quarta-feira, 11 de julho de 2012

O INFERNO SÃO OS OUTROS: uma reflexão sobre a diversidade cultural nos domínios da Inquisição.- Ida Duclós




Trabalho originalmente apresentado 
para a FFLCH/USP
 
No século XII, foi instaurada a Inquisição contra os crimes de heresia, quase na mesma época em que foi fundada a ordem dos frades dominicanos. O objetivo era universalizar o mundo cristão e através da catequese e punição, firmar seu domínio. Este objetivo de cristianizar o mundo não era recente nesta época. Carlos Magno já o tinha feito à força com os povos bárbaros da Europa e as cruzadas partiram em direção ao Oriente para tomar a terra santa (Jerusalém), mas fracassaram. Houve um movimento contrário, uma guerra religiosa que avançou na Europa, chegou até a Espanha, onde os povos orientais permaneceram por séculos.

A inquisição espanhola, tal como a Inquisição medieval, foi instituída para atacar a heresia formal. Como para ser herege é preciso ser cristão, judeus e mouros eram considerados simplesmente infiéis. Foi necessária sua conversão compulsiva para incriminá-los. " E gradualmente tanto os judeus como os mouros foram sujeitos ao controle deste órgão de conformidade social, tal como as bruxas o tinham sido ao controle da Inquisição medieval." (Trevor-Roper,1972) 

No caso das bruxas foi necessário uma definição extensiva de heresia para incluí-las sob a alçada da Inquisição (séc. XV, mas a perseguição começou antes que isso fosse permitido, tal como aconteceu aos judeus.
No século XIII, tem início a caça às bruxas junto com a expansão da sociedade feudal cristã. Esta primeira etapa da perseguição vai se dirigir principalmente contra sociedades localizadas, onde a Igreja Católica não estava firmemente implantada. No resto da Europa, com exceção de alguma perseguição política em número não expressivo, a prática da bruxaria é tolerada. 

O feudalismo era tipicamente uma organização social de planície e nunca se impôs plenamente nos lugares montanhosos como os Pirinéus ou os Alpes, habitados por dois povos culturalmente diversos do modelo feudal europeu: os albigenses do Lanquedoque (Pirinéus) e os vaudois, nos Alpes. "Na Idade Média, os homens da montanha diferiam dos da planície na organização social, e portanto diferiam também nesses costumes ou padrões de crença que derivam da organização social e a consagram ao longo dos séculos. Podemos dizer que tinham civilizações diferentes." (Trevor Roper,1972)

O trabalho dos dominicanos – "os evangelistas dos cantos escuros da Europa" – começa na forma de luta contra a identidade cultural destes dois povos. Somente no princípio da Idade Moderna é que a caça às bruxas vai se voltar contra indivíduos isolados e se generalizar por todo continente europeu e depois o americano. Pouco se ficará sabendo sobre essas duas sociedades de montanheses, pois seus documentos autênticos foram quase todos destruídos pelos seus perseguidores. Algo semelhante, mais aterrorizador talvez, por se tratar de povos sem contato com o mundo ocidental, vai ocorrer alguns séculos depois na América, com a destruição dos manuscritos da civilização maia.

 A Inquisição
 – a outra face da evangelização 
– procura não somente o extermínio físico de indivíduos,
 mas principalmente a eliminição de todas as culturas
 que marcam a diversidade, garantindo o domínio 
pela homogeneização cultural.
 
Os atributos, que os frades dominicanos dizem pertencer aos povos montanheses feudais, não parecem corresponder à realidade de albigenses e vaudois. As mesmas qualidades vão ser atribuídas a todos os grupos sociais dissidentes dessa época, como os esotéricos, por exemplo. E vão pemanecer iguais, mesmo quando se muda de época e personagem; os jesuítas vão encontrar na América, entre os indígenas, o velho maniqueísmo dualista entre Deus e o Diabo na natureza e as mesmas orgias de promiscuidade sexual que os dominicanos acharam nos Alpes e Pirinéus. E será assim que a Renascença irá caracterizar as bruxas do solo europeu.

