses três volumes, como ele próprio afirma, os outros nove não parecem seguir nenhuma ordenação, talvez obedecendo ao ritmo de preparação e término dos originais do próprio autor. 

Além desses, compõem a coleção um volume de sermões de ação de Graças, impresso em 1692 – e entendido por Vieira como livro separado e diverso dos Sermoens, mas contabilizado entre os volumes dos Sermoens no séc. XVIII –, e quatro volumes organizados postumamente, entre 1710 e 1748, contendo sermões, cartas, poemas e discursos vários, sendo depois, dois deles, adicionados à conta de 15 volumes de Sermoens. Ao total, são mais de 200 sermões que cobrem as décadas de 1630 a 1690, proferidos em Salvador, Lisboa, São Luís, Cabo Verde, Roma, entre outros lugares. 

Os sermões que temos impressos são a versão escrita de prédicas faladas ao longo da vida do jesuíta, dividida entre Brasil, Portugal, Maranhão e Roma. Por assim dizer, são a voz que se tornou letra impressa, ou para usar uma figura do próprio Vieira, são cadáveres, pois lhes falta a alma, a voz, que lhes dá vida. 

Se a imagem é talvez demasiado forte para nós, ela nos serve de alerta para entender que entramos num dos pontos altos da produção oratória do séc. XVII, na qual as relações entre impressão, publicização, oralidade, escrita funcionavam por regras diversas das nossas. 

O sermão no séc. XVII, e talvez em grande parte do período moderno, era um dos principais meios de comunicação, circulação de informações e de doutrinamento das populações cristãs na Europa e no Novo Mundo.

A vida das sociedades do período passava pela palavra anunciada, seja no sermão de grandes homens, como Vieira, Bossuet ou Donne, seja no sermão de rua, pregado por pastores puritanos ou frades mendicantes – ou mesmo fiéis que se arvoraram na figura de homens santos. 

Vieira ganhou notoriedade e autoridade nos púlpitos o que lhe permitiu circular desde o a sede do governador-geral do Brasil até as cortes européias, tendo recebido convite para se tornar confessor e pregador da rainha Cristina da Suécia, exilada, após abraçar o catolicismo, na Sé romana. 

Os sermões que temos aqui digitalizados tratavam, como meios de doutrinação e de reflexão sobre o mundo, dos assuntos os mais diversos que estivessem em pauta no momento e que parecessem ao pároco importantes para ordenar seu rebanho. Lidavam desde os excessos dos senhores para com seus escravos no Nordeste do Brasil, até o nascimento de um príncipe como sinal da graça divina e do início de um novo Império universal; do demônio mudo que reside no espelho até a omissão que gera a perda das Conquistas. 

Como discurso pensado pela ocasião e para uma audiência específica, os sermões supunham figuras, exemplos e mensagens adequadas ora ao rei e sua corte portuguesa, ora a africanos escravizados nas Américas, ora a príncipes e cardeais romanos. 

Os 15 volumes de Sermoens, mais os das Vozes, permitem assim supor diferentes situações, momentos, auditórios, problemas enfrentados e combatidos por Vieira na sua trajetória de mais de seis décadas de vida religiosa e política, bem como imaginar as variadas audiências que o ouviram e, quem sabe, adivinhar como estas receberam os sermões, por vezes duramente críticos. 

Servem assim de repertório riquíssimo para desenhar quadros sobre as sociedades européias e americanas nas quais o jesuíta esteve ao longo do século XVII. Ao mesmo tempo, como palavra impressa que traduz uma voz perdida nos púlpitos, fazem-nos perguntar o que Vieira terá atualizado dos seus sermões ao prepará-los para impressão, 20, 30 às vezes 40 anos depois de pregados. 

Como também, em sua versão impressa, levam a questões de como terão sido lidos ao sairem publicados para uma outra platéia, que não (ou)vira Vieira no púlpito e então o leria. Agora, uma nova camada de leituras e leitores é somada com a disponibilização integral, pela primeira vez, dos Sermoens de Vieira digitalizados e on-line.

Antonio Vieira

06/02/1608 - Lisboa, Portugal
18 /07 /1697 - Salvador (BA)
Pedagogia Comunicação



O padre Vieira foi um grande e produtivo escritor do barroco em língua portuguesa. Escreveu 200 sermões - entre os quais pode-se destacar o "Sermão da Sexagésima" -, cerca de 500 cartas e profecias que reuniu no livro "Chave dos Profetas", que nunca acabou.

A família Vieira veio para o Brasil e fixou residência em Salvador, na Bahia, quando Antonio tinha seis anos. Seu pai era funcionário do império português. Aos 15 anos, ingressou na Companhia de Jesus.

Formou-se noviço em 1626, e além de teologia estudou lógica, física, metafísica, matemática e economia. Lecionou humanidades e retórica em Olinda e em 1634 foi ordenado sacerdote, na Bahia.

Aos 33 anos, voltou a Portugal com uma comissão de apoio ao novo rei Dom João 4o. Nessa época Portugal passava pela guerra da Restauração da Coroa contra a Espanha. Existiam ainda conflitos contra a Holanda, França e Inglaterra.

Em 1643, Vieria foi designado pelo rei Dom João 4o para negociar a reconquista das colônias. Suas propostas eram conciliar Portugal e Holanda, entregando a província de Pernambuco aos holandeses a título de indenização; reunir em Portugal os cristãos-novos, isto é, os judeus que estavam espalhados pela Europa, e protegê-los da inquisição. Em troca os judeus investiriam nos empreendimentos do Império Português.

Consideradas absurdas, suas idéias foram rejeitadas e Vieira retornou ao Brasil estabelecendo-se ao norte do Maranhão. Os dois primeiros volumes dos "Sermões" foram publicados em Madri em 1644, mas a edição estava tão ruim que Vieira não a reconheceu como legítima.

Em 1661, Padre Vieira foi obrigado a deixar o Maranhão, pressionado pelos senhores de escravos que não concordavam com suas posições contrárias à escravidão indígena. Voltou para Lisboa onde foi condenado pela inquisição em virtude de seus manuscritos "heréticos": "Quinto Império"; "História do Futuro" e "Chave dos Profetas". De 1665 a 1667 ficou preso em Coimbra.

Em 1669 foi anistiado e seguiu para Roma onde ficou até 1676 sob a proteção da Rainha Cristina da Suécia. Dez anos depois foi publicado oficialmente o primeiro volume dos "Sermões", em Lisboa. Em 1681 voltou ao Brasil onde passou a dedicar-se à literatura. Padre Antonio Vieira morreu aos 89 anos, na Bahia.

      Publicado em 06/12/2011 por

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      http://www.brasiliana.usp.br/vieira_sermoes
      http://educacao.uol.com.br/biografias/antonio-vieira.jhtm

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