É possível formular duas hipótese para as causas dessa insistência em classificar o inimigo sempre da mesma forma, mesmo em contextos e épocas tão diferentes. " Na Europa, bruxos e bruxas constituíram esse outro que a cultura opunha a seus padrões, identifícando-os, para alguns, com a anti-sociedade, ou com o estado de natureza." (Souza, 1993) Na verdade, são os evangelizadores que acreditam estar numa luta entre o bem e o mal e enxergam seu reflexo quando olham a diferença. Negando a identidade do "outro", os catequisadores são incapazes de reconhecer a diversidade. Por isso, o estado de natureza é característico do diabo, em contraposição ao civilizador cristão.

Não existindo cultura 
senão a sua própria, não há regras ou normas exteriores a ela.
 Por isso, o imaginário cristão cria as orgias sexuais 
como atributos das bruxas e dos indígenas americanos,
 em oposição a monogamia católica ou a castidade dos frades.
 
A outra hipótese, é que as sociedades dominadas joguem o jogo do simulacro, imitando quem os persegue. "O simulacro, a imitação do branco, no caso dos índios, ou do modelo do dominador, para qualquer outro grupo minoritário, parece ser um passo importante para todo um conjunto de sociedades ou grupos dentro de uma sociedade específica, que buscam, contraditoriamente, afirmar-se na sua diferença." (Novaes, 1993). Mas seja qual for a razão, a luta por uma identidade própria foi sempre considerada como uma heresia pelos conquistadores que não podiam assimilar a diferença, nem conviver com a oposição. Mesmo que fossem elementos da própria sociedade européia, como no caso das bruxas ou dos judeus, que foram eleitos como símbolo de negação, por não serem iguais aos outros.

Foi assim com os albigenses e os vaudois na sociedade feudal. Foi entre esses povos que os dominicanos começaram a identificar bruxaria com heresia, definindo nesse processo uma nova ortodoxia que iria modificar radicalmente a maneira da Igreja Católica conceber as práticas mágicas.
Os velhos cânones da Igreja, principalmente o cânon episcopi, nega e proíbe a crença nas bruxas. Em 1257, quando os frades insistem com o papa Alexandre para que este inclua a magia como crime de heresia, não conseguem permissão, pois não é possível condenar aquilo que não se crê que exista.

Mesmo assim, os dominicanos utilizam a tortura e o tenor no vale dos Pirineus e dos Alpes. Através das confissões que conseguem, vão elaborando um tratado de demonologia, baseado nos traços culturais das sociedades perseguidas e nas crenças espalhadas por toda a Europa. Para eles, heresia e bruxaria estão juntos e não se conformam com a necessidade legal de provar o crime de heresia primeiro para só depois conseguir a condenação das bruxas.

No inicio da Idade Moderna, os dominicanos conseguem inverter essa situação da Igreja. Ao longo dos anos de perseguição, tinham elaborado uma demonologia sistemática, estabelecendo que toda a bruxa faz um pacto com o demónio, não sendo mais necessário investigar sua culpa, mas sim julgar se há ou não prática de magia. Com o pacto, driblou-se o cânon episcopi. "A elaboração da nova heresia, tal como a da nova ortodoxia, foi obra da Igreja católica medieval, e em especial, dos seus membros mais ativos, os frades dominicanos. Este fato não é suscetível de ser iludido ou rodeado por qualquer argumento. Os elementos da obsessão podiam ser não-cristãos, ou até pré-cristãos. A prática dos encantamentos, da influência sobre o tempo, o uso da magia de simpatia podem ser universais. 

Os conceitos de um pacto com o Diabo, das cavalgadas noturnas até do sabat dos incúbos e dos súcubos podem derivar do folclore pagão dos povos germânicos. Mas a combinação desses diferentes elementos numa demonologia sistemática que fornecia um estereótipo social para a perseguição foi obra exclusiva não do cristianismo, mas da Igreja Católica." (Trevor-Roper)

Em 1484, Inocêncio VIII emitiu a bula papal "Summus Desiderantes Affectibus", cedendo a pressão dos dominicanos, que tomava a magia crime herético e que tinha como epígrafe "não acreditar em bruxaria é heresia máxima." Dois anos depois, Kramer e Springer, dois frades inquisidores da região alpina, publicam uma verdadeira enciclopédia de demonologia chamada "Malleus Malefícarum", especificando todo o sistema da crença no Diabo. Na realidade, eles usaram esse livro para convencer o Papa Inocêncio, mas publicaram somente depois da bula papal para que parecesse que estavam dando uma resposta a esta. "Parece-nos ter sido essa a origem do sistema. 

Foi aperfeiçoado no decurso de uma luta local e começou por ter uma aplicação local. Mas a construção intelectual, uma vez completada, era universal. Podia ser aplicada em qualquer parte. A arma forjada para combater as sociedades não conformistas foi utilizada para destruir os indivíduos não conformistas (Trevor-Roper, 1972)

A Idade Moderna começa acreditando oficialmente em bruxaria e num pacto demoníaco. Este é corroborado pelo sabat, uma reunião do demônio e seu séquito com os seus servos aqui na Terra, os bruxos. Ao contrário dos encantamentos e do mau olhado, o encontro pode ser visto e narrado pelas testemunhas interrogadas pela Inquisição, e por isso é encarado como uma prova concreta.

 A demonologia
 é construída dentro de elementos culturais 
que fazem parte do imaginário da época.
Não existe dúvidas sobre a existência da magia 
para os homens da renascença, 
talvez somente em algumas mentes mais ilustradas.
 
 "Desta ignorância quanto à distinção entre os sonhos, e outras ilusões fortes, e a visão e a sensação, surgiu, no passado, a maior parte da religião dos gentios, os quais adoravam sátiros, faunos, ninfas e outros seres semelhantes, e nos nossos dias a opinião que a gente grosseira tem das fadas, fantasmas, e gnomos, e do poder das feiticeiras. Pois, no que se refere às feiticeiras, não penso que sua feitiçaria seja algum poder verdadeiro; mas contudo elas são justamente punidas pela falsa crença que possuem, acrescentada ao seu objetivo de a praticarem se puderem, estando sua atividade mais próxima de uma nova religião do que de uma arte ou uma ciência." (Hobbes, 1651)

O Inferno é assim hierarquizado e sistematizado. Essa cosmologia vem completar a sistematização que a Igreja já tinha feito do reino dos céus, com a Sumiria Theologiae, ambas derivadas de São Tomás de Aquino, que baseado em Aristóteles, havia criado um sistema filosófico para ancorar os preceitos da religião. Dividindo o cosmos entre natural e sobrenatural, São Tomas de Aquino abriu as portas para que as práticas mágicas não fossem mais consideradas como ilusão, e sim reais. "Para agora descermos aos tópicos particulares da vã filosofia, derivada para as Universidades e daqui para a Igreja, em parte proveniente de Aristóteles, em parte da cegueira do entendimento, considerarei em primeiro lugar seus princípios…Dizem-nos, a partir desta metafísica, que misturada com as Escrituras passa a constituir a escolástica, que há no mundo certas essências separadas dos corpos, às quais chamam essências abstraías e formas substanciais…

Há um outro erro em sua filosofia civil (o qual nunca aprenderam com Aristóteles, nem com Cícero, nem com qualquer outro dos pagãos) para aumentar o poder da lei, a qual é apenas a regia das ações, a ponto de abarcar os próprios pensamentos e consciências dos homens, por meio de exame e de inquisição daquilo que sustentam, apesar da conformidade de seu discurso e de suas ações. Pelo que, os homens ou são punidos por responderem a verdade de seus pensamentos, ou constrangidos a responder uma mentira com medo ao castigo." (Hobbes, 1651)

Mas, um sistema de crenças não pode ser imposto de cima para baixo numa sociedade, é preciso que haja um respaldo popular para que ele alcance o impacto que teve a perseguição das bruxas entre os europeus. Hobbes acha que as bruxas não tem poder, mas mesmo assim devem ser punidas por exercer bruxaria. Protesta contra a Inquisição por esta perseguir a ciência e lucidamente denúncia o uso político que a igreja faz da Inquisição, mas parece concordar com as fogueiras.

Embora usada como instrumento de domínio político, a demonização das práticas mágicas baseia-se no medo da população. Esta era ensinada pelos inquisidores a acreditar que a demonização provinha das próprias palavras do Evangenlho. "Finalmente, a metafísica, a ética, e a política de Aristóteles, as distinções frívolas, os termos bárbaros, e a linguagem obscura dos escolásticos ensinada nas Universidades servem-lhes para evitar que seus erros sejam detectados e para levar os homens confundirem o ignis futuus da vã filosofia com a luz do Evangelho." (Hobbes,1651). 

Ao medo e aos ensinamentos evangelizadores, junta-se o fato que o tratado demoníaco baseou-se no imaginário cultural renascentista, não é de se estranhar parque as fogueiras foram tão populares e as bruxas tivessem tão poucos defensores. É com bastante entusiasmo que elas são adotadas como bode expiatório para todos os males e como válvula de escape para as tensões sociais.

Através dos processos da Inquisição, pode-se traçar um perfil que é mais ou menos semelhante na maioria dos casos dos julgamentos da Inquisição: mulheres velhas, pobre, geralmente viúvas, sem atrativos físicos, analfabetas, muitas vezes desaforadas, antigas parteiras ou curandeiras. Embora em quase todas as áreas da Europa as mulheres tenham sido mais caçadas do que os homens, três países reverteram essa tendência: na Finlândia, na Estónia e aparentemente na Rússia (Barstow). A suposição é que " a corda ruiu no ponto mais fraco": tais mulheres por serem pobres e sozinhas, tinham menos meios de defesa, além de se tomarem um estorvo por viverem na mendicância. Além disso, as mulheres tem pouco meios de subsistência na crise económica que se instaura no final do feudalismo. Muitas famílias perdem suas terras e perambulam pela Europa. 

Os homens encontram emprego mais facilmente que as mulheres. Suas profissões anteriores de curandeiras que utilizavam benzeduras e ervas, passam a ser proibidas e vistas como suspeita de baixaria. A medicina popular que elas exerciam passa cada vez mais a ser um saber científico. Mas o povo continua acreditando que assim como podiam curar podem causar doenças e outros malefícios. Muitas vezes, como aconteceu na Inglaterra, elas são acusadas pela própria comunidade em que vivem. Tanto que quando os sintomas de bruxaria se manifestam nos conventos, onde as fieiras pertencem a elite, são encaradas como possessões e exorcistas são chamados. (Aix-de-Provence em 1661, Louvres em 1647). Estes casos chamam a atenção pública, não só pela posição social, mas também por serem casos urbanos com um tratamento diferenciado. Juristas inquisitoriais e população estão predispostos a encará-las como pobres mulheres histéricas, iniciando-se um debate e o declínio progressivo das fogueiras.

As vítimas da Inquisição estão muito próximas da descrição física que se faz das bruxas dos contos de fadas, que ainda não viraram livros infantis, mas são preservados pela tradição oral e muitas vezes destinados ao público adulto. Hobbes vai escrever no calor da batalha, uma comparação entre o clero e estas histórias que circulam na sociedade renascentista. " As fadas, seja qual for a nação onde habitem, só tem um rei universal, que alguns de nossos poetas denominam rei Oberon, mas as Escrituras chamam Belzebu, príncipe dos demónios. Do mesmo modo os eclesiásticos, seja qual for o domínio em que se encontrem, só reconhecem um rei universal, o Papa. Os eclesiásticos são homens espirituais e padres fantasmagóricos. As fadas são espíritos e fantasmas. 

As fadas e os fantasmas habitam as trevas, 
as solidões e os túmulos.
 Os eclesiásticos caminham na obscuridade da doutrina, em mosteiros, igrejas e claustros. A estas e outras semelhanças entre papado e o reino das fadas se pode acrescentar mais uma, que assim como as fadas só têm existência na fantasia de gente ignorante, que se alimenta das tradições contadas pelas velhas, também o poder espiritual do Papa (fora dos limites de seu próprio domínio civil) consiste apenas no medo, em que se encontra o povo, seduzido, de ser excomungado, por ouvir aos falsos milagres, as falsas tradições e as falsas interpretações das Escrituras." (Hobbes, 1651)

O poder inquisitorial vai ser muito utilizado durante a Reforma e a Contra Reforma para assegurar o domínio geográfico das regiões onde se da estas luta ideológica. "Todos os estágios cruciais da luta ideológica foram estágios da reanimação e perpetuação da obsessão das bruxas…os reformadores mantiveram toda a infra-estrutura filosófica do catolicismo escolástico."’(Trevor-Roper). Se a Reforma começou com o movimento humanista, em breve esqueceu-se dele e se utilizou da anua criada pela demonologia sempre que se deparou com a resistência de indivíduos ou de sociedades inteiras. Todas às vezes em que os missionários de uma igreja ou outra tentavam retomar uma sociedade a seus rivais, a heresia se revelava como bruxaria.

O estereótipo criado foi usado em larga escala. A própria sociedade quando se sentia ameaçada recrutava a Inquisição laica ou clerical. "Os dissidentes eram sempre bruxos, é nesses tempos de pânico que vemos a perseguição se alargar deixando de incidir nas mulheres velhas, as vítimas usuais dos ódios das aldeias, para abranger também juízes cultos e membros do clero cujo crime se limitava a terem resistido à obsessão."(Trevor-Roper)

Na Península Ibérica, os hereges preferidos foram os judeus. Portugal concentrou-se também na produção literária da época, e os Inquisidores censuravam os livros antes que estes pudessem ser publicados, visitavam bibliotecas privadass e examinavam os navios que chegavam ao seu país, em busca de publicações proibidas. Estes dois países chegam na América trazendo junto toda a corte demoníaca.

As fogueiras da Inquisição vão perdurar até o século XVIII, quando os homens deixam de temer as bruxas e passam a encará-las com ceticismo. A magia que fazia parte de um conhecimento popular e de um modo de vida cai no descrédito, condenada pelo racionalismo iluminista. Mas foi principalmente Descartes quem colocou a magia em xeque com seu conceito: "penso, logo existo". A passagem do homem do estado de natureza se faz através da razão e não da religião, como pretendiam os inquisidores. A partir daí, estava aberto o caminho para a ciência desencantar o mundo, pondo fim a dois séculos de perseguição.

Portugueses e espanhóis ao se depararem com a exuberância da natureza dos solos americanos e frente ã estranheza de seus habitantes, classificam os indígenas como idólatras e servos do demônio, velhos conhecidos da sua pátria. "Na demonologia de que se trata aqui – referida à alteridade americana -a relação heterológica se verificaria sobretudo pela negação: nomeava-se e se classificava o Outro ameaçador com os elementos negativos e detratores por excelência disponíveis no âmbito da cultura dos conquistadores e colonizadores da América " (Souza/1993)
No México, foram os franciscanos que ficaram encarregados da catequese. 

Desde o início, os espanhóis pretenderam a colonização de seu império. "El mundo que surgia ante los ojos de los conquistadores era imprevisto e imprevisible. Ni la sencillez conciliadora de las Islãs, ni los refinamentos que se daban por descontados en el Japón o en La China dei Gran Kan. Las sociedades mayas de Yucatán, los totonacas de Veracruz, los nahuas sometidos a Moctezuma – o rebeldes a sugemonia – companíam una asombrosa paleta de culturas que los espaííoles tratarom de comprender a medida que los descubrían e intentaban someterlos ai rey." (Gruzinski e Bemand, 1992). A admiração que os espanhóis sentiram veio misturada com a aversão. Englobam tudo o que vêem sobre o termo de idolatria, projetando sobre as realidades exóticas uma categoria familiar. "Desde entonces idólatras e idolatrias serán localizas, identificadas, etiquetados y descritos. La cuestión, por lo demás, no es filosófica o intelectual. La idolatria que observo Cortês brindaba también y ante todo um pretexto político-militar, puesto que legitimaba la conquista lustre a las glorias de una nueva "Reconquista", como sifuera posible preseguir em tierra americana la cruzada empreendida en Espana contra el Islan."(Gruzrnski e Bernard, 1992). Assim, os espanhóis derrubam templos e destroem ídolos, construindo em seu lugar igrejas e símbolos cristãos.

Os índios brasileiros são caracterizados pelos portugueses não só como idólatras, mas sobretudo como por estarem sob o domínio do demónio. A própria natureza parece estar a serviço do diabo, por ser selvagem e indomável.

Ao olhar as prática mágicas e os costumes das sociedades indígenas, os conquistadores concluem que só o próprio príncipe das trevas pode ter contado aos selvagens como cultuá-lo, pois estes nunca tiveram contato com os europeus para aprender sobre tal assunto.

Novamente, a luta contra o bem e o mal justifica a conquista e a extirpação de sociedades diferentes, que julgam estar no estado de natureza, sem civilização. "Entre este gentio tupinambá há grandes feiticeiros, que têm este nome entre eles, por lhes meterem em cabeças mil mentiras: os quais feiticeiros vivem em casas apartada cada um por si, a qual é muito escura e tem uma porta muito pequena, pela qual não ousa ninguém entrar em sua casa, nem de lhe tocar em coisa dela… mas há alguns que falam com os diabos, que os espancam muitas vezes… A estes feiticeiros chamam os tupinambás pajés… o que afirmam que lhes ensinou o diabo, e que lhes aparece…é esse gentio tão luxurioso que poucas vezes têm respeito às suas irmãs e tias…dormem com elas pelos matos e alguns com suas próprias filhas; e não se contentam com uma mulher, mas tem muitas…E em conversação não sabem falar senão nestas sujidades, que cometem cada hora…coisa que não faz nenhuma nação de gente senão estes bárbaros." (Souza, 1587).

CONCLUSÃO
O ilumismo inaugura o império da razão e estabelece a lógica cartesiana como princípio unificador e universal do pensamento humano. Entre outros méritos o racionalismo foi fundamental para acabar com a barbárie das fogueiras do século XVI e XVII. Ao dar esse passo a humanidade consegue vencer o medo do sobrenatural, colocando as bruxas nos livros de história infantis. Mas não vence o temor ante o ‘outro’, que continua a assombrar os cantos escuros do inconsciente humano do civilizador ocidental.

Rousseau percebeu isso e colocou não a razão, nem a religião, como condição básica para a tríplice passagem da natureza à cultura, do sentimento ao conhecimento, da animalidade à humanidade. A única faculdade capaz de vencer a contradição entre estes estados, é a piedade. E a piedade proveniente da identificação com o outro, como um ser vivo, que nos permite reconliecermos como iguais. Mas, para isso é necessário, primeiro, recusar-se em si mesmo. 

"É a Rousseau 
que se deve a descoberta deste principio,
 o único sobre o qual podem fundar-se as ciências humanas,
 mas que deveria permanecer inacessível e incompreensível
 enquanto reinasse uma filosofia que, tendo seu ponto de partida
 no Cogito, era prisioneira das pretendidas evidências do eu… 

Descartes 
acredita passar diretamento da interioridade
de um homem  à exterioridade do mundo,
 sem ver que entre esses dois extremos se colocam sociedades, 
civilizações, isto é, mundos de homens." 
(Lévi-Strauss, 1962)

 Fonte;
 FFLCH/USP
 

